- Gênero: Terror
- Direção: David Casademunt
- Roteiro: David Casademunt, Martí Lucas, Fran Menchón
- Elenco: Inma Cuesta, Roberto Álamo, Alejandra Howard, Asier Flores
- Duração: 92 minutos
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Isolar-se. A abertura de O Páramo destaca a palavra dentro de uma frase de Federico Garcia Lorca, e fica claro sobre como atual é o conto que estreia hoje na Netflix, mas também como a dubiedade joga com a expressão o tempo todo, dentro da narrativa e na nossa realidade atual. Afinal, uma boa história sobrenatural reflete sobre o tempo presente sem deixar de organizar os seus próprios parâmetros, em contexto adequado e refletindo sobre suas camadas de maneira amplificada. Dentro da obra e dos seus signos particulares tem camadas, assim como na observação sobre o contemporâneo também estão servidas análises aprofundadas sobre o estado das coisas, além das observações universais, prementes a qualquer tempo.
O longa de estreia de David Casademunt é, também, uma produção ao mesmo tempo enxuta e requintada, com um trabalho fotográfico formidável, que realça o que o gênero pode oferecer de melhor ao isolar seu exíguo elenco (apenas três personagens) em um espaço igualmente diminuto – uma casa no meio do absoluto nada. O trabalho de Isaac Vila é essencial para conseguir essa dualidade de esforços, e sua conexão com o diretor funciona porque ambos se potencializam. Oferecer ao espectador uma experiência que aluda ao microscópico de relações mesmo refém de um horizonte alinhado à vastidão. É a tradição de filmar o que há de mais sensorial e abrangente, mas reconfigurando seus elementos até que a eles sejam adquiridos uma realidade oposta, reduzida.
A iluminação dos espaços se dá de maneira igualmente impressionante, porque é essa chave que corrobora com o mistério do filme, da sua identidade visual fantasmagórica. Quando mãe e filho se encontram enfim sozinhos e todas as soluções visuais passam a depender do que o espectador imagina ser visto, são as sombras, as sugestões e os vultos que decidem o tamanho de nossa conexão com o roteiro de O Páramo, que se expande de um universo concreto da guerra para um cada vez mais abstrato, envolvendo traumas recentes e antigos, tendo a infância como porta de entrada. São de dois polos infantis que nascem as ligações com o mundo da fantasia, que reflete o medo e a aceitação para com a nossa realidade, esteja ela em qual grau de dificuldade estiver.
Ao mesmo tempo em que o isolamento é uma necessidade do núcleo do filme, também existe por trás de seus personagens um desejo latente de liberdade, de ampliação de suas fronteiras, que são delimitadas pelo medo. Não apenas o sentimento concreto que o filme aborda, aquele que os refugiou em sua ilha de madeira e terra, mas também aqueles possíveis temores de todo o tempo – o da responsabilidade, o da maternidade, o de crescer. Um homem quer revalidar suas obrigações a outrem; uma mulher quer destituir-se das obrigatoriedades maternas; uma criança se exime com o tempo futuro fincando os pés na infância. Esse trio será constantemente confrontado com avessos de suas verdades inconfessadas.
Não se trata de um filme absolutamente livre de ponderações contrárias, tais como as demonstrações do que tem de único. Trata-se de uma produção bastante acima da média esteticamente, mas narrativamente seu caminho já foi visto em outras paragens. Isso não delimita o envolvimento do espectador, mas ao mesmo tempo tira do filme seu caráter desbravador, já que estamos falando de um roteiro que não tenta sair de sua zona mais conhecida. O belo trio de atores (em especial Roberto Alamo, em uma performance comovente como um homem desprovido de inocência) consegue promover interesse genuíno à produção, mantendo o clima de apreensão durante toda a duração.
A estreia de Casademunt, no entanto, é um belo cartão de visitas de um estreante, servindo como aperitivo para futuras apostas. Aliás, essa é uma característica da Netflix ao redor do mundo, servir como base de reconhecimento para estreantes com inegável talento, como aqui. As imagens produzidas, cujo bom gosto estético se encontra com a possibilidade de criação da imaginação de cada um, são uma prova de que O Páramo consegue surtir efeito dentro do que era sua esfera, o cinema de proposta ilusória, com base no artificial. Nesse sentido, o gol foi marcado com alguma facilidade.
Um grande momento
Salvador conta de sua irmã