- Gênero: Comédia
- Direção: Fernando León de Aranoa
- Roteiro: Fernando León de Aranoa
- Elenco: Javier Bardem, Manolo Solo, Óscar de la Fuente, Almudena Amor, Sonia Almarcha, Tarik Rmili, Fernando Albizu, Martin Páez, Mara Guil, Celso Bugallo
- Duração: 120 minutos
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Grande vencedor do Goya 2022 (o Oscar espanhol) e candidato da Espanha ao Oscar de filme internacional, tendo inclusive ficado entre os 15 finalistas, El buen patrón chega hoje no Star+ com a moral lá no alto. Assistindo ao filme, as coisas fazem sentido – algum sentido, que seja. É verdade que existia Mães Paralelas como um rival às duas vagas, mas o longa de Fernando Léon de Aranoa tem um caráter pop, de comédia dramática ligeira e completamente compreensível e apreciável a qualquer público, que sua escolha faz um sentido dentro de um contexto mais amplo. Coloca na conta o fato de que o país não pode escolher tudo que Almodóvar dirigir para consagrar, pega meio mal assumir esse tipo de protecionismo, principalmente quando o filme anterior (Dor e Glória) já esteve no topo.
Tirando esses pormenores que não mudam os predicados da produção, Aranoa é um cineasta que não têm a atenção devida fora do seu país de origem. Apesar de ter dirigido produções como Segunda-feira ao Sol, Princesas e Um Dia Perfeito, ele ainda não é marcado como uma aposta segura, e suas obras ainda não foram tratadas com entusiasmo prévio, como costuma acontecer com cineastas de grande porte. El buen patrón, por si só, deveria gerar esse tipo de comoção, tendo em vista sua vocação comunicativa, sem perder o teor discursivo, sua predisposição à denúncia do Grande Poder em relação ao povo. É, por assim dizer, uma produção de viés político, ainda que sua jornada intelectual abrace um olhar popular que não o impede de ter força dramática.
Sua condução sempre segura, com muita elegância e assertividade, não é desprovida de méritos artísticos. Como nas cenas onde investiga a fábrica de balanças, cenário principal, através dos passos e olhos de seu dono, Julio Blanco, que passeia pelo espaço sendo o rei que ostenta ser, mas sem tirar da produção esse mérito observatório sobre o personagem e seu império. São sutilezas de abordagem imagética que contrapõem exatamente o caráter popular da sua narrativa, um filme que tem seus pés fincados em dois universos que a cinefilia acredita que não se comunicam, e Aranoa a cada novo filme prova como isso é ultrapassado. Adiciona discussão acalorada em um roteiro que foi aprovado anteriormente a outras produções, sem abrir mão de uma certa sofisticação.
Estamos diante daqueles títulos com tempo estipulado para desenvolvimento (no caso, o espaço de uma semana) onde todos os problemas existentes de um homem virão à tona, acrescidos de outros que serão criados durante esse tempo. Ou seja, não é uma produção que preze pela originalidade, mas que consegue fazer funcionar suas ideias, e desenvolve seus pontos de interesse com clareza e objetividade. Cada um dos elementos que se apresentam na direção do protagonista – o empregado demitido que se transforma em problema maior, seu gerente desesperado com um possível caso extraconjugal da esposa, uma nova estagiária que tenta sua fidelidade, entre outros – tem funcionalidade exemplar. O roteiro, também de Aranoa, é desenvolvido com muita propriedade, revelando as características não apenas do seu protagonista ao se desvencilhar dos apuros, mas também revelando seu universo viciado.
A verdade é que, independente da culpa de Blanco, ele lida com pessoas muito irritantes, em todas as instâncias. O funcionário demitido, o amigo com problema no casamento, a jovem atraente… o espectador consegue entender a exasperação do protagonista, porque todos em cena são personagens que tiram qualquer um do sério. Insistentes, invasivos, é muito fácil se colocar no lugar de Javier Bardem e compreender seu lado – ao menos até o momento em que ele mesmo começa a destruir o próprio castelo de cartas. Não é uma ideia de dar razão ao grande empresário, mas de como Aranoa instiga a sedução de seu ator a capturar a plateia, enquanto dedica seu roteiro a delinear um time de coadjuvantes que pareça estar em cena apenas para destituir de paciência o protagonista.
Fica a dúvida se essa era a melhor forma de conduzir esse personagem, porque El buen patrón não o absolve, mas deixa o espectador tomar as dores desse homem de moral inexistente. O tal “bom patrão” do título é absolutamente irônico, mas o talento de Bardem (e a forma como a direção institui a ele todas as suas armas de sedução, em texto e presença) nos faz comprar o que o personagem vende: correção, caráter, delicadeza, entre outras falácias. Uma das jogadas dos patrões ruins, aqueles que não têm o talento de Blanco/Bardem, é se garantir na sinceridade, e aqui esse protagonista se esconde em cortinas de fumaça que ele mesmo cria, com o talento que se espera de um bom salafrário.
Um grande momento
O jantar