(Work It, EUA, 2020)
Há dois meses atrás a Netflix lançou um filme que foi um grande sucesso, Feel the Beat, uma comédia musical muito descompromissada e por isso tão simpática e acessível a todos os públicos, não apenas aqueles interessados em música e dança. Dançarina Imperfeita (péssimo título em português para o original Work it, que como o filme comentado acima funcionaria muito mais sem tradução) tenta beber em muitos outros interesses: o sucesso do filme, o do interesse do público por competições de dança, o de coreografias elaboradas e detalhadas, e um foco especial em Sabrina Carpenter, jovem cantora e atriz que esteve em séries da Disney e em Crush à Altura, também na Netflix.
O ritmo é o das comédias/aventuras teen de sempre, com a mesma estrutura narrativa, as mesmas viradas dramáticas, os mesmos pontos de inflexão. Temos duas equipes rivais de dançarinos, a que está a protagonista é formada por desajustados que nunca dançaram profissionalmente, e a outra é uma exímia campeã liderada por um arrogante com pinta de vilão. Quinn irá aprender não apenas a dançar no processo, como irá perder os novos amigos em determinado momento, irá se apaixonar pelo coreógrafo, irá rever seus sonhos de menina, tudo isso terminando no clímax da competição – quantas vezes já vimos isso tudo?
Dançarina Imperfeita tem pouco charme fora das cenas de dança, mas se garante no interesse por elas. E se o espectador for um profissional ou entusiasta do assunto, o programa será acertado; o filme não apenas gira em torno do universo, como realmente conta com coreografias excelentes, muito bem filmadas e executada com afinco por gente do ramo. A própria Sabrina é um exemplo: em nenhum momento ela convence como alguém que precise aprender a dançar, as cenas que demonstra não saber são engraçadas de modo não-intencional, porque sua desenvoltura é óbvia desde sempre.
Talvez como um documentário sobre coreografias ou a preparação de grupos de dançarinos para competições o filme fosse mais bem sucedido. A narrativa da produção não apenas interessa menos ao olharmos para o todo; ela não tem brilho ou charme particular, além de incorrer em inúmeras pendências que se acumulam e, por excesso, não podem ser perdoadas como um deslize pontual. O roteiro de Alison Peck (do inexplicável Uglydolls) avança sem elos que interliguem cenas, situações e sentimentos, elas apenas acontecem de maneira absurda e o espectador que engula. Não há uma coerência entre fatos e personagens, apenas as necessidades do roteiro.
Isso leva a pelo menos um questionamento a respeito de uma das bases fundamentais de sua protagonista. Quinn é uma aluna espetacular – não é ótima, nem acima da média apenas, ela tem média 10 em todas as matérias; não é 9, ou 8.8, é média 10, dito em uma cena. Pois bem, a aluna começa a aprender dança e seu rendimento escolar cai. Ok, um clichê típico, normal… uma aluna de média 10 cujo rendimento cai vai para 8, 7 se despencou né… afinal, o conhecimento que a personagem tinha era adquirido em anos e anos. Não. Quinn cai de rendimento em poucas semanas a ponto de ficar com nota vermelha e inclusive é suspensa. Uma aluna que era um modelo de perfeição. Como tantos desdobramentos, isso acontece num estalar de dedos, e deixa de acontecer nas cenas seguintes.
Ou seja, Dançarina Imperfeita, um filme que versa sobre a descoberta da paixão pessoal como propulsora do sucesso, acaba falhando fragorosamente na sua própria tentativa de mostrar o nascimento dessa paixão – como descrito acima, não somente porque ela sempre esteve lá, como também por não criar um mínimo de coerência nas ações e reações que o filme acompanha. Ainda que as intenções da diretora Laura Terruso tenham sido em fixar apenas na dança para representar como o ato físico transforma o emocional de maneira particular, a falha em construir imagetica e narrativamente esse percurso transforma o filme num eletrizante desfile de coreografias incríveis. E só.
Um grande momento
O clipe dos suspensórios