Crítica | Streaming e VoD

Awake

Passatempo com algum refinamento

(Awake, EUA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Ação
  • Direção: Mark Raso
  • Roteiro: Gregory Poirier, Joseph Raso, Mark Raso
  • Elenco: Gina Rodriguez, Ariana Greenblatt, Lucius Hoyos, Trevor Hayes, Sebastian Pigott, Brigitte Robinson, Dan Beirne, Shamier Anderson, Rebecca Ablack,
  • Duração: 96 minutos

A ansiedade passou a ocupar ainda mais espaço de discussão conforme a Covid-19 foi se alastrando pelo mundo, há um ano e meio. Caminhando para se tornar doença quando seus sintomas não cessam e repercutem na vida cotidiana, o lançamento da Netflix Awake tanto pode ser visto como uma metáfora para os efeitos mais graves de uma crise de ansiedade, quanto a própria produção pode provocar pode também reações típicas de crises relacionadas à mesma, dado seu grau de intensidade constante. Seus gatilhos narrativos sugerem, a partir do fenômeno inexplicável que acomete a comunidade em questão (será mais?), que a produção está interessada em observar uma fatia da sociedade cada vez mais adoecida e sem respostas. 

O diretor Mark Raso tem algumas experiências anteriores no comando de uma produção, mas parece que aqui tem finalmente um espaço com visibilidade relativa para revelar possíveis predicados. Trata-se de uma experiência de conexão do público buscada pela direção, alcançada gradativamente e acionada a partir de cenas pontuais, que culminam em um culto apavorante. Antes de tais cenas, algumas outras já prenunciam o meticuloso trabalho de seus profissionais para inserir o espectador em um crescendo de desespero, desconfiança, medo e violência que acompanham o desaparecimento de energia elétrica de uma cidade e a incapacidade de dormir dos humanos – as máquinas desligaram e os seres não conseguem desligar. 

Awake (2021)

O roteiro escrito pelo diretor e seu irmão Joseph além de Gregory Poirier não é o melhor tratamento possível para os eventos que mostra, muito mais interessantes quando observados de longe do que quando aprofundados em seu núcleo principal. O olhar macro para a situação apresentada suscita questões muito interessantes como os efeitos colaterais no corpo humano quando ficamos sem dormir mais do que o previsto – e sabemos que a pandemia mudou os hábitos sociais relacionados ao descanso, e em como a já citada ansiedade permitiu que esse descanso acontecesse. Mas ao costurar a história de seu núcleo base de maneira mais detalhada, Awake resvala em incongruências e exageros dramáticos. 

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Uma das situações mais disparatadas parte da protagonista vivida por Gina Rodriguez, premiada pela série Jane the Virgin, que em meio a tentar descobrir uma cura para os humanos e proteger os filhos, descola um tempo para ensinar sua filha de 10 anos a atirar, dirigir e… “fazer uma chupeta” de gasolina (!!!), das decisões mais inacreditáveis que uma mãe poderia tomar no cinema recente. Além disso, tem um carro – objeto de desejo do filme, já que hoje a maioria tem componentes eletrônicos, ou seja, pifaram também – circulando livremente sem ser atacado, até o momento em que o roteiro precisa que ele seja, obviamente. Detalhes que parecem bobos sozinhos, mas juntos não ajudam a qualidade do material. 

Awake (2021)

Mas o que não faz na elaboração do material narrativo, Raso eleva no imagético, com um compêndio de cenas que elevam o material, deixando o espectador em constante estado de tensão. Como se estivesse sempre em primeira pessoa, a câmera do diretor mergulha junto com o mesmo em um impressionante acidente logo no início, que termina no fundo de um lago, cenário que ao final também é palco de seu desfecho, momento de realização igualmente refinada. O clímax de Awake é um palco assustador de desestruturação psicológica de resultado angustiante, um dos pontos altos da produção, que talvez só escorregue em uma ambientação escura em demasia e uma tentativa de homenagear o famoso plano sequência do ataque ao carro de Filhos da Esperança, em vão. 

O resultado na tela rende sentimentos mistos, com um roteiro que deveria ter passado por novos tratamentos mas que ainda sustenta algumas qualidades principalmente ao não responder todas as perguntas que a narrativa faz, e  uma direção de nível elevado, realmente esmerada, mas que não consegue acertar sempre. Awake com certeza será mais um sucesso vindo da Netflix que teremos gosto em indicar pelas próximas semanas e que nos fará observar a carreira de seu diretor com interesse, mas que talvez não sobreviva à lembrança dos próximos meses. 

Um grande momento
A igreja 

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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