Crítica | Cinema

O Pior Vizinho do Mundo

Hanks de volta a Hanks

(A Man Called Otto, EUA, SWE, 2022)
Nota  
  • Gênero: Comédia
  • Direção: Marc Forster
  • Roteiro: David Magee
  • Elenco: Tom Hanks, Mariana Treviño, Rachel Keller, Truman Hanks, Mike Birbiglia, Manuel Garcia-Rulfo
  • Duração: 126 minutos

Um homem deprimido que não vê mais nenhum sentido em continuar vivo. Esse é Otto, um senhor solitário e rabujento que passa seus dias cuidando obssessivamente do condomínio onde mora e de onde estabelecera as regras, que acabou de ser aposentado compulsoriamente e está decidido a acabar com tudo. Aos poucos vamos sabendo mais sobre ele, seu cotidiano, aquele ambiente onde vive e seu passado. Essa é a história de O Pior Vizinho do Mundo, mas é também a de Um Homem Chamado Ove.

O longa de Marc Foster é uma refilmagem pouco empenhada em se distanciar da produção sueca lançada em 2015 e indicada a dois Oscar (melhor filme em língua estrangeira e melhor maquiagem e penteado), mas ainda tocante na abordagem do luto e simpática no modo como trata a amizade.

Quando se pensa nos dois filmes, e é impossível dissociá-los depois de assistidos, há muita proximidade entre eles, em especial na representação do presente, com o roteiro do segundo guardando suas inovações para uma atualização contextual. Já a direção quer alterar o foco principal do filme no passado, reforçando-o, e são muitos os flashbacks que entrecortam o filme, mas não fazem nenhum bem ao andamento da trama. Enquanto Hannes Holm fez um uso mais natural do recurso, principalmente ao tratar da relação de Uve com o pai, o diretor alemão de Guerra Mundial Z responsável pela adaptação estadunidense, ao se fixar na história de amor romântico, não consegue acertar no tom.

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O Pior Vizinho do Mundo
Sony Pictures

Um dos grandes empecilhos é a discrepância entre as atuações de Truman e Tom Hanks. Enquanto o experiente ator volta a um papel quase tradicional e confortável depois de sair de uma interpretação que o desafiou com o afetado Coronel Tom Parker pensado por Baz Luhrmann em Elvis, seu filho é inseguro e inexpressivo vivendo a versão mais jovem de Otto. É um problema grave quando se pensa que há tanto passado no filme. A intromissão, que já interromperia o clima naturalmente, ainda conta com esse descompasso a mais.

É fato que o que se constrói com Hanks em sua rabugisse tem o seu valor. Mesmo que não haja novidade naquilo que se vê, o ator sabe como dar o seu toque à composição e dá força ao personagem. São detalhes que afastam Otto de Uve e provocam um humor diferente do original. Há ainda uma inegável química com Mariana Treviño, a vizinha latina que se muda para a casa da frente e vem para perturbar o seu cotidiano, e todo um elenco de apoio igualmente funcional e bem encaixado.

O Pior Vizinho do Mundo
Sony Pictures

Porém, mesmo que sejam qualidades importantes, elas não são suficientes para superar os deslizes de O Pior Vizinho do Mundo. Conseguem fazer esquecer enquanto estão na tela, mas basta uma nova interrupção para lembrar que algo fora do lugar sempre dificultará o andamento da trama. E ainda há a questão do reaproveitamento, tão complexa nas produções requentadas e super esmiuçadas do cinema de Hollywood, que pega o que vem de fora e acha que precisa processar e explicar tudo minuciosamente.

Mas é um filme que se preocupa em fazer atualizações importantes na questão da diversidade e se esforça. E é aquela coisa, para os que não estão esperando nada demais e não conhecem o original, é inofensivo e com uma história bonitinha que pode até emocionar. Dando um desconto para os flashbacks, pelo enredo e a atuação de Hanks, para um programa sem pretensão, tem algum potencial. 

Um grande momento
A corda e a janela aberta

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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