Crítica | Outras metragens

Não Iremos Lá em Cima

O que vem com o não saber

(Nous n'irons plus en haut, FRA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Ficção
  • Direção: Simon Helloco
  • Roteiro: Simon Helloco, Magali Negroni
  • Elenco: Noé Vallée, Swann Vallée
  • Duração: 22 minutos

Há elementos narrativos que levam a trama para lados muito diferentes. O não mostrar é um deles. A ignorância em Não Iremos Lá Em Cima, curta de Simon Helloco, está dentro da tela e fora dela. Apenas um personagem sabe o que aconteceu, Jacob, sabe o que aconteceu. Seu irmão, Théo, foi conscientemente afastado da realidade. Ao público foi dada a possibilidade de suposição, vaga, sobre os eventos. Ele estava acompanhando a pequena criança enquanto, na bela paisagem da família, contando junto com ela enquanto algo acontecia.

Todo o filme segue numa crescente de estranhamento e tensão. O tempo passa enquanto as crianças desenvolvem brincadeiras comuns da idade, coisas de garotos que se veem de repente desacompanhados. Surge uma liberdade nem sempre consequente e perigosa, portanto, que traz o suspense. Ao mesmo tempo, o filme insiste em mostrar a dubiedade naquilo que se vê. Dos jogos inconsequêntes que prendem o fôlego de quem acompanha, seguidos de perto pela câmera de Baptiste Petit-Gats, aliás, numa fotografia inspirada, seguem muitos momentos de um alívio que ultrapassa as situações, como se aqueles planos abertos e longos mostrassem uma paz desconhecida.

Nós Não Iremos Lá Em Cima
Mood Films

Porém, ainda há culpa e medo, em especial em Jacob, vivido por um impressionantemente maduro Noé Vallée, eficiente na transição dos sentimentos, nos momentos de introspecção e explosão. Seu mantra “Nós não iremos lá em cima”, que dá nome ao filme, e suas ações são marcas importantes na tensão do filme a partir de certo ponto. Embora saibamos o que se deu, sem ter a certeza de tudo, sabemos do que ele fez e o quanto isso vai degenerando sua personalidade.

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A partir daí, Não Irmos Lá Em Cima chega a um ponto que não tem mais para onde seguir e sabe disso. Sua revelação não chega a surpreender, dado que as opções eram restritas, mas não é óbvia também. E o resultado de tudo é tocante, não só pela ligação que se estabeleceu com as duas crianças até ali, mas pelo que há de identificável em tudo que se vê. A história de Jacob e Théo os leva até o extremo, mas milhares de outras crianças são submetidas ao mesmo que eles diariamente, por toda a vida. É triste e perturbador.

Um grande momento
Correndo no milharal

[13º MyFrenchFilmFestival]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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