- Gênero: Drama
- Direção: Marjane Satrapi
- Roteiro: Jack Thorne
- Elenco: Rosamund Pike, Yvette Feuer, Mirjam Novak, Ralph Berkin, Sam Riley, Simon Russell Beale, Sian Brooke, , Drew Jacoby, Aneurin Barnard
- Duração: 109 minutos
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Assistir a um filme de narrativa tradicional, em um dos gêneros mais enferrujados do cinema (a biografia), ganhar as telas pelas mãos de uma muito talentosa animadora, escritora, roteirista e diretora como Marjane Satrapi, autora do brilhante Persépolis, é como assistir Claire Denis entrar na faculdade de administração, ou seja, de cara se configura como desperdício de talento. Uma mulher genial como Marie Curie é a protagonista de Radioactive, novo filme disponibilizado pela Netflix a partir de hoje que soma os talentos da biografada e da biógrafa e oferece um produto que tenta oferecer uma pitada imagética do que são as capacidades de ambas.
Escrito por Jack Thorne (de Enola Holmes e Extraordinário), o filme é baseado no romance de Lauren Redniss sobre a cientista que descobriu, ao lado do marido Pierre, dois novos elementos químicos – o polônio e o rádio – e, embora tente criar algo novo na maneira como investiga os resultados das criações de ambos assim como as origens pessoais da própria Marie, esbarra sempre na função primordial de seu gênero: mapear registros de vidas que, espetaculares como essas ou não, nunca caberão no espaço ínfimo de duas horas de duração, em meio a valores de produção exemplares.
Ao invés de cercar-se da natureza de sua protagonista, tentar traduzir seu espírito e circundar o que a tornou referencial que fosse além de sua descoberta, Radioactive limita sua relevância ao batido recurso de filmar passagens importantes da vida da protagonista, saltados no tempo para delegar os méritos de cada momento e assim tentar reconstruir uma existẽncia; pela enésima vez, descobrimos que esse fator não funciona, se for utilizado sem outras camadas para preencher o tanto de vida que falta em torno de qualquer personagem, se ele for relegado a momentos esparsos.
Como se trata de história de uma “mulher à frente do seu tempo”, não faltam as cenas clichês de sempre, como os olhares das mulheres de desaprovação na rua, a tentativa de manchar sua reputação, os ataques misóginos e machistas, a xenofobia explícita, tudo construído com burocracia, para elencar o leque de acontecimentos de uma vida inteira, intensa e cheia de camadas, infelizmente reduzida a sequências imemoráveis em profusão; porque criar uma narrativa tão repleta de lugares comuns para retratar uma vida tão incomum? Seguindo uma cartilha que precisa cumprir, o filme escapa dessa moldura antiquada para situar algo depreciativo narrativamente e absolutamente inócuo.
Sem criar organicidade, Radioactive enxerta de tempos em tempos em sua duração pequenas esquetes do que as descobertas do casal Curie trouxeram para o mundo, que soam deslocadas o tempo inteiro e ainda denigrem o trabalho dos cientistas, como se apenas negatividade a descoberta dos elementos tivessem trazido. Tirando uma passagem a respeito do tratamento do câncer em uma criança, o filme dá ênfase a Hiroshima e Chernobyl, com recriações das consequências nucleares às duas cidades; ao contrário de passar uma impressão positiva, o espectador sai da produção com o lado negativo dessas descobertas em destaque absoluto, o que soa no mínimo como uma repetição dos ataques que Marie recebeu em vida.
Não podemos negar no entanto o quanto Radioactive é cinematograficamente interessante, com a direção de arte de Michael Carlin (indicado ao Oscar por A Duquesa) em destaque junto à fotografia de Anthony Dod Mantle (Oscar por Quem Quer Ser um Milionário?) e a presença como sempre magnética de Rosamund Pike. Recém premiada com um Globo de Ouro pelo sucesso da Netflix Eu me Importo, a atriz britânica reafirma seu talento incontestável com uma interpretação sensível sobre uma personalidade forte, sua semente de feminismo muito aflorada, para dar ao filme um brilho que ele não conseguiu demonstrar na totalidade em qualquer outra área.
Um grande momento
O atropelamento