(The Boys in the Band, EUA, 2020)
Escrita por Matt Crowley e montada pela primeira em vez em 1968, The Boys in the Band se tornou um marco ao abrigar em seu texto personagens homossexuais tratando com normalidade e descontração suas questões mais íntimas e caras. 50 anos depois, a nova versão cinematográfica da peça (a primeira foi levada às telas dois anos após a montagem por William Friedkin, que ganharia o Oscar no ano seguinte por Operação França) obrigatoriamente precisa ser ambientada naquele mesmo ano original, ou sua adaptação teria que mudar muito de seu contexto; a comunidade LGBTQI+ de 2020 é outra. Ainda que sua essência esteja representada.
O filme promove a estreia do ótimo Joe Mantello (a salvação de Hollywood) na direção de cinema, ele que já é dono de dois Tonys de direção teatral; infelizmente a carreira de Mantello no audiovisual está presa a Ryan Murphy, diretor/produtor que tanto promove maravilhas como American Crime Story quanto catástrofes como a já citada minissérie que Mantello salvou, esse ano. Murphy é um dos produtores aqui, e ao vermos essa nova versão, a pergunta que fica no ar é se o mundo precisa de uma nova versão de The Boys in tha Band, enquanto texto e enquanto cinema – ou algo que o valha.
Nenhum talento está inteiro aqui, o que vemos em cena não é uma reimaginação imagética como o saudoso Mike Nichols nos acostumou em projetos como Closer e a histórica Angels in America. Na acepção literal da expressão, o que temos é o velho e “bom” (ou não) teatro filmado, pouco imaginativo esteticamente e preso a uma estrutura travada que não deixa a câmera realizar coisa alguma, na imensa maioria das cenas. Aqui e ali um travelling mais aberto, um enquadramento caprichado (a fala final de Harold para Michael), mas a grosso modo o que temos são planos e contraplanos, e uma sucessão de planos fixos e burocráticos.
A culpa não me parece caber de ser jogada exatamente na estreia do multitalentoso Mantello atrás das câmeras, quando o projeto parece ter sido concebido todo nessa pegada antiquada, ou pouco evolutiva enquanto peça de cinema; na verdade o que assistimos é mesmo uma apresentação de uma montagem feita dois anos antes na Broadway com esse mesmo elenco, onde a abertura e o encerramento tentam fugir da caixa fechada do teatro, e ao fazê-lo só deixam claro a origem do projeto, absolutamente inválida enquanto material de análise audiovisual com esterilidade tão posta na mesa.
Pra completar o pacote, The Boys in the Band envelheceu. Ou o gay hoje quer ser mais do que um grupo de bichas enclausuradas e amargas, a desfiar suas melancolias, suas desilusões e seus recalques com o mundo, que não é culpado pela dor de um bando de homens adultos quase inteiramente brancos e cis muito bem de vida, obrigado. O mundo mudou, graças a Deus… e o texto da peça parece hoje representar até sim algumas falas interessantes sobre uma fatia de uma classe cada vez mais exposta e livre, que sim ainda sofre e se interioriza a ponto da negatividade, mas que não carece de ser vista com a amargura e o sofrimento das correntes arrastadas de outrora, que parece ser o mote justamente da síntese do texto.
O elenco tem pouco a fazer, e quando o faz, passeia entre a afetação histriônica e a reclusão de suas capacidades emocionais (exemplo 1: Robin de Jesus; exemplo 2: Michael Benjamin Washington – as duas minorias?, ah tá…), e o filme parece simplesmente não acreditar naquela visão de mundo tão ultrapassada. Um destaque? Hummmm, talvez Zachary Quinto tenha a sutileza pra passear pelos lugares arriscados por onde passeia, e Matt Bomer tem uma leveza interessante; dessa vez, apesar da hiperinterpretação, me parece que Jim Parsons não tinha como oferecer outra coisa que não aquilo.
The Boys in the Band hoje parece um fóssil de dinossauro, pronto para ser analisado e estudado, e cuja revisita não parece ir muito além de uma visita a um museu. Que seus personagens ainda ressoem em 2020 e representem algumas visões caricaturais que os seres humanos sigam vestindo em si mesmos me parece ressaltar mais uma tristeza particular social, e que o filme parece dar voz à esses tipos, que se existem, deveriam evoluir, se amar mais, se orgulhar mais, ebulir mais… e não sair por aí brincando de ódio interno e expondo isso como se fosse divertido. Não é.
Um grande momento
O primeiro diálogo.