- Gênero: Drama
- Direção: Sarah Spillane
- Roteiro: Sarah Spillane, Rebecca Banner, Cathy Randall
- Elenco: Teagan Croft, Cliff Curtis, Anna Paquin, Josh Lawson, Alyla Browne, Bridget Webb, Vivien Turner, Stacy Clausen, Todd Lasance
- Duração: 100 minutos
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Destemida tinha tudo para ser mais um filme, uma estreia qualquer da Netflix, dessas que farão sucesso uma semana e serão esquecidas. E é isso mesmo, um momento biográfico na vida de uma adolescente de 16 anos, que realizou um feito notável. Não teria muito mais pra destacar do filme, não fosse uma produção nos ganhando ao longo desse tal feito da moça em questão. Logo, podemos dizer que essa estreia de hoje é um filme qualquer, porém em determinado momento o espectador se vê dobrado pela aventura maior que a vida que Jessica Watson captura para si, com uma convicção impressionante. A partir do primeiro baque da protagonista, entendemos porque estamos assistindo o filme e porque ele vai permanecer conosco um pouco mais do que deveria.
Watson convenceu-se e aos seus pais que seria a mais jovem velejadora a dar a volta ao mundo em um barco relativamente pequeno, sem parada em portos ou de abastecimento. Em um misto de irresponsabilidade e ousadia, a jornada dela acaba por se iniciar a partir de sua Austrália natal e teria o prazo de duração de sete meses, cruzando oceanos e tentando sobreviver às tempestades indescritíveis pelo caminho. São exatamente esses momentos de perigo que acabam por carregar adrenalina para dentro de Destemida, tirando do filme uma certa burocracia que estaria estampada em seu DNA. Ainda que nada fuja dos padrões, são esses momentos que deixam no filme uma certa diferença entre assisti-lo e ler as descrições no wikipedia.
A personagem também deu a sorte de que a escalação para vivê-la acabou caindo no colo da talentosa Teagan Croft, que empresta doses de doçura a uma moça indomável, mas que não tinha muita impetuosidade, apenas uma perseverança inabalável. Através de sua história, Destemida acaba ganhando uma argamassa de empoderamento feminino que passa por inúmeros setores da produção. Da diretora Sarah Spillane e suas companheiras de roteiro, chega até a montadora Veronika Jenet (indicada ao Oscar por O Piano) e segue até o resto do elenco e família da personagem principal, com irmãs adoráveis e uma mãe vivida por Anna Paquin; quem diria que a pequenina oscarizada pelo O Piano agora seria mãe de quatro?
O filme consegue se livrar também de um possível flerte com a repetição, tendo em vista que a protagonista passa 80% do tempo sozinha em um barco, em comunicação telefônica com a família e seu instrutor. Apesar disso ser o tônus da produção, há um clima de tensão no ar que percorre toda a duração. Sabemos que obviamente os perigos serão o palco do filme, e a produção realiza isso com muito louvor, colocando o público em momentos exasperantes. Infelizmente o filme não se ocupa de acompanhar dramaticamente essa dinâmica da direção; os personagens poderiam ser muito melhor desenvolvidos, principalmente porque somos apresentados a eles e conhecemos o potencial de cada um.
Quem se livra dessa pecha é o Ben Bryant vivido por Cliff Curtis. Espécie de técnico e conselheiro da jovem, o ator agarra o personagem e dá a ele curvas cheias de inflexões. Trata-se de um homem introspectivo, cuja personalidade contrasta com a efusividade e juventude de Jessica e o veterano ator que já fez tanto grandes filmes como O Informante como bobagens monumentais como 10.000 A.C. carrega o tipo com brilho, em cenas muito comoventes como o do almoço de Natal – onde Bryant está desconcertado de tão constrangido – até seu último lance em cena, a coroação de um grande personagem. Ele e Watson, a personagem, transformam Destemida em algo maior do que ele nasceu pra ser, um filme ligeiro que nos arrebata com a força de suas ondas.
Um grande momento
“Vocês precisavam ver esse céu”