- Gênero: Drama
- Direção: Raven Jackson
- Roteiro: Raven Jackson
- Elenco: Charleen McClure, Moses Ingram, Kaylee Nicole Johnson, Reginald Helms Jr., Sheila Atim, Chris Chalk, Jayah Henry, Zainab Jah
- Duração: 92 minutos
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Sentir. Essa é a principal intenção de Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal. Ali está a história de vida de uma mulher, mas ela não vai ser contada da maneira que vemos sempre. Ela experimentou o amor, a dor, a alegria e a tristeza. Correu pelos campos com sua irmã, se apaixonou, chorou no colo da avó, foi mãe (ou tia), admirou a mãe e pai, e envelheceu, e cada um desses momentos é responsável pelo que Mack é hoje, assim como ela fez cada um desses momentos também.
São recordações e a diretora Raven Jackson (do ótimo curta Nettles) é habilidosa na disposição dessa coleção de lembranças transformadas em lindas e vívidas imagens captadas em 35mm. Como a memória, não há aqui um fluxo organizado, os eventos vão e voltam no tempo, relacionando personagens ou não, trazendo elementos para melhor conhecer Mack ou não. O interesse da cineasta na configuração da memória é evidente. Ela destaca sua não-linearidade, a incompletude e, mais do que tudo, seu caráter sensorial. O quanto daquilo que recordamos está em cheiros que nos remetem algo? Em superfícies que tocamos ou em músicas que ouvimos e nos levam a algum momento? Cores, detalhes, sons e situações às vezes nos transportam para lugares de onde quase não nos lembrávamos mais.
Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal é feito em detalhes, como resgatando os gatilhos de memória de Mack e seus respectivos momentos. Assim, quase nunca vemos a completude da cena, mas podemos senti-la muitas vezes. Nesse mesmo jogo, experienciamos o momento assim como a protagonista, ora como quem observa, ora como quem age. E Jackson dá à trama o tempo da personagem, sem se intimidar no prolongamento de pausas e silêncios, e, muito menos, em abreviações ou encurtamentos. Não que se perceba a configuração como fundamental para acessar ou compreender a personagem, até porque não é essa a intenção, mas porque esse é o seu jeito de enxergar a memória.
As cenas são pensadas para ressaltar o que ficou do passado, pequenas marcas invisíveis da existência, como a mão da avó depois da morte da mãe, ou o desejo do não concretizado, como antes do plano abrir no reencontro com Wood. Há momentos muito tocantes e relações mais dolorosas, que, nem por isso, voltam sempre em reminiscências amargas. Elas até estão lá, em especial na ligação com Evelyn, imponente na memória de Mack e com seu impacto fielmente representado em tela por Sheila Atim (A Mulher Rei e Ferida), mas estão sempre entrecortadas por momentos de admiração e afeto, mesmo que simples, como uma dança ou o ato de se maquiar.
Seja na mais complexa relação de uma mulher, qualquer mulher, ou nas mais simples e corriqueiras; entre dores e amores; traumas, violências e comunhão; o passar do tempo e da vida, e os traços que isso deixa em cada um, são lindamente retratados em Todas as Estradas de Terra Têm Gosto de Sal. Mesmo que haja uma trilha que exagera aqui, um diálogo que quer impressionar ali e, às vezes, o encontro desses dois, o conjunto é tão tocante, que a isso se releva e Jackson consegue fazer dos sentidos de Mack os nossos sentidos. Uma bela jornada para todos aqueles que nela embarcarem.
Um grande momento
“If I were your woman”