- Gênero: Drama
- Direção: Arnaud Desplechin
- Roteiro: Arnaud Desplechin, Julie Peyr
- Elenco: Denis Podalydès, Léa Seydoux, Emmanuelle Devos, Anouk Grinberg, Madalina Constantin, Miglen Mirtchev, Rebecca Marder
- Duração: 105 minutos
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Imerso em palavras, muitas palavras, numa pretensiosa costura narrativa que simula pseudo-papéis, Desplechin finalmente realiza o seu sonho de levar às telas a adaptação de “Engano”, romance semi-autobiográfico de Philip Roth centrado nos diálogos de dois amantes. Muito se mantém, muito se perde. Um outro tanto se torna evidente para além das páginas, trazendo um narcisismo de filmes idos, e há pouco o que se aproveite.
Deception, que significa decepção em português, é aquilo que se sente, pelo resultado; pela qualidade desperdiçada das atuações de Denis Podalydès e Léa Seydoux como o casal, ou pior, de Emmanuelle Devos como a ex-amante doente; pelo tempo perdido. Por que não é apenas inadequação de estilo ou trato narrativo, não é somente um desacerto regional que torna o filme gelado ou a inserção de passagens nada envolventes, mais do que chato, o filme em si — e tão cheio de si — é um equívoco.
Se há alguma curiosidade em jogos de transformação, do cenário, das personas; ou suspense, na possibilidade da imaterialidade da musa, nada disso dura. Não há interesse. O foco de Deception é Philip, o escritor judeu americano expatriado que coleciona mulheres, e nem mesmo o olhar destinado a ele, ainda que acompanhado por tantas palavras é profundo. Nada é. Tudo parece ser uma imagem superficial de algo que o texto demonstra talvez poder ser mais profundo em algum outro lugar. A identidade, a solidão, o amor, a ausência. O que se escuta, mas não se vê e nem se sente.
Perdido nessa espécie de vácuo, Deception não resiste à própria misoginia. No desfile de mulheres a servir a essa figura central, não há restrições ou descanso à fragilidade e dependência das que o idolatram e modificam suas rotinas, o perdoam, esperam por ele e creem. Ele é o que suga, usa e depois descarta, e não é inesperado que esteja nesse papel egóico e auto-indulgente, mas é grave que surja como algo exclusivo. Há, inclusive, um emaranhado de outras questões individuais de Philip que Desplechin cita e joga no lixo, mirando seus holofotes para isso.
“Mas estou resguardado”, poderia dizer o diretor que escreveu o roteiro ao lado de Julie Peyr e fez questão de incluir a cena onde Philip passa por um julgamento num tribunal de feministas onde precisa rebater as acusações de sua misoginia — em camadas, Philip, Roth, Desplechin. Não é sobre isso. É sobre ter um personagem e transformá-lo apenas nisso. É sobre ter toda uma história e fazer dela só uma coisa, que no final das contas é muito, muito menos do que deveria ter sido. E chata ainda.
Um grande momento
O jogo das perguntas