Ficção Científica
Direção: Elena Meirelles, Lívia de Paiva
Elenco: Deyse Mara, Lila M Salú, Micinete Lima, Sarah Nobre, Petrus de Bairros, Guto Parente
Roteiro: Deyse Mara, Elena Meirelles, Lila M Salú, Lívia de Paiva, Petrus de Bairros
Duração: 87 min.
Nota: 6
Em um futuro distópico, um grupo de mulheres se une para combater a política de repressão e exclusão que domina em um governo que pode se comparar tanto ao ideário huxleyano quanto à atual realidade brasileira. A exposição da rebeldia contra o sistema num lugar de fortalecimento da sororidade, de acolhimento e reconhecimento, traz força e esperança a momentos de desolação e cansaço. É nesta identificação que Tremor Iê se destaca.
A constituição do ambiente explicita padrões históricos de sistemas de governo autoritários, e assume determinações estéticas de clássicos literários do gênero. No coletivo, prega-se uma política de limpeza “nunca antes vista”, difundindo o medo que isola os seres e desocupa a cidade. A grande capital do longa traduz-se em deserto e solidão.
A falta de movimento nas ruas encontra a ruptura em um grupo de guerreiras, formadas, não por acaso, por ícones femininos da história do mundo, reais ou mitológicas. Cada uma, a sua maneira, traz em sua constituição feitos por mudanças na estrutura. De Maria a Janaína, de Artemísia a Nzinga, aquelas mulheres unidas refletem um movimento real contra o silenciamento e a estagnação, a possibilidade de construir uma nova realidade.
É interessante como Tremor Iê mescla o fantástico ao real e tenta tornar orgânico o mosaico de sons e imagens que provocam o imaginário. A criação, que tem identidade e segue caminho próprio, é também muito marcada por suas atrizes, seja na constituição das personagens, seja nas contribuições artísticas individuais.
São figuras magnéticas, movendo-se em realidades distintas que mesclam o natural e o artificial, mítico e o real, passado e presente, memória e anseio. Além disso, a transformação de Fortaleza no ambiente que acolhe aquele futuro chama a atenção, tanto pelo reconhecimento de sua geografia urbana quanto no explorar de novas localidades ou na transformação de outras.
Porém, mesmo que conte com muito mais acertos, Tremor Iê acaba se prejudicando com a repetição que dilata algumas sequências e destaca as irregularidades das atuações. Do mesmo modo, frustra um pouco ao encenar aquela que seria sua cena mais potente, construída apenas por relatos e individualizada em cada um dos espectadores. O que se vê, aí, não alcança tudo o que a imaginação de quem assiste ao filme. Geralmente, no embate entre a imagem provocada e a imagem construída, a subjetividade faz com que esta saia perdendo mesmo.
Mas não deixa de ser uma experiência cativante e bastante ousada, tanto pelo abraçar de um novo gênero quanto pela exaltação à mulher, principalmente no transformar e atualizar pulsões míticas em reais, e no buscar alternativas de caminho quando a realidade da situação é tão chocante que só gera apatia. É esse o movimento que se espera encontrar na arte. E como estamos precisando dele…
Um Grande Momento:
A conversa na fogueira
[22ª Mostra de Tiradentes]