Crítica | Cinema

Campeões

Me derrubam, e eu levanto de novo

(Champions, EUA, 2023)
Nota  
  • Gênero: Comédia
  • Direção: Bobby Farrelly
  • Roteiro: Mark Rizzo
  • Elenco: Woody Harrelson, Kaitlin Olson, Matt Cook, Cheech Marin, Madison Tevlin, Kevin Iannucci, Joshua Felder, James Day Keith, Ashton Gunning, Matthew Von Der Ahe, Tom Sinclair, Alex Hintz, Casey Metcalfe, Bradley Edens, Ernie Hudson
  • Duração: 120 minutos

Os irmãos Peter e Bobby Farrelly se separaram, amigavelmente. Enquanto o primeiro foi ali ganhar Oscars injustos com Green Book, o segundo demora a mostrar que não mudou com Campeões, estreia de hoje nos cinemas. Mas apesar do início forçado, das intenções artificiais que o filme parece abrir, a coerência com sua obra ao lado do irmão se mostra cada vez mais honesta. Se não há o frescor de outrora, ao menos não falta o olhar para as minorias, que sempre veio impregnado de escárnio e falta de correção política. O tempo passou e o cineasta ao menos agora demonstra carinho por seus personagens de cabo a rabo, e não apenas na moral da história. A cada revisão dos seres humanos em cena, ele demonstra seu afeto de maneira crescente. 

Por se tratar de um remake, Campeões tem metas a cumprir. O original, Campeones, fez um tremendo sucesso na Espanha e tratava exatamente da mesma premissa: um técnico de basquete caído em desgraça precisa aceitar treinar um time de atletas especiais de maneira a pagar suas penas. Com essa simples frase, sabemos exatamente do começo, meio e fim da produção inteira: a princípio arrogante, o técnico irá encontrar finalmente sua humanidade, sofrerá uma tentação ao ser convidado para largar seus alunos e obviamente descobrirá o amor também. É tudo tão providencial nesta última questão que não seria estranho ter sido pensando por Farrelly, mas o filme consegue criar um gancho interessante para o casal apaixonado que não quer dar o braço a torcer. 

Campeões
Universal Pictures

Campeões abre com uma cena de pós-sexo entre Marcus e Alex, ele sendo bastante “homem” com ela, despachando de casa e recebendo o troco de uma mulher claramente empoderada. O que o filme coloca na roda entre esses personagens que se reencontram talvez até sejam elementos demais para o filme: o sexo sem compromisso naturalizado, a postura feminina em relação a esse mesmo descompromisso, a sinceridade na hora de estabelecer relações que não excluem o afeto. Discussões muito verdadeiras para os dias de hoje, não estamos acostumados a observar nenhuma dessas questões sendo mostradas com naturalismo. O filme é adulto o suficiente para colocar o casal protagonista nessa situação, onde as coisas não precisam ser nomeadas para ter qualidade. 

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O que incomoda em Campeões é o seu ponto de partida estético, onde tudo parece meio grotesco e resumido, os diálogos são todos expositivos e escancaram situações todas já esclarecidas. Esse é o primeiro roteiro de Mark Rizzo, que não trabalha com sutileza, tudo que está em cena é esgarçado até ficar disforme de tão óbvio. Com isso, a produção perde tempo explanando o que não precisa, quando poderia ser mais explícito na relação de Marcus com o esporte, com o que lhe é fascinante e que representa o cerne narrativo. Se a produção entra nos eixos conforme avança, o mesmo não podemos dizer da maneira com que o esporte é tratado no filme, mesmo sendo coluna vertebral do projeto. 

Campeões
Universal Pictures

O trabalho de Woody Harrelson é funcional para deixar a produção simpática e algumas piadas feitas a seu respeito, de sua aparência e seus modos, são realmente muito boas. Mas é o elenco de atores PCDs que delimitam o charme de Campeões, como um todo e em particular. Kevin Iannucci, Madison Tevlin e James Day Keith são especiais, e isso não atende apenas às suas deficiências, mas sim às capacidades que têm de mergulhar na narrativa e sair delas donos de cada fala, de cada gesto. Os dois primeiros dominam a imagem e o filme não consegue avançar sem que procuremos eles na tela a todo momento, e não poderia ter nada mais gratificante de assistir do que suas performances, que infectam o filme de inocência e picardia, ao mesmo tempo. 

Longe dos tempos de Eu, Eu Mesmo e Irene e O Amor é Cego, Bobby Farrelly consegue ser terno pela primeira vez sem parecer responder a uma demanda politicamente correta. Suas intenções positivas em Campeões estão mais claras e tem textura verdadeira, ainda que o filme não se realize como um todo. É uma saída para alguém que parecia ter ficado à sombra do irmão e que agora recupera alguma verve, ao longo da duração. Ao final da sessão, a sensação é de ter assistido a uma brincadeira inofensiva, mas cujo afeto nunca deixa de dar as caras. 

Um grande momento

‘I Get Knocked Down’ (as duas vezes)

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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