- Gênero: Drama
- Direção: Paulo Nascimento
- Roteiro: Paulo Nascimento
- Elenco: Edson Celulari, Lucas Zaffari, Carol Castro, Nicola Siri, Néstor Guzzini, Gabrielle Fleck, Pedro García
- Duração: 90 minutos
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Em determinado momento de Ainda Somos os Mesmos, filme de abertura do Cine PE 2023 fora da competição, um personagem declara em um diálogo as três seguintes palavras: família, pátria e Deus. Sabemos a quem o filme está apontando o dedo nesse momento, e em que esfera a produção busca culpabilizar pelos desastrosos últimos anos que vivemos. São os reais culpados mesmo, o Estado conivente com as forças armadas em busca de determinar o filme de quaisquer democracias de qualquer tempo, e instalar o horror entre os que buscam liberdade irrestrita. Essa não deveria ser uma mensagem apenas de uma obra audiovisual, mas uma busca constante de qualquer pessoa ligada à arte, para que todo cerceamento da arte seja combatido, e qualquer opressão seja impedida de retornar.
Paulo Nascimento (de Em Teu Nome e A Oeste do Fim do Mundo) é um cineasta com uma vasta experiência, sendo esse o seu título de número 11 na carreira. Isso torna ainda mais estranha a sessão de Ainda Somos os Mesmos, um filme que preserva seus questionamentos diante dos quais o espectador fica impassível, muitas vezes. Diante de uma crítica tão acertadamente frontal diante do que nos assola politicamente, esperava-se que seria mais fácil acertar cinematograficamente os pontos que ambiciona, até pelo envolvimento dos personagens naquela história. O que vemos é o oposto: durante muito tempo da projeção, nos vemos perdidos diante do que se mostra e/ou propõe. A certeza é no quanto as habilidades de seus profissionais não foram capazes de mostrar o talento imaginado, porque aqui eles não estão, exatamente.
O que temos em Ainda Somos os Mesmos é uma produção que parece ir contra as suas ideias de origem, que é retratar um período sombrio da América Latina, próximo a tornar-se novamente possível. Ao invés disso, vemos uma produção onde quase tudo parece artificial em cada gesto, composição ou escolha. Não é apenas uma dramatização exagerada de um tempo, mas uma forma falsa de reprodução do melodrama. Poucas coisas são críveis em cena, e isso não engloba o trabalho dos atores, mas um processo de construção de decupagem, que simplesmente parece não ter sido concebida. Em seu lugar, temos várias passagens onde elementos externos invadem o plano e roubam negativamente sua ideia de potência, que é esvaziada a cada novo bloco.
Desde o figurino até a montagem, passando por uma inexplicável trilha sonora, não há credibilidade possível que nos faça possível compreender o incompreensível. Como essa inserção de música inconveniente durante quase o tempo todo, quando o silêncio poderia se fazer presente. Os diálogos e o encadeamento narrativo nem é um problema grave (embora sim o seja), mas sim a condução sem capricho, o desleixo na hora do tratamento imagético e da sua continuidade e adequação. Embora muitos irão reclamar, me incomoda muito mais a construção exagerada de todos os outros personagens, cheios de maniqueísmo, do que a situação, digamos, ligeiramente constrangedora e um tanto surreal entre Carol Castro e um objeto inanimado.
Além de toda a edição deficiente, Ainda Somos os Mesmos não consegue desenvolver o que deveria ser o mais básico em uma produção, que é sua credibilidade. Assistimos a toda projeção sem acreditar em qualquer interação em cena – dos atores com os cenários, ou uns com os outros, ou da delimitação temporal que acontece no roteiro. Ainda que pese a seu favor ser condicionado a uma lembrança, ver Edson Celulari (que já esteve com Nascimento em Diário de um Novo Mundo e Teu Mundo Não Cabe nos Meus Olhos) e a já citada Castro em cena sem saber o que fazer, é de uma crueldade sem tamanho. No meio de um quadro de não saber no que se agarrar para tentar se ater, a presença de Néstor Guzzini em cena é um bálsamo raro. São do ator premiado em Gramado por Meu Mundial os únicos pontos de credibilidade de todo o projeto; como o Embaixador argentino, o ator tira do fundo dos olhos a necessária postura para construir esse tipo, que paira acima do resto como uma ilha de acerto envolvido por erros.
Em uma produção que carece tanto de humanidade, de acessar o empático a todo custo, Ainda Somos os Mesmos soa como uma provocação negativa. Fora o Embaixador, tudo o mais bate no espectador como um teatro amador, onde a encenação precisa esconder o que não cabe no palco. E os planos vão vazando o que é preciso esconder, como as inadequações coletivas, desde a inapropriação estética de elementos cênicos até a ideia falsa de transformar os tipos em imbecis, sejam mocinhos, vilões ou o meio termo. É uma pena que uma premissa tão excepcional não tenha rendido o mínimo possível para que a experiência do espectador seja tão decepcionante.
Um grande momento
Família, pátria e Deus
Cara, quando tu fizer o teu filme, faz tudo que você comentou aqui, mas não tenta fazer o meu.
Entre teu elogio e o aplauso de 5 minutos do público no final da sessão eu fico com a segunda opção. É para pessoas que contamos histórias, não para haters.
Patético teu comentário. Isso que eu chamo de raiva do invisível.
Bom tratamento para você.