- Gênero: Documentário
- Direção: Mozart Freire, Virginia Pinho
- Roteiro: Mozart Freire, Virginia Pinho e Miqueias de Moura Mesquita
- Duração: 73 minutos
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Há um espanto inicial na presença de um filme como A Colônia na competição da Aurora na Mostra Tiradentes, porque nos acostumamos a ver o festival mineiro como uma vitrine não apenas de novas produções de diretores estreantes e com isso de uma esperada revitalização do cinema, mas principalmente por esperar que essa juventude conceitual venha acompanhada de uma proposta igualmente rejuvenescida de teor e ainda mais de sua proposta estética. Essa talvez seja uma pressão muito maior do que a curadoria estaria disposta a sustentar por tantos anos, e penso se essa cobrança não deveria ser amenizada, vez por outra.
Tendo isso em vista, sim, a estreia na direção de longas de Mozart Freire ao lado de Virgínia Pinho, surpreende pela sensação constantemente apaziguadora que evoca em sua narrativa. Pra quem não está unindo nome e pessoa, Freire é diretor de, entre outros, Pop Ritual e Janaína Overdrive, curtas metragens de impressionante carga imagética, que se embrenham no cinema de gênero – o terror e a ficção científica, e um tanto da mistura entre eles – para construir uma linguagem abrasileirada, tentando observar o mundo de uma forma desconstruída, e com isso reconfigurar seus códigos. Esse é, no meu caso, o real motivo pelo espanto, que pode ser lido positivamente até.
Em cena, o documentário estuda um bairro que foi centralizado para o tratamento da hanseníase há 80 anos atrás, em Maracanaú (CE), com o ponto de vista atual – os moradores que se tratam das consequências de uma doença que já foi muito discriminada, os responsáveis pelo centro de tratamento, a vizinhança ao seu redor e as funcionárias em sua rotina diária. Não há dúvida que, tematicamente, há muita relevância na história dessas pessoas, que há anos lutam por dignidade própria e alheia, tentando desmistificar um aspecto negativo em torno de uma enfermidade.
O que é apresentado em A Colônia, no entanto, não é somente uma visão tradicional de um documentário observacional sobre um grupo de pessoas que interagem em certa localidade, mas que esse quadro não é composto pela totalidade de visão, mesmo tendo a certeza de um recorte. Porque o filme não sabe muito bem que voz alcançar no tratamento de seu roteiro; o filme passeia por seus personagens e eles não evocam qualquer diferença de caráter, todos são minimizados diante da vontade de contar mais, ou de aspectos que não se definem como necessários. Qual é, afinal, o peso de cada enquadramento em cena, das senhoras solitárias e enfermas às jovens que estão começando uma nova vida naquele lugar?
Mesmo a formação e situação atual da cidade não é suficientemente abordada. Antônio Justa é uma comunidade que foi criada sem cuidado e sem apoio sincero, e hoje vive quase em esquema de abandono das autoridades, e o filme apresenta essa discrepância de maneira discreta, sem dedicação a contento, mesmo que essas intenções não sejam desprezadas, elas estão lá. O filme tem material pictórico à sua disposição, e apresenta a ideia de maneira explícita ao espectador, mas apresenta seu resultado como uma visita a um museu, sem explorar seu potencial.
Freire e Pinho realizaram um quadro confortável para contar sua história, sem confronto ou cobrança de qualquer ordem, é quase etnográfico sua proposta final. Observando seus personagens sem desafiá-los, tornando suas trajetórias embaralhadas e sem se preocupar em igual medida com eles, A Colônia nos deixa simpáticos a quem está em cena, mesmo que muitas vezes isso seja resumido a sua situação e não a quem são eles ali, sejam enfermos ou cuidadores.
Um grande momento
Conversa ao pôr do sol