Crítica | Catálogo

Till: A Busca por Justiça

O horror, o horror

(Till, EUA, 2022)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Chinonye Chukwu
  • Roteiro: Chinonye Chukwu, Michael Reilly, Keith Beauchamp
  • Elenco: Danielle Deawyler, Jalyn Hall, Frankie Faison, Whoopi Goldberg, Sean Patrick Thomas, John Douglas Thompson, Haley Bennett, Sean Michael Weber, Eric Whitten
  • Duração: 125 minutos

Sentindo pela mãe

por Cecilia Barroso

Mães geralmente compartilham do mesmo sentimento de angústia quando, pela primeira vez (e não apenas nesta) seus filhos vão para longe delas. A certeza de não poder estar perto daquele ser que foi guardado e protegido até ali é perturbadora por si só. Isso sem considerar outras questões de raça, gênero ou orientação sexual, apenas pensando na relação quase instintiva de guarda que se estabelece. Voltando no tempo, imagine como se sentiu a mãe de Emmett Till, adolescente negro criado em Chicago que, nos anos 1950, foi passar férias pela primeira vez na casa dos primos no Mississipi.

Trazendo um pouco da história do país norte-americano de maneira resumida, é preciso lembrar que desde sua colonização, ele foi dividido em duas realidades: o norte, voltado para a pequena propriedade privada e uma futura industrialização, e o sul, com as grandes propriedades de terra, que usavam mão de obra escrava como força de trabalho, negros trazidos da África, assim como no Brasil. A escravidão só foi abolida depois da Guerra Civil entre a União e os Confederados, grupo separatista do sul que se recusava a aceitar o fim do escravagismo. Mesmo depois da assinatura de Lincoln e da proibição do modelo de exploração do trabalho, vários foram os instrumentos de segregação, alguns elaborados pelos próprios estados, como as muitas leis Jim Crow proibindo casamentos inter-raciais, definindo reserva de espaços em transportes, ou impondo afastamento em locais públicos, entre outros absurdos; isso sem falar em atrocidades, como a fundação da Ku Klux Klan. As coisas só começaram a mudar em meados dos anos 1950, após várias manifestações e protestos, até a promulgação da Lei de Direitos Civis, em 1964, que baniu todas as formas legais de segregação, mas, sabemos, não resolveu a questão, nem perto disso. 

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Till - A Busca por Justiça
Orion Pictures

Essa era a realidade que aquela mãe estava enfrentando ao deixar seu filho partir naquelas férias. Esse era o motivo para que sua angústia materna, aquela comum a todas, fosse amplificada e ganhasse outros contornos. Bom, infelizmente, a história de Emmett Till é real. O que aconteceu com o menino de 14 anos, espancado até a morte após uma falsa acusação, e o julgamento dos assassinos responsáveis, inocentados de seus atos cruéis ao final, tiveram uma grande repercussão na época e o assassinato acabou sendo um dos motivadores para a luta contra o racismo. 

Seja pequeno lá embaixo

Dirigido pela nigeriana-americana Chinonye Chukwu, de Clemência, Till narra todos os fatos num drama clássico com passagens rápidas pelos filmes de tribunal, e está interessado em falar sobre essa mãe, não só como peça fundamental da luta, mas como a mulher que acaba de perder seu único filho. Fundamental para isso é a atuação de Danielle Deadwyler (Vingança e Castigo) que, junto com a história contada, é o maior destaque do filme em sua compreensão da dor e contenção. A atriz encarna muito bem a transição de sua personagem pelo luto e sua transformação.

Uma transformação que na verdade vem para acentuar traços marcantes da personalidade de Mamie Tll-Mobley, presentes em seu posicionamento perante o segurança da loja, quando ainda a estamos conhecendo, e que vão se tornando mais fortes a cada evento terrível que ela precisa enfrentar. Como não poderia deixar de ser, na realidade em que vive, o racismo é uma presença constante e fundamental nessa persona, e é interessante como Chukwu deixa isso evidente, inclusive dando ao filme a forma crescente de sua revolta e instigação.

Eles mataram meu filho de novo

Till - A Busca por Justiça
Orion Pictures

Ainda que siga uma fórmula tradicional na construção da sua história, optando pela intercalação dos eventos espacialmente separados, num primeiro momento, e passagens de tribunal que levam à repercussão do julgamento, a diretora não abandona sua marca e usa muito de elementos sensoriais para amplificar os sentimentos. O modo como ela garante a identificação, logo nos primeiros momentos, destacando o mau-pressentimento daquela mãe, ou como cria o atordoamento e a tristeza durante o depoimento, são ótimos exemplos.

Porém, se essas inserções trazem alguma vitalidade e diferenciam em parte o longa, o quadradismo do todo torna Till menos potente do que poderia ser. É como se a ousadia estivesse sempre presa em detalhes de um conjunto preso ao tradicional, causando uma certa frustração. Ainda assim, os pontos positivos são inegáveis e a história, além de potente, é importante de ser conhecida.

Um grande momento
O medo no carro.

Nota: 3/5

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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