Crítica | Streaming e VoD

É o Bicho!

(Animal Crackers, CHN, ESP, KOR,, EUA, 2017)

  • Gênero: Animação
  • Direção: Tony Bancroft, Scott Christian Sava, Jaime Maestro
  • Roteiro: Dean Lorey, Scott Christian Sava
  • Duração: 105 minutos
  • Nota:

Essa nova animação É o Bicho! tem uma carreira de lançamento a cara do nosso tempo. Muito bem recebida no Festival de Annecy (o maior festival de cinema de animação do mundo) em 2017, sua compra foi bem disputada e o filme foi adquirido para inúmeros mercados por lá. Desde então, vem se arrastando pra ser lançado em cada país – quem disse que enfrentar Disney, Pixar, Universal, Dreamworks, Aardman, Laika é fácil? Pois bem, a estreia no Brasil e nos EUA estava marcada para esse ano… e a pandemia levou as últimas esperanças pro ralo. Vendida para a Netflix, o filme estreou ontem finalmente, encerrando uma jornada longa.

Mas quem se importa com esse assunto, quando o barato é acompanhar um circo (???) cujos animais (???) não passam de humanos transformados (???), não é mesmo? A quantidade de interrogações se justifica porque não é só a “fantasia” que um típico produto infanto-juvenil comumente apresenta a surpreender aqui. Até recentemente o terceiro capítulo da saga Madagascar foi ambientado num circo, mas esse cenário parecia bucólico lá por conta do saudosismo a um espaço em decadência, e aqui essa estranha nostalgia se repete. Completamente desacostumada com o ambiente, crianças se alegrarem com ambiente circense parece coisa dos Saltimbancos Trapalhões; não a toa, o filme aqui começa em 1963.

É o Bicho!, animação da Netflix

Também os animais parecem só fazer sentido dentro do cenário do filme enquanto “faz de conta” mesmo. Os circos caíram em desgraça pelos mesmos motivos com que os zoológicos hoje parece um modelo antiquado de mal trato animal. Como muitas crianças do passado se interessavam muito em ver elefantes e tigres em atividades incomuns, os circos precisaram se reinventar para manter sua essência e seu interesse sem os animais. É o Bicho! apresenta sua saída fantástica para o problema, e das coisas mais saudáveis da trama é o fato do público ter consciência da origem dos “animais”, e entrar na brincadeira – é um espetáculo de magia, e é exatamente isso que encanta no Buffalo Bob’s Rootin’ Tootin’ Animal Circus.

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Adaptação de uma graphic novel de Scott Christian Sava, o filme é dirigido por ele e Tony Bancroft (de Mulan), que abusam do visual colorido pra ganhar o que lhe é de interesse, o público infantil. Apesar de contar uma história com adultos em sua maioria, o filme os insere num contexto cômico e fantasioso pra conquistar essa fatia, que hoje não é o foco principal do maior estúdio de animação do mercado há décadas. O estúdio do Mickey Mouse achou um filão com produtos rebuscados, elevados e que são arrebatadores, mas que muitas vezes não são absorvidos pelos pequenos. Com isso em mente, os diretores vão direto ao ponto pra que o visual capte os pequenos, enquanto os adultos… bem, esses se dediquem a encontrar os defeitos.

É o Bicho!, animação da Netflix

Na ânsia de não complicar o entendimento, É o Bicho! comete deslizes temporais, acelera muito sua narrativa quase a perder parte da conexão, salta a passos largos por inúmeras passagens e explicações e, o mais grave, não conecta os elos e não promove encontros necessários e cruciais no que é basicamente uma grande história familiar. O clímax do filme, uma imensa “batalha” entre tios e sobrinhos, deixa cair fichas positivas e negativas pelo caminho. De um lado, o espetáculo livre com acesso e torcida do espectador do circo; de outro, uma sucessão de revelações são feitas no meio de uma grande briga – ao menos uma que estava óbvia desde o princípio. E um personagem muito importante simplesmente desaparece ao final.

Mas sem a “carranquice” de um crítico de cinema analítico demais, podem saltar aos olhos motivos pra comemorar, como o viés extremamente feminista da produção. Todas as personagens inteligentes, inventivas, trabalhadoras, modernas e responsáveis do filme são mulheres, enquanto os homens são profundamente incapazes, incluindo um protagonista que tem muitas sacadas machistas, como cometer manterrupting mais de uma vez com a esposa (não a deixar falar). Como o filme resolve isso? Dando todo podia à ela e sua filha, que basicamente vencem sozinhas o clímax.

É o Bicho!, animação da Netflix

O saldo final é positivo, embora os problemas não sumam. É o Bicho! é uma produção modesta, sem os requintes de roteiro que costumamos ver em animações hoje, e que bebe em O Rei Leão aqui e ali, mas sobra simpatia ao produto como um todo, e junte um elenco de vozes originais incrível, que vai do casal Emily Blunt e John Krasinski, a Danny DeVito, Ian McKellen e Sylvester Stallone, as cerejas de um bolo que vale a pena comer.

Um Grande Momento:
“Don’t Stop me Now”

Ver É o Bicho! na Netflix

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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