Crítica | Streaming e VoDDestaque

O Jogo do Disfarce

Requentado e morno

(Role Play , EUA, 2024)
Nota  
  • Gênero: Aventura
  • Direção: Thomas Vincent
  • Roteiro: Seth Owen
  • Elenco: Kaley Cuoco, David Oyelowo, Bill Nighy, Connie Nielsen, Rudi Dharmalingam, Lucia Aliu, Regan Bryan-Gudgeon, Jade-Eleena Dregorius
  • Duração: 96 minutos

Cada vez mais fica claro como existe uma “coincidência” cada vez maior (e dependendo da situação, altamente incômoda) que une os lançamentos comerciais de produções, indo além das lógicas locais. O que justificaria as estreias no mesmo dia que Beekeeper nos cinemas, Lift na Netflix e esse O Jogo do Disfarce na Prime Video, que se comunicam demais? Três filmes de ação com um toque de humor, calcados em lógicas que definiram o gênero há décadas atrás e que não passam de diversões ligeiras com pouco a acrescentar quando o tempo os apagar da nossa memória – o que será logo. São acasos em que eu acredito cada vez menos, e servem para mostrar como cada vez mais somos tratados como ratos de laboratório, sem capacidade de escolha ou discernimento. 

O francês Thomas Vincent é o diretor desse produto que, assim como os dois já citados, parece ter nascido para fazer tabela e cumprir o papel de programação banal do streaming. Se o filme protagonizado por Jason Statham é o melhor dessa tríade, esse aqui me parece o mais cansativo e com menos algo a oferecer que não o prato requentado de sempre. O que está em cena já foi visto, não tenta criar qualquer profundidade e suas soluções sempre acabam levando ao próximo clichê empilhado. Há uma economia muito evidente em tudo que é mostrado ou desenvolvido, a ponto de nem uma montagem tosca de um ponto turístico alemão ser feito para situar os personagens em Berlim, acontece. Apenas a informação é dada, e o espectador que acredite que aquelas ruas quaisquer são de uma cidade europeia. Ok. 

Independente de serem profissionais qualificados ou não, tanto Vincent quanto o roteirista Seth Owen parecem contratados para servir a um propósito muito direto, que é o de entregar um material para consumo indiscriminado para uma plataforma de streaming. Audiência rápida e viralizada, O Jogo do Disfarce não necessariamente cumpre o papel. Porque tudo é tão automático e sem expressão maior, que o espectador se sente fazendo parte dessa régua de pesquisa, onde apenas precisa avaliar um produto genérico, e até que se prove o contrário, passar para o próximo em seguida. Tudo que é encenado estabelece um padrão de visualização que apenas permite que mais outros exemplares oriundos da mesma ideia nasçam, e morram muito rapidamente. 

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O casal de protagonistas de O Jogo do Disfarce, se tem mais química que o de Lift, ainda assim não é o suficiente para que se compreenda o tanto de empenho que existe para que não se perca o que se tem. Ao menos, mais uma vez, tratam-se de atores com talento o suficiente para manter nosso interesse vivo. Kaley Cuoco (de Big Bang Theory) e David Oyelowo (de Selma) estão fora da zona de conforto, ela como uma profissional da ação, e ele num raro papel leve, e se o desconforto nos alimenta a continuar assistindo-os, também dá aos atores uma oportunidade de elevar seus domínios. Apesar disso, a cena é literalmente roubada por um ladrão tradicional, Bill Nighy. Recém indicado ao Oscar por Living, Nighy tem uma presença curta com muito mais ambição do que todo o resto do filme. É um grande intérprete que faz toda a diferença. 

É graças a Nighy que essa estreia tão morna pode marcar o espectador. A trama sobre o passado de Cuoco é tão desinteressante, e a personagem misteriosa é tão facilmente identificável na primeira cena que aparece, que o filme não sai do lugar mesmo que ande muito. Se tem algo na narrativa de O Jogo do Disfarce com um fiapo de ousadia é o fato de que o filme não tenta disfarçar o que sua protagonista é; com contras e contras (sim, só tem contras), ela é o que é e não há perdão. Ou melhor, há, porque o amor mexe com a minha cabeça e me deixa assim… quando até mesmo em novelas atuais vemos vilões se redimindo através do sofrimento, é fora do comum que a protagonista aqui apenas siga em frente rumo a uma nova vida. Tinha potencial para explorar isso, mas o filme não quer. 

Ação burocrática, um plot inicial interessante que não chega a lugar nenhum, e um grupo de atores que tenta fazer o possível para trazer inquietação a um produto com sabor de mofo, O Jogo do Disfarce é mais um filme para o grupo que mostra que o cinema comercial para streaming poderia ter mais Clonaram Tyrone!, mas que preferiu concentrar suas forças em realizar mais e mais Alerta Vermelho.

Um grande momento

Bob

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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