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Destinos à Deriva

(Nowhere , ESP, 2023)
Nota  
  • Gênero: Suspense, Aventura
  • Direção: Albert Pintó
  • Roteiro: Indiana Lista, Ernest Riera, Seanne Winslow, Teresa de Rosendo
  • Elenco: Anna Castillo, Tamar Novas, Tony Corvillo
  • Duração: 105 minutos

Na contramão das acusações que sofre (em alguma medida, acertadas), a Netflix e o Cinema, de vez em quando, mostram um outro lado de sua linha de produção cheia de padrões repetidos. Essa estreia de Destinos à Deriva se encaixa nesse lugar, ainda que em linhas gerais saibamos onde aquilo está sendo remexido, nos pontos específicos existem uma sanha de elementos ali bem diferenciados. Às vezes, tudo o que um prato precisa não é do melhor chef, nem dos alimentos mais sofisticados e caros, mas do tempero acertado para tornar a experiência diferenciada. Em um tempo onde tais experiências em uma sessão estão cada vez mais escassas, encontrar um material com esse detalhamento à narrativa pode ser suficiente para um tempo de relaxar. 

Esse é o terceiro longa de Albert Pintó, que anteriormente lançou aqui Terror na Rua Malasaña, e aqui ele se revela um excelente criador de aflição. Não, não quis dizer tensão em específico, mas aflição mesmo em doses garrafais. É quase na totalidade da duração de Destinos à Deriva que ficamos em estado permanente de enervação ininterrupta, em momentos que parecem feitos para que percamos todas as unhas. Com situações-limite praticamente coladas umas às outras, o filme é um produto pensado no espectador mais ligado ao escapismo de todas as maneiras. E nesse sentido, a decepção passa longe do resultado obtido, porque a ideia era verdadeiramente fazer cada um na frente da tv chegar até a ponta da cadeira. 

A matéria-prima narrativa é bem extravagante: um casal foge de um regime totalitarista que acaba de explodir onde vivem, e quando percebem, estão separados em containers diferentes, em um navio com rumo desconhecido. Após uma tempestade alucinante, as duas estruturas são arremessadas em mar aberto, do qual não sabemos se conseguirão boiar, ou por quanto tempo. De aparência menos elaborada do que imagina ser, trata-se de um daqueles títulos de sobrevivência solitária, como tantos que já assistimos, como Náufrago. O que o diferencia de verdade para semelhantes, é que até existe uma preocupação psicológica em Destinos à Deriva, mas ela é ínfima diante do que a catarse prevê acontecer com cada um do público que o acesse.

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Escrito a oito mãos, Destinos à Deriva tende a entregar algo que produza criação de endorfina no nosso corpo, emparelhando imagens muito bem estruturadas em sua construção estética e uma sensação de adrenalina indescritível. Trata-se de um daqueles títulos onde a elaboração visual passa pelos efeitos visuais e suas possibilidades, que recriam um ambiente perfeito a alguém que está em algo tão desesperador quanto Mia. Seja tapando os buracos de seu container com uma fita crepe, seja abrindo um buraco no teto como se fosse uma lata de sardinha, o filme é uma descarga constante de prazer culpado no corpo. Torcemos o tempo todo para que nossa heroína consiga se livrar do atual problema, justamente para que ela caia no seguinte e possamos torcer de novo. 

Com isso, se existia algum teor político na produção, ela desce por água abaixo quando percebemos que é maior a vontade absurda de nos ver com os olhos arregalados. Quase como se fosse assistir a um jogo de videogame sendo acessado por terceiros, Destinos à Deriva está em lugar parecido com o que está A Queda, produção do ano passado onde igualmente não sobraram unhas. Com efeitos especiais muito competentes e uma cuidadosa interpretação de Anna Castillo, Pintó elenca uma fileira de momentos cheios do mais puro estado de aflição. Esse sentimento que parece perdido em meio ao muito de CGi inadequado usado inesperadamente, essa nova produção chegada ao streaming mostra que muito pode ser feito, quando há talento e empenho. 

Um grande momento
Containers ao mar

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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