Críticas

Corpus Christi

(Boze Cialo, POL, 2019)
Drama
Direção: Jan Komasa
Elenco: Bartosz Bielenia, Aleksandra Konieczna, Eliza Rycembel, Tomasz Zietek, Barbara Kurzaj, Leszek Lichota, Zdzislaw Wardejn, Lukasz Simlat, Anna Biernacik
Roteiro: Mateusz Pacewicz
Duração: 115 min.
Nota: 6 ★★★★★★☆☆☆☆

Ex-presidiários, quando libertos têm, além do preconceito da sociedade que os espera, uma lista de coisas que não podem fazer, mesmo queiram. Daniel era um cara problemático que descobriu sua vocação durante o encarceramento, mas, por ser ex-detento, não seria aceito em um seminário e jamais poderia tornar-se padre. Assim começa Corpus Christi, longa polonês baseado em fatos reais, dirigido por Jan Komasa, e indicado a Melhor Filme Internacional no Oscar 2020.

Trabalhando com essa contraposição de fé, vocação e igreja católica enquanto instituição, o roteiro vai enveredando por um caminho interessante. Quando, depois de uma mentira, acaba virando o padre responsável pela paróquia de uma pequena cidade, Daniel descobre contradições e se sente confortável no papel daquele que tenta confortar e mediar os conflitos do local.

Embora fortemente envolto no universo católico, Corpus Christi vai buscar o que há de humano por trás da igreja. Não só traz um personagem que, contrariando tudo o que prega a dogmática, consegue encher sua paróquia com sermões acalentadores, como escancara a força devastadora da palavra institucional quando da eliminação de um cidadão ou outro por qualquer motivo que seja. Nesse embate do sagrado e do humano, na sacralização de certas palavras e atitudes pelos homens de fé, nascem preconceitos, agressões e exclusões.

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O roteiro sabe mesclar essas questões a outras várias da cidade e do protagonista, embora haja uma certa previsibilidade e o apelo a certos signos batidos, numa estrutura narrativa que pouco tem de original. Komasa trabalha bem o ritmo, também apostando na alternância e criando sensações contraditórias, que atiçam a curiosidade de quem assiste ao filme.

Por falar em alternância, é isso que melhor define o personagem de Daniel, que transita entre vários extremos: da raiva à compaixão, da decepção à plenitude, da chapação à consciência, do estouro à tranquilidade. Muito desse transitar só se torna concreto no filme pela atuação de Bartosz Bielenia e ela é fundamental para que a história se realize fora da tela.

Apesar de ter muita coisa no lugar certo, Corpus Christi não consegue se entender muito bem com seu final. Ao mudar completamente o estilo que vinha adotando até então, causa uma ruptura que afasta da opção primeira pela narrativa tradicional e pontuada. Só que já teve filme demais até aí para isso.

Ainda assim, não deixa de ser um filme interessante, que traz a igreja católica para o centro das atenções como um lugar que apesar de estar em todos os presídios, não acolhe realmente, e apesar de pregar o perdão como mandamento máximo, não perdoa.

Um Grande Momento:
Padre Tomasz chega na cidade.

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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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