- Gênero: Documentário
- Direção: Pedro Giongo
- Roteiro: Pedro Giongo
- Duração: 70 minutos
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Esse é o tipo de filme que sabemos que iremos encontrar ao viajar todo janeiro para Tiradentes. E apesar de ter declarado algo parecido com isso na minha análise de O Tubérculo, aqui esse filme não parece interessado em emular o que se viu na Mostra Aurora nos últimos muitos/todos os anos. Lista de Desejos para Superagüi, grande vencedor do evento deste ano, parece mais interessado simplesmente em sê-lo, sem as cobranças e pretensões que recaem sobre grande parte do que é exibido pela Mostra, tendo correspondência positiva (e geralmente muito tem) ou não. É dessa liberdade de colocação no mercado que é construído nosso genuíno impacto pelo que o filme desbrava.
Superagüi é uma pequena ilha que vive da pesca, e também é um daqueles espaços onde o tempo parece ter estacionado – ou que exatamente por lá, as coisas se situam sob prismas diferentes da vida de uma grande cidade. Essa metodologia é necessária não para adentrar o universo retratado, mas porque precisamos compreender o que será oferecido ao espectador de cinema. Estamos falando da essência do ‘slow cinema’, aquele mais arraigado à concepção do termo, mas que não está exatamente abdicando da experiência criada em conjunto com quem se dedica a ele. O fluxo do qual embarcamos aqui é parte integrante do que aquele recorte social ambiciona em seu tratamento natural.
Está em cada corpo exibido, e no movimento exponencial do que é evidenciado ali. Na cadência por vezes fantasmagórica do que é combinado com o tempo, e que constrói uma atmosfera muito particular, que não está sendo compartilhada por outros registros sociais. Não demora para que percebamos que o ritmo de Lista de Desejos para Superagüi é devido ao que está na mola da existência daquela sociedade por si só, e que não é o público que precisa se adequar ao cinema produzido aqui, mas aos desígnios próprios aquele grupo de pessoas, em suas divisões certeiras relacionadas ao que é seu habitat. Nesse sentido, vai além da honestidade a maneira como tudo é apresentado em cena; é o único modo possível de apresentação para esse espaço-tempo.
Pedro Giongo estreia na direção de longas depois de montar algumas das obras que mais impressionaram no cinema ultimamente, como Seguindo Todos os Protocolos, Chão de Rua e Casa Izabel. Seu trabalho aqui (que também inclui a montagem) é minucioso ao não tentar deturpar a ideia que se tem em relação àquelas pessoas da qual ele até invade. Consciente do impacto que está exercendo sobre seus personagens, a sensibilidade de manter Lista de Desejos para Superagüi da maneira que é, é a de suprir a integridade não apenas dos seres, mas essencialmente do que foi construído ali pela própria História. É um recorte de intenção e apropriação com modificação reversa, onde o que é produzido adquire o significado do que se vê, e assim adquire personalidade.
É também uma obra que, a despeito de seu personagem central ser um idoso com problemas de saúde com dificuldades causadas pela idade, esbanja pulsão de vida. Com essa textura, Lista de Desejos para Superagüi reescreve nosso olhar para a Mostra em 2024, que, possivelmente ainda observando os reflexos pós-pandêmicos, observou a morte com um desejo explícito por ela. Aqui, Giongo monta um painel que se projeta para o futuro e tenta costurar seu presente com a pretensão de andar para frente. Se existe ironia em uma possível contradição, o filme quebra nossa expectativa ao declarar que seu grupo de personagens clama por oportunidades que vão além do profissional. São uma espécie de tentativa de recomeço instantâneo causado somente por quem anseia mais, sempre.
Um grande momento
A ligação e o clamor de Martelo