Crítica | Streaming e VoD

Sangue Frio

Imagem não é nada

(Cold Meat , CAN, RUN, 2023)
Nota  
  • Gênero: Suspense
  • Direção: Sébastien Drouin
  • Roteiro: Sébastien Drouin, James Kermack, Andrew Desmond
  • Elenco: Allen Leech, Nina Bergman, Yan Tual, William Kuklis, Sydney Hendricks
  • Duração: 86 minutos

Se teve um bom momento para a estreia de Sangue Frio na Netflix, esse é agora mesmo. Com as baixas temperaturas registradas em boa parte do país, parece surgir na hora exata para que o espectador entre no clima desse suspense que teve boa aceitação no campo do streaming, com audiência acima da média. E não é todo dia que a Netflix, conhecida por um certo desrespeito na relação com o espectador com as obras, concede a delicadeza de não se impôr ao que o filme é, simplesmente. Com isso, ganha o cinéfilo que consegue um envolvimento bastante natural com a obra, cuja simplicidade vai dando lugar a uma fábula de horror moral, como é explicada na abertura e que só encontrará sentido conforme a trama avança. 

Essa é a estreia na direção de longas de Sébastien Drouin, que assina também o roteiro ao lado de James Kermack e Andrew Desmond. Não existe muito apreço pela sofisticação aqui, e nem era essa a proposta; tirando uma extravagância do roteiro que acontece em meia hora, o filme é uma produção honesta e direta. O resultado é um filme curto que funciona do início ao fim, caso não exista uma cobrança demasiada do que está sendo visto. Sangue Frio funciona na base das ameaças do que pretende fazer, como se fossem descargas de adrenalina que o filme recebe de vez em quando e o coloca de volta no trilho. São lampejos de vivacidade, que relembram à produção que ele precisa de mais um pouco para ficar na memória. 

Apesar de ser uma produção masculina em roteiro e direção, Sangue Frio quer tanto essa aprovação em sua mensagem com algum feminismo, que em determinado momento o filme adquire um discurso bem explícito que torna tudo falso. Embora caiba diante das circunstâncias, as falas contra o feminicídio da protagonista soam discursivas demais para o momento onde elas chegam. O desespero que eclode no meio do horror que está vivendo permite a Ana ter sua posição inflamada, mas o filme não comporta essa embocadura de diálogo. Não é algo que suje o material, mas se a ideia era um produto fabricado com um novo olhar para o escapismo, um que perceba que uma coisa não atrapalha a outra, o filme escorrega; precisava de uma arrumação mais naturalizada para tais elementos. 

Apoie o Cenas

O que funciona em cena é a forma com que o tal folclore é inserido de maneira sutil, sem a necessidade de exposição reiterativa. É esse discurso que abre o filme, e durante a maior parte do tempo o espectador se convence de que seu elemento fantástico está entre os homens, e não em uma condição literal. Esse é um dos trunfos de Sangue Frio, não fechar suas discussões em nenhum esquema único. Tudo que está em cena abre opções para ser mais de uma coisa, mais de uma vez algo oposto do que verdadeiramente é; é um trabalho que, mesmo sendo menor, não é desprovido de carpintaria. As relações entre quem está em cena abre precedentes para ressignificações do que vemos, e isso é uma prova do bom trabalho realizado. 

Além de tudo, é muito complexo encerrar uma produção basicamente em dois cenários, uma lanchonete na madrugada e um carro atacado por uma nevasca. Claustrofóbico como deve ser, Sangue Frio não se desenvolve com toda a potência que poderia ter sido encenada. Também seguindo modestamente o que sua proposta persegue, temos aqui uma ideia que se contenta com o pouco que consegue ser. Dentro desse esquema, sugerir que se enveredar por um trabalho gráfico mais exposto seria ir contra do que é propagado pelo próprio desenvolvimento. Ainda assim, uma das imagens finais é bem impactante, e através dessa simplicidade, acabamos por comprar um produto de apresentação bastante simpática. 

Um grande momento

O relato da primeira vez

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
Assinar
Notificar
guest

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

0 Comentários
Inline Feedbacks
Ver comentário
Botão Voltar ao topo