Crítica | Streaming e VoD

A Extorsão

Thriller noventista, pro bem e pro mal

(La extorsión, ARG, 2023)
Nota  
  • Gênero: Suspense
  • Direção: Martino Zaidelis
  • Roteiro: Emanuel Diez
  • Elenco: Guillermo Francella, Pablo Rago, Andrea Frigerio, Alberto Ajaka, Guillermo Arengo, Carlos Portaluppi, Mónica Villa
  • Duração: 102 minutos

Muito antes de surgirem Liam Neeson e Gerard Butler nas telas dos cinemas de ação, existia um mocinho cinquentão que era meio representado por Harrison Ford nos anos 1990. Era um homem pacato, com nenhum histórico prévio de violência, que se via envolto em uma trama mirabolante à sua revelia – papel que desempenhou, entre outros títulos, em Busca Frenética e O Fugitivo. Esse thriller de correria típico do período dividia espaço nas videolocadoras e no ‘Supercine’ com o thriller de tintas sensuais, e ambos fizeram a festa de quem procurava emoção baratíssima que às vezes rendia títulos acima da média. O primeiro exemplo é revitalizado neste A Extorsão, que a Argentina hoje pode se dar ao luxo de produzir sem competição com o mercado estadunidense. 

Dirigido por Martino Zaidelis e escrito “de maneira bem livre” por Emanuel Diez, A Extorsão é genérico e não pode ser levado a sério, assim no esquema de ficar analisando friamente cada passo do roteiro. Nada em cena pede um comprometimento estético ou narrativo que tire o espectador de uma zona segura da análise de credibilidade; estamos falando de um thriller sem qualquer outra pretensão que não a diversão do público, e não há mal algum nisso. Quem conviveu com essas produções de 30 anos atrás sabe que, alguns exemplos que saltavam aos olhos, o cenário era de repetição e de abstração da realidade. Além disso, as amarrações de situações aqui são bem frouxas, e se não houver uma boa vontade, o aborrecimento vem de graça. 

Estamos falando de um desses títulos onde o protagonista toma todas as decisões erradas cena a cena, e segue errando filme afora, até o buraco que cavou literalmente não ter mais volta. Ao contrário do que o bom senso anuncia (junto de alguns personagens), Alejandro não consegue perceber que nada apareceu na sua vida para ajudar, e que o melhor a fazer seria saltar para o lado certo. Mas o que ele tenta impedir ao embarcar na canoa furada não será impedido por muito tempo, e logo ele se verá tendo que mentir para cada pessoa que cruza seu caminho, da esposa aos amigos. Se você procura um mocinho cheio de virtudes ou que tenha um mínimo de inteligência emocional para resolver as coisas, A Extorsão não é para você. 

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A sorte de Zaidelis é ter a sua disposição alguém do tamanho de Guillermo Francella, um dos melhores atores argentinos da atualidade, que funciona no que quer que seja escalado para fazer. Dominando a comédia e o drama igualmente, Francella consegue empregar um ar trágico ao seu anti-herói, e parte dele a credibilidade que A Extorsão precisava para ser bem sucedido junto ao espectador. Sem apoiar em uma personagem artificializada que usa de vez em quando para fins específicos, vemos aqui menos o ator de Granizo e mais o de O Segredo de seus Olhos, cujo desespero consegue nos contagiar. Sua parceria aqui com Guillermo Arengo possibilita uma relação tão ambígua como a deles, ser constantemente reforçada de novos entrechos. 

Graças aos predicados de Francella e do resto da equipe de intérpretes, A Extorsão se torna um suspense interessante de acompanhar, ainda que seus caminhos sejam cheios de buracos. Não será uma jornada fácil se formos nos debruçar em provocações com seu enredo improvável, cheio de elipses temporais convenientes e um grupo de vilões tão ingênuos quanto os heróis. O certo, ao invés de cobrar, é aproveitar o tanto de tempo que o protagonista passa correndo de um lado pro outro, pedindo ajuda aos quatro cantos, sempre com uma legião de pessoas em seu encalço. Essa é a função desse título que acaba de entrar na HBO Max: entreter, sem nos dar ao trabalho de tentar tirar esse roteiro do emaranhado de ideias. 

Um grande momento
Alejandro corre pelo lado de fora do aeroporto

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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