- Gênero: Drama
- Direção: Lillah Halla
- Roteiro: Lillah Halla, María Elena Morán
- Elenco: Ayomi Domenica, Loro Bardot, Grace Passô, Rômulo Braga, Gláucia Vandeveld, Larissa Siqueira
- Duração: 96 minutos
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Existe uma energia em Levante que contagia quem assiste, e transforma a experiência durante aquele tempo com aquelas pessoas, em algo mágico. Esse é o aspecto que nos carrega pra dentro do filme, a forma como tais corpos em cena carregam um brilho próprio e uma efervescência muito particular. Juntes, tais figuras resplandecem a cada novo encontro. É um brilho no olho, uma fagulha de sintonia coletiva, é difícil acompanhar tais passagens e não se render ao que é feito em cena. Se elus jogam, queremos jogar; se elus, dançam, queremos dançar; se elus beijam… bom, essa é uma das muitas características positivas que explodem da tela. Não se trata de uma energia explícita, mas de um molho que é adicionado aos ingredientes centrais, e alimentam uma fogueira ininterruptamente.
Lillah Halla é uma cineasta que compreende essa textura do calor humano. Levante é uma produção do qual emana uma labareda interna e que não está exclusivamente no trabalho físico-corporal dos atores, nem nas cores (quentes) que fazem parte de sua paleta. Essa paixão – acho que posso chamar assim – está na urgência com o qual seu roteiro clama por leitura. Não é apenas um olhar para a estética que poderia se sobressair no todo, mas em como essa ebulição está em cada passada de sua protagonista, uma fonte inesgotável de sensibilidade. Quando age, ela comunica demais, mas quando apenas olha, ou pensa, seu fervor consegue nos hipnotizar ainda mais. Está, enfim, no que se vê, mas igualmente no que se sente.
Halla está com a temperatura certa para falar sobre o que fala – o direito à autonomia do corpo, em sua leitura principal, feminine. Isso passa, lógico, pela espinha dorsal do filme (uma gravidez indesejada de uma jovem atleta), mas está na atmosfera do projeto como um todo. O que é filmado é de energia ‘queer’, sem dúvida, mas sobretudo é sobre esse direito do humano em poder controlar o que só diz respeito a si. Sobre como a voz contrária não deveria determinar gerência a nós, e sobre como uma espécie de insurreição ‘colorida’ está em curso para bater de frente com a escuridão. Quando uso a expressão acima, não estou circundando da sigla LGBTQIAPN+ sobre a primazia de decidir o que for a respeito do corpo; todo ser pensante deve raciocinar a respeito do que deve ser feito em nosso nome.
Esse nervosismo do qual Levante celebra, está determinado pela luz de Wilssa Esser (de Temporada) e pela montagem de Eva Randolph (de Amor, Plástico e Barulho). Com um trabalho ancorado em uma luz vertical que mostra cada detalhe do que está à luz do dia, suas camadas imagéticas engrossam quando a noite cai, e o filme precisa descobrir o que está nas entrelinhas – da cor, do brilho, do desejo. É a partir desse contraste, que observa um filme com energia dupla, uma que revela o íntimo e outra que devassa o público, que a intenção de Halla se debruça por essas duas vertentes, do qual habitamos em sociedade. A rapidez com que a edição absorve e regurgita os eventos, transforma a sessão em um caleidoscópio de intenções, que são utilizadas para o melhor possível – ou seja, esse efeito de constante retroalimentação, com um elemento devorando o outro e renovando o olhar.
Com essa exuberância em ondas de calor (humano), parece ligeiramente avulso que Levante se atenha menos do que poderia ao personagem de Rômulo Braga, e ao seu labor. Porque o roteiro do filme é absolutamente redondo na forma como trata sua protagonista Sofia e o mundo ao redor dela, que funciona na profusão de sua energia. Quando o filme se desloca, ainda que de maneira breve, para a labuta de seu pai, e isso é um detalhe que não é esmiuçado mas também não sai de cena, soa gratuito que uma camada maior não seja dada a isso, para que sua função dramática vá além da imagem. Isso é muito bem desenvolvido na personagem de Grace Passô, que é a treinadora do time de vôlei, apenas – e esse “apenas” merece aspas, inclusive, porque ser treinadora de um time onde a protagonista está, não é necessariamente apenas. No caso do pai de Sofia, sua função parece um pouco descalibrada.
Um filme com tanta efusividade e coração como esse precisaria de um elenco exatamente como o que Halla conta à sua disposição, e que completa o jogo, literalmente. Se Braga e Passô dispensam apresentações e elogios, estando ambos entre os melhores de sua geração, todo o grupo de menines em cena é de uma entrega sem par, e de um afeto muito claro. No centro da narrativa, Ayomi Domenica carrega em cada parte do corpo e rosto um desejo de poder utilizar seu livre arbítrio, e também de poder gritar a plenos pulmões sobre o que não precisaria enfrentar. Esse brilho coletivo de Levante, que nos coloca no olho do furacão junto com cada integrante, é o que se transforma em chama viva e explícita. Não é todo dia que somos arremessados em um transe absoluto entre uma realização, o que pretende dizer, como diz e quem diz por ela. Nos resta pedir licença e adentrar esse mesmo transe junto.
Um grande momento
A explosão de Sofia na quadra