- Gênero: Aventura, Ficção Cientifica
- Direção: George Miller
- Roteiro: George Miller, Nick Lathouris
- Elenco: Anya Taylor-Joy, Chris Hemsworth, Tom Burke, Alyla Browne, Lachy Hulme, John Howard, Elsa Pataky
- Duração: 144 minutos
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O verde vivo presente na floresta do prólogo de Furiosa: Uma Saga Mad Max parece a única conexão com uma Mãe generosa que o filme mostrará: a natureza, que fornece seus nutrientes sem que seja obrigada a tal e que abriga uma população prestes a ser extirpada de seu habitat. Em análise metalinguística, o novo filme de George Miller é também ele um prólogo em si, que ressalta essencialmente o jogo que será estabelecido em breve, através de Mad Max: Estrada da Fúria. Aqui temos a ponte entre o conto de formação e o estudo de personagem, ambos se conectando no ideário de louvação a um espécie de futurismo que nos retomará ao início dos tempos em reflexão: a Mulher é a mantenedora absoluta do sustentáculo da narrativa humana.
Ainda afastada do que representará em pouco tempo a Imperatriz Furiosa, essa infância e fim de juventude que está nas mãos de Anya Taylor-Joy será o suficiente para assistir o nascer de uma figura que se desenha como mítica desde o surgimento. Miller tem a exata noção a quais parâmetros sua cinessérie pertence hoje, e dobra a continuidade do que tem a mostrar. Como sua filmografia diz, o diretor de coisas tão díspares quanto Happy Feet e As Bruxas de Eastwick é um artista de composição imagética, cuja teatralização do plano serve para contar uma história que muitas vezes prescinde das palavras. Mais uma vez, a acrobacia do qual o diretor é amantíssimo é por si só definidor de uma fatia crucial do que está contando, quando substitui a palavra falada pela composição da imagem.
Seria fácil declarar simplesmente que Miller é um artesão em busca da sequência perfeita, e que seu material estético é apinhado de adjetivos, quando o cineasta está sim contando uma história que pode ser resumida ao conjunto de planos. Mas em Furiosa: Uma Saga Mad Max, Miller parece dialogar com sua própria História, o que cabe ser feito quando estamos prestes a completar 80 anos. Isso ou uma tal historicidade que o cineasta confeccionou durante 45 anos ao longo do que agora podemos chamar oficialmente de saga. Diante do que ficou estabelecido no extremamente bem sucedido capítulo anterior, aqui o autor parece reverenciar com mais pulsação o universo que criou, através de uma série de caminhos que nos levam ao filme de 2005.
A revolução que Estrada da Fúria proporcionou esteticamente é continuada aqui, mas talvez o passar dos anos sejam necessários para que a absorção seja completa. Porque existia no episódio anterior um afastamento de três décadas com o último capítulo, isso também se traduziu na possibilidade do arrojo que vemos. Furiosa: Uma Saga Mad Max é um capítulo novo que também é anterior, porque se passa nesse tempo atrasado em relação ao que vimos anteriormente. Assim sendo, existe essa redundância histórico-temporal de apresentar novos caminhos que desembocam em algo que já vimos. É uma experiência não-inédita, mas que faz sentido quando Miller apresenta um campo de ideias que parece inesgotável em relação ao que apresenta e lhe cabe como maestro de tais imagens.
Existe um momento em particular envolvendo Taylor-Joy, Tom Burke e um novo caminhão sendo testado para a ação que é vertiginosa como o diretor nos acostumou, e que também faz parte de um olhar criativo para a formação de sua protagonista. Essa é uma sequência onde a personagem-título aparece pela primeira vez no comando de ações do qual ela será, no futuro, senhora; ou melhor, imperadora. Sem discurso, o que vemos é uma aproximação do material a uma contextualização feminista que não é obrigatória ou compulsória, porque simplesmente é. Tudo culmina na cena final entre essa protagonista e o Dementus, seu nemesis, carregada de um simbolismo tão intenso e natural, porque tudo só poderia terminar ali, daquele jeito, com aqueles dois. Furiosa: Uma Saga Mad Max não é exclusivo da ordem da narrativa, mas igualmente passa longe de estar restrito à estética.
Com todo o respeito ao que é feito por Christopher Nolan e Denis Villeneuve hoje, Miller está ancorado em uma espécie de metralhadora que gira independente do projeto, sempre com a mira apontada para seu alvo menos óbvio. A sanha de buscar em Furiosa: Uma Saga Mad Max uma espécie de solenidade de agradecimento transformada em filme não o encerra, porque suas obras nunca são avaliadas em um único motor. É dessa forma que os profissionais que já estavam reunidos para Estrada da Fúria retornam para novo portfólio de suas capacidades. A montagem de Margaret Sixel (dessa vez, ao lado de Eliot Knapman) continua tão alucinante, e dessa vez costura uma apresentação fluida para o desabrochar dessa turbina flamejante chamada Furiosa.
A criação da gênese dessa força da natureza, nascida do verde inicial, está em cada polo que ocupa com seu corpo, em cada tiro disparado em sua direção (e por ela), conhecemos mais do que Miller quer filmar. O diretor parece sempre deixar uma pista sobre Furiosa, que sua atriz completa com destreza. A interpretação de Chris Hemsworth ultrapassa adjetivos, é uma prova de suas capacidades escondidas por mais de uma década pela Marvel. Estão seus protagonistas à mercê do projeto com suas vísceras – e provando que não precisa de litros de sangue para ser fatal, urgente e perigoso – e é nessa toada que Furiosa: Uma Saga Mad Max encontra espaço para liberar suas flechas.
Um grande momento
A emboscada e os tiros