- Gênero: Comédia Romântica
- Direção: Pedro Antônio
- Roteiro: Pedro Antônio, Alvaro Campos, Luanna Guimarães, Fábio Porchat
- Elenco: Fábio Porchat, Sandy, Evelyn Castro, Larissa Luz, Fernanda Paes Leme
- Duração: 101 minutos
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Existe uma lenda, herdada dos preconceitos injustos nascidos pela ascensão da pornochanchada (aquele que legou a infame piada de que “filme brasileiro só tem sexo”), de que um dos principais problemas de nossa cinematografia seriam os roteiros. Bom, essa é a opinião provável de quem assiste ao mesmo balaio de filmes, sem diversificar o olhar. Ao assumir isso como máxima, o espectador não parte para uma busca mais profunda acerca das qualidades do nosso cinema, que existem inclusive dentro dos nichos. A essa altura, todos os leitores do meu apreço pelo nosso cinema, mas eu não douro pílulas; as coisas só são quando são. Vejam Evidências do Amor, por exemplo, um filme que nasce com a obrigatoriedade de levar público ao cinema, em quantidade visível, e talvez por isso – e pelo que seus códigos criaram em torno de si – pague o preço de ser subestimado. Incluindo as ‘evidentes’ qualidades de seu roteiro.
Na década passada, o mesmo Fábio Porchat que estrela aqui, nos presenteou com o belo (e bem mais denso do que imaginávamos) Entre Abelhas, uma comédia romântica existencialista. Podemos dizer que Evidências do Amor é um filho tardio do filme de Ian SBF, e ambos contam com a assinatura de Porchat também no grupo de roteiristas. Isso cria uma linha de raciocínio que conecta as duas obras, mesmo reconhecendo aqui que o caráter popular é mais realçado. E isso não deveria ser visto como um defeito inicial, porém é a imagem que as pessoas têm – de Fábio e da comédia brasileira. Não analisam a existência de um abismo, principalmente estético, que o difere de Os Farofeiros ou Um Dia 5 Estrelas, e cada um desses três filmes representa uma fatia do fazer cômico no Brasil. O lugar que esse aqui ocupa, sem qualquer juízo de valor, é alguns degraus acima de uns filmes, e cinco galáxias de outros.
De tons mais fortes do que costuma ser, o cineasta Pedro Antônio (que tem ao menos uma outra pérola no currículo, Altas Expectativas) mergulha na voz da ficção científica, e de maneira humilde, pede licença a uma geração que cresceu à base de Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças. Distante do que Michel Gondry criou em suas imagens esmaecidas, mas próximo do teor melancólico de quem perdeu uma parte de si e não recorda porque, Evidências do Amor é uma porta de entrada para a discussão de um machismo tão enraizado que impede alguém de perceber os próprios erros. Bloqueando tudo que foi triste e pouco construtivo, o personagem de Porchat é atormentado pela música-título, ela mesma, o nosso hino extraoficial. Através dela, ele enfim acessa tudo o que deu errado, mas não consegue ler que sempre esteve em si as respostas que ele cansou de buscar.
Acima de todas essas questões, Evidências do Amor é um filme muito sedutor, e isso não é uma porção da comédia romântica em si, mas uma apreciação do material como um todo. A fotografia de Pedro Faerstein e a utilização singela dos efeitos especiais (que é bem simples mesmo, um detalhe) criam uma atmosfera que ao mesmo tempo é aconchegante para o espectador, estando em uníssono com os questionamentos provocados sobre nossa própria colocação diante das relações, como estabelecemos nosso eu interior diante do outro. O que sentimos não é verdadeiro, e sim como o outro reconhece o sentimento? Nós nos conhecemos de verdade, ou somos apenas um reflexo autômato da sociedade geral? Não creio que o grupo de roteiristas estivesse tentando chegar tão ao fundo, mas também não creio que tenha aqui uma produção tão desinteressada assim, servindo como um passatempo vazio.
Nesse sentido, é a interpretação de Porchat que nos puxa sutilmente para as reverberações emocionais da produção. A princípio, Marco é uma figura comum após um ano de término; sua desconexão está nas entrelinhas. Ele não é a padronagem clichê de um sujeito em depressão pelo fim de um relacionamento, mas seu intérprete carrega o que vemos de intensidade e simbologia. Marco não é mais um cara qualquer, assim como Porchat tem suas marcas de interpretação; um complementa o outro. Temos então uma zona conhecida a percorrer por percepções, mas também temos um espaço para descobrir esse ator cheio de recursos que age como se não tivesse. A cena do reencontro com o pai, e tudo que acontece após esse encontro enchem de peso e estrutura emocional uma interpretação mais complexa que a de Entre Abelhas, porque esse cara de Evidências de Amor é muito mais próximo ao Porchat.
É legal acompanhar a tentativa de desconstrução da imagem que temos de Sandy, e é ainda mais legal acompanhar o ano magnífico que Evelyn Castro está tendo, com a previsão de ter cinco estreias cinematográficas esse ano – e aqui ela já está formidável. É interessante, acima de tudo, observar que sim, existe uma moldura plasticamente atraente sendo oferecida, mas que nada disso arranha a tentativa de colocar aqueles personagens e suas curvas românticas em paralelo com o real. É uma forma quase ideal de montar um “produto”, para apreciação coletiva, sem negar a sua fórmula um grau de exigência para cada quesito monitorado. Com um desfecho quase perfeito em sua aparente suspensão, Evidências do Amor deveria estar em uma nova categoria: a daqueles títulos obrigatórios para o nosso cinema continuar oxigenando, atento aos detalhes e com a sensibilidade em dia.
Um grande momento
O encontro com o pai