- Gênero: Documentário
- Direção: Carla Camurati
- Roteiro: Carla Camurati
- Duração: 145 minutos
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“Prometo manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil”
José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luís Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, Michel Temer, Jair Bolsonaro. Aí estão todos os presidentes eleitos após o fim da Ditadura Militar. A diretora Carla Camurati ousa em sua estreia na direção de documentários ao mirar em um escopo tão largo, mas em seus recortes, destacando pontos que sempre se fazem presente, encontra um caminho para trilhar nessa ainda cambaleante democracia. Em novas e velhas imagens, sob este ou aquele direcionamento 8 Presidentes 1 Juramento – A História de Um Tempo Presente se faz basicamente da repetição de rostos e condutas e também da contrariedade de discursos.
O que Camurati faz não é profundo e nem daria para ser, a menos que ela se propusesse a fazer um longo seriado, mas é um apanhado eficiente de um país que saiu despreparado daquelas imagens aterrorizadoras em preto-e-branco que abrem o filme, e que temos consciência plena do que tratam, para encontrar fracassos. Primeiro toda a movimentação pelas Diretas Já! que deram em nada e, em seguida, o falecimento do primeiro presidente civil, Tancredo Neves, após 21 anos, antes que tomasse posse. A crônica de uma morte anunciada?
“Se é o melhor para o povo brasileiro, por que não agora? Por que não já?”
Leonel Brizola
Todo montado com material de arquivo com qualidade nem sempre boa, resgatado de matérias de jornais brasileiros e internacionais, à exceção de montagens de memes de internet, 8 Presidentes 1 Juramento vai marcando as diferenças entre cada uma de suas figuras principais. o tapa-buraco da situação Sarney, o playboy Collor, o improvisado Itamar, o intelectual FHC, o popular Lula, a feminista Dilma, o traidor Temer e o reacionário Bolsonaro. Entre eles, fatos bizarros que se mantêm ao longo dos anos, e o principal deles, a corrupção que mantém a máquina funcionando com o dinheiro que surge nas campanhas e segue nos bastidores das casas legislativas.
Para contar a história, um formato básico é estabelecido, com cartelas explicativas, que marcam o tempo de cada governo e informam o início dos novos períodos eleitorais e os resultados das urnas, além de indicar situações e o andamento de eventos específicos. Se isso configura uma facilidade narrativa, inclusive esbarrando na obviedade mais de uma vez, ao mesmo tempo faz com que o material torne-se mais ágil e seja compreendido, uma vez que a linearidade não seja possível pela lógica dos eventos.
“Que saiam no próximo domingo de casa com alguma peça de roupa numa das cores da nossa bandeira, que exponham nas suas janelas toalha, panos, o que tiver, nas cores da nossa bandeira, porque assim, no próximo domingo, nós estaremos mostrando onde está a verdadeira maioria”
Fernando Collor
Fatos marcantes de cada um dos governos também pontuam o documentário, com sucessos e escândalos, como os fiscais do Sarney e a crise econômica que deixou prateleiras vazias e causou corridas desenfreadas nos supermercados; o confisco das cadernetas de poupança de Collor, os escândalos revelados pelo irmão do presidente, com direito a queima de arquivo, e os caras-pintadas; o relançamento do Fusca e a criação do Real; a quebra dos monopólios, a venda da Vale, as manobras para aprovar a reeleição e os anões do orçamento; o combate à miséria e à fome, a reforma da previdência, mensalão; a atenção à representatividade no primeiro escalão do governo, o aumento das tarifas, a espionagem estadunidense; a missiva traiçoeira, o retrocesso e o estancamento da sangria; e a descida ao fundo do poço, com direito à dancinha em Fortaleza.
É curioso ver FHC, Lula e Brizola, figuras um dia tão marcantes da esquerda brasileira, vozes importantes, repetindo-se em tela em momentos diversos. Do palco das Diretas Já! à uma simples entrevista pré-eleitorais, formando uma chapa ou mesmo descendo a rampa do Planalto na instalação da Comissão da Verdade, e as transformações de suas jornadas. Triste ver a repetição de certos nomes de empresas sempre por trás de esquemas e pessoas que surgiram no passado, algumas pregando o fuzilamento de um dos presidentes e hoje sentando na mesma cadeira.
“Estou constrangido por participar dessa farsa, dessa eleição indireta, conduzida por um ladrão, urdida por um traidor, conspirador, e apoiada por torturadores, covardes, analfabetos políticos e vendidos”
Jean Wyllys
Outro acerto da diretora em 8 Presidentes 1 Juramento é como ela separa discursos do passado que contrariam situações futuras, como Collor falando do respeito à poupança e Lula, talvez a maior vítima das palavras, falando da transparência dos partidos ou da picaretagem e negociata que rolava no Congresso. Ela também faz questão de explicar o choque causado por citações absurdas, como quando apresenta ao espectador quem era Carlos Alberto Brilhante Ustra, o homenageado por Bolsonaro em seu voto pelo impeachment de Dilma.
Bolsonaro, aliás, é compreensivelmente o limite da isenção de Camurati. Ela, que se coloca fisicamente no filme algumas vezes e não resiste a destacar aquilo que a interessa quando insere o recebimento da Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito por Fernanda Montenegro ou o discurso do então ministro da cultura Gilberto Gil pelo audiovisual, tenta ater-se aos fatos, mas há por todo o longa uma opção justa pela definição da persona deste que em 2018 concorreu à presidência e foi o último a fazer o juramento.
“Uma pessoa que administra o Brasil da maneira como ele vem administrando não merecia outro fim, eu fuzilaria”
Jair Bolsonaro
No final das contas, como bem destaca a trilha exagerada de André Abujamra, assistir a 8 Presidentes 1 Juramento é, para aqueles que passaram por tudo isso, um passeio dolorido por uma história tragicômica, cheia de tristezas mas também temperada por momentos inacreditavelmente ridículos, com figuras como Roberto Jefferson e pessoas que justificam o enriquecimento com mais de 200 sorteios na loteria; com um show de horrores que foram as justificativas para o afastamento de uma presidenta democraticamente eleita e república da cobra; com um justiceiro disfarçado de juiz que tinha a função de eliminar um candidato para depois tornar-se super-ministro do governo eleito e — isso não está no filme — hoje ser um dos principais nomes da próxima disputa; com muitas mentiras, entreguismos, fracassos e decepções. Mas é também, para aqueles que só viram uma parte desse show, a possibilidade de entender que as coisas nunca mudaram e precisam mudar.
Um grande momento
A posse de Dilma