- Gênero: Comédia
- Direção: Wes Anderson
- Roteiro: Wes Anderson, Roman Coppola, Hugo Guinness, Jason Schwartzman
- Elenco: , Adrien Brody, Tilda Swinton, Léa Seydoux, Frances McDormand, Timothée Chalamet, Lyna Khoudri, Jeffrey Wright, Mathieu Amalric, Steve Park, Bill Murray, Owen Wilson, Christoph Waltz, Liev Schreiber, Willem Dafoe, Edward Norton, Saoirse Ronan
- Duração: 107 minutos
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O décimo filme de Wes Anderson é uma anedota literária do que de melhor e pior o cineasta norte-americano traz como parte de seu estilo visualmente impecável, kitsch, retrô e embrulhado na forma de uma carta de amor ao “novo jornalismo” a corrente que trouxe frescor à escrita no século 20 representada aqui numa série de esquetes envolvendo repórteres, editores e outras figuras exóticas da redação de um periódico norte-americano sediado na pitoresca cidade francesa de Ennui-sur-Blasé.
Mais uma vez o roteiro assinado por Wes com os amigos e longa data Roman Coppola e Jason Schwartzman (que também atua), dessa vez com a colaboração de Hugo Guiness, traz como premissa a feitura da última edição de uma publicação histórica, charmosa, exclusiva e estranhíssima. Parte do universo de Wes Anderson, com um elenco estelar disposto a submergir para compor tipos em histórias fabulosas de fábulas do século passado. Os códigos da tessitura poética, do gosto e de tudo que permeia o cinema de Anderson desde pelo menos Rushmore está em A Crônica Francesa. A obsessão pela simetria do plano, com a profundidade de campo e a composição impecável no plano conjunto estão em cada milímetro desse novo filme mas talvez às transições falte organicidade presente em O Grande Hotel Budapeste.
A aventura está ritmada, inclusive na mescla do live Action com a animação, técnica que Wes Anderson já materializou com afinco em Isle Of Dogs e Senhor Raposo. Angoulême, foi a cidade tomada pela equipe e elenco de A Crônica Francesa para materializar essa peculiar ode à força das histórias e do ofício dos contadores de histórias. Arthur Howitzer Jr. (Bill Murray, sempre ele) natural do Kansas como Dorothy herda o negócio familiar e se torna o editor e força motriz do French Dispatch do Liberty, Kansas Evening Sun. Chegando ao fim de sua vida e da vida da revista, o filme reconta a feitura da última edição e, a cada história ou reportagem, soma subsídios para a constituição do obituário do homem de notícias e de palavras.
Cronologicamente, do editorial até as matérias principais, seções, A Crônica Francesa alimenta as lembranças de Howitzer (inspirado em Harold Ross, editor-chefe da New Yorker) radiografando um perfil de cada um dos seus repórteres mais bajulados e talentosos, que estão presentes em três segmentos: arte com “Uma Obra-Prima Concreta”, sobre um pintor que é um criminoso louco, sua guarda na prisão que também é sua musa, e seus vorazes negociantes de arte; política em “Revisões para um Manifesto”, uma crônica do amor e da morte nas barricadas no auge dos tumultos estudantis e gastronomia com “A Sala de Jantar Privada do Policial”, uma história de suspense sobre drogas, sequestro e alta cozinha francesa.
A Flamboyant J.K.L. Berensen (Tilda Swinton) é um espetáculo solo e histriônico da grande e camaleônica atriz, que arranca risadas durante a apresentação de Uma Obra-Prima Concreta, reportagem inspirada numa crônica da revista New Yorker sobre o negociante de arte Lord Duveen. Lilian Ross, imortalizada pelos escritos na coluna Talk Of The Town na revista New Yorker é emulada aqui na personagem de Lucinda Krementz (Frances McDormand), numa ótima interação ainda com Mavis Gallant que escreveu sobre os eventos de Maio de 68 em Paris. Zeffirelli (Timothée Chalamet) é totalmente inspirado no líder de Maio de 68 Daniel Cohn-Bendit com a colega de movimento estudantil Juliette sempre junto na moto. Mas o triângulo amoroso que se desenha joga a história para cima, além da peça dentro desse segmento Revisões Para um Manifesto, assim como as canções francesas cantadas em versões inspiradíssimos por Jarvis Cocker (da Banda Pulp), numa compilação intitulada Chansons d’Ennui Tip-Top são outra banda à parte dessa crônica francesa. No que pesa ao todo, o filme carece de uma unidade dramática mais forte já que parece uma desconjuntada compilação de histórias interessantes e outras nem tanto.
“Não queria ser estranho nem covarde… Agradar e nunca surpreender, me sentindo estrangeiro e nunca parte desse lugar”
Ação entre amigos
Um filme de Wes Anderson é um grande álbum familiar, com atores e atrizes que por anos integram suas obras seja em grande ou diminutos papéis. Owen Wilson também bate seu cartão na espécie de prólogo ou primeira seção da revista nesse A Crônica Francesa, como Sazerac ou o repórter ciclista, que percorre as áreas mais miseráveis e faz uma memorabilia de Ennui. Tony Revolori, Saoirse Ronan, Mathieu Almaric, Adrien Brody, Léa Seydoux, Christoph Waltz, Willem Dafoe, Edward Norton, Bob Balaban e Angélica Houston (como narradora) abrem espaço para novos membros na família: os astros Chalamet e Elisabeth Moss, Lina Khoudry (de Papicha) – além de Benicio Del Toro com seu apaixonado e feroz assassino em tintas geniais Moses Rosenthaler.
A fotografia de Robert D. Yeoman traz um frescor e engenhosidade ao trabalhar tanto no presente da redação com os tons pastéis que Wes Anderson tanto aprecia, mas também investir no preto e branco com os esfumados típicos dos filmes da nouvelle vague em Revisões Para um Manifesto, inclusive apostando em maneirismos de câmera até então não tão incorporados à gramática do cineasta como fusões entre closes. Mas estão presentes os slows e travellings com efeito dramático, especialmente em Uma Obra-Prima Concreta. Já não se pode dizer que esteja tão inspirada quanto de costume as composições de Alexandre Desplat, oscilando bastante entre gradações mais mornas até um momento realmente digno no segmento A Sala de Jantar Privada do Policial.
Um grande momento
“Tudo é Simone”