Crítica | Outras metragens

Summons

(Summons, EUA, 2024)
Nota  
  • Gênero: Ficção
  • Direção: Ken Cheng
  • Roteiro: Ken Cheng
  • Elenco: Alexandra Shipp, Jimmy O. Yang, Donald Faison
  • Duração: 16 minutos

Em um outro tempo, não se sabe muito bem qual, mas algo em um futuro próximo, onde as máquinas de inteligência artificial já tomam conta das residências e o patriarcado voltou com força total (vide o culto a figuras masculinas históricas penduradas pelas paredes de instituições públicas), uma intimação é o terror de solteiras e solteiros. A formação de famílias tradicionais e, consequentemente, a procriação viraram política de governo. As tais intimações que dão o título ao filme são compulsórias, todos os cidadãos estão sujeitos a elas. Precisam dirigir-se a uma repartição onde serão sorteados e dali sairá um novo casal.

Summons conta a história de Nina e Eugene. Ela ainda vive na farra, passando as noites fazendo sexo casual; e ele, extremamente dependente de seu analista, ainda tenta superar a última desilusão amorosa. Opostos em tudo, os dois se encontram na fila do lugar, onde a interação sem jeito se dá e começa a se desenvolver. Não que seja fundamental, mas é um jeito de ambos amenizarem a ansiedade que existe por motivos diferentes. A obrigação de Nina, com toda a carga de uma pressão que vai além da imposição do Estado e chega às relações familiares, e a esperança de Eugene, em uma tentativa de se autoafirmar.

Das rosas na mão às tentativas de contato com outra pessoas, a comédia dirigida por Ken Cheng deixa claras as diferenças entre seus protagonistas. Com um desenvolvimento que começa bem antes desse encontro, na solidão de uma banheira, se escondendo do casal com quem passou a noite; ou na relação com a assistente virtual, que sabe técnicas de relaxamento simulando uma enfermeira sedura, elas também estão nas roupas, nos penteados, nas posturas e no jeito de falar. Aliás, as atuações de Alexandra Shipp (Barbie) e Jimmy O. Yang (Podres de Rico) chamam a atenção e fazem a diferença na construção dessa oposição.

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Summons usa o humor para transitar entre a crítica à intervenção estatal e a padrões sociais arcaicos. Entre outros, a brincadeira alcança o funcionamento dos órgãos públicos e seu atraso frente ao avanço tecnológico já exposto; a falta de identidade da colonização escancarada em imagens e chega até mesmo à incongruência de um sistema de cuidado à saúde mental descompassado na própria sanidade, mas imerso no capitalismo. Os diálogos transitam entre considerações e julgamentos, falam do que se relaciona ao todo e daquilo que se relaciona ao indivíduo, das marcas e determinações do externo na constituição das personas.

Nina e Eugene surgem como figuras deslocadas que se encontram, com ansiedades e desejos diferentes, em um universo estranho e quase hostil. Cada um deles carrega as marcas de seu mundo e das suas vivências, trazendo isso para o rápido momento de convívio e, de certa maneira, juntos encontram um jeito de lidar com a espera. São o jeito de lidar com a espera. Eles divertem quem acompanha o relacionamento improvisado, mesmo que isso obviamente vá levar a um desfecho telegrafado há muito tempo, seguindo os ritos das mais antigas e tradicionais comédias românticas. A forma está ali, ainda que a concretização seja apenas inicial.

Com boas atuações, um bom roteiro e uma direção competente, Summons entretém, sendo efetivo na sua bem-humorada e pertinente crítica.

Um grande momento
“Os nomes são…”

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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