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A Separação

(Jodaeiye Nader az Simin, IRA, 2011)

Drama
Direção: Asghar Farhadi
Elenco: Payman Maadi, Leila Hatami, Sareh Bayat, Shahab Hosseini, Sarina Farhadi, Merila Zare’i, Ali-Asghar Shahbazi, Babak Karimi, Kimia Hosseini, Shirin Yazdanbakhsh
Roteiro: Asghar Farhadi
Duração: 123 min.
Nota: 10 ★★★★★★★★★★

Ainda que se passe no Irã, um país onde questões religiosas sempre ultrapassam seus limites, e aborde temas muito específicos do local, A Separação é um filme que transcende qualquer limite territorial ou cultural. Muito mais do que um filme sobre os habitantes de lá, apoia-se em sua universalidade. Para compreender cada um dos sentimentos vistos na tela, basta ser humano.

Em sua simplicidade e acessibilidade, o longa se destacou ao redor do mundo, levando mais de 50 prêmios para casa, incluindo o Oscar, o César, o Globo de Ouro e o Independent Spirit de melhor filme estrangeiro e o Urso de Ouro no Festival de Berlim, entre outros. Essa quase unanimidade surpreende, mas basta ver o filme para que entendamos o porquê.

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Nele vemos um casal que aparentemente ainda se ama em vias de separação. Simin quer sair do país para tentar oferecer um futuro melhor à filha pré-adolescente, mas Nader não quer abandonar o pai que sofre de Alzhaimer. Assim decidem separar-se e ela se muda para a casa da mãe.

A menina fica com o pai que, por causa de seu emprego, não pode ficar em casa cuidando do idoso e contrata uma diarista, Razieh. Um dia, ao chegar em casa, ele encontra o local vazio e o pai amarrado à cabeceira da cama. Minutos depois a empregada chega, os dois discutem e ele a manda embora. Na discussão, ele a empurra porta afora, ela cai nas escadas e perde o bebê que estava esperando.

Acusado de homicídio, Nader tenta livrar-se como pode da situação. São demoradas sessões na delegacia e muitos conflitos fora dela, além da presença quase opressiva do descontrolado marido de Razieh, Hojjat, que não se conforma com a agressão sofrida pela esposa e quer justiça a qualquer custo.

Ashgar Farhadi dosa o conhecimento do público e dos personagens com uma precisão impressionante. Não sabemos de tudo, mas pela onipresença do espectador, temos muito mais informações do que qualquer um. Sabemos o que levou Nader a perder a cabeça e que Razieh teve motivos para deixar o senhor senil sozinho, conhecemos o dilema da pequena Termeh e compreendemos o desespero de Hojjat. Mas experimentamos a mesma sensação dos que vemos na tela por nunca termos a completude dos acontecimentos. Com situações bem amarradas, um certo clima de suspense e o desejo pela solução fazem com que as mais de duas horas de filme passem num piscar de olhos.

Moral, fé, medo, incompreensão e amor se misturam com mentiras, questionamentos, decepções e criam um ambiente de desespero contido, onde os acontecimentos conseguem ser arrastados e urgentes na mesma medida, onde silêncios se chocam a falas precisas e o coração segue apertado em busca de alguma solução para a situação quase insustentável.

Por alguns momentos, é possível identificar toda a intrincada trama vista como uma metáfora ao fim de um relacionamento. Claro que as situações são muito específicas, mas estão lá a sensação de fracasso, aquele momento em que a mentira parece ser muito mais conveniente do que a verdade, a desestruturação do que estava estabelecido, as atitudes impensadas, o não escutar o outro, a fuga, a descrença e o medo do futuro. Elevados à quinta potência, mas quem já passou por algo assim consegue identificar cada um desses sentimentos.

Para contar sua história, e universalizá-la de maneira tão funcional, o diretor e também roteirista iraniano vai além de saber dosas suas palavras. As construções cênicas, cuidadosamente pensadas, levam à tela toda a dualidade da situação. Além disso, o trabalho preciso de Payman Maadi como Nader, Leila Hatami como Simin e Sareh Bayat como Razieh só contribui para o resultado perfeito.

A Separação é um filme que consegue transcender a tela e jogar o espectador dentro de sua agonia. Apesar de não ser uma experiência das mais fáceis e parecer cansativo para alguns, é tão real e bem elaborado que, mesmo depois de 123 minutos, você não quer se separar daquela família. Os créditos vão subindo e o público permanece sentado, esperando.

Imperdível, imprescindível, inadiável.

Um Grande Momento
Aguardando a decisão de Termeh.

Logo-Oscar1Oscar 2012
Melhor Filme em Língua Estrangeira

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Links

IMDb Site Oficial [youtube]http://www.youtube.com/watch?v=Dlt6-aDWAVI[/youtube]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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