Crítica | Outras metragens

A Incrível História de Henry Sugar

(The Wonderful Story of Henry Sugar, EUA, 2023)
Nota  
  • Gênero: Comédia
  • Direção: Wes Anderson
  • Roteiro: Wes Anderson
  • Elenco: Ralph Fiennes, Benedict Cumberbatch, Ben Kingsley, Dev Patel, Richard Ayoade
  • Duração: 40 minutos

Antes de maiores análises, um ponto: a Netflix irá lançar um curta-metragem por dia da semana dirigido por Wes Anderson, adaptado da obra de Roald Dahl. Isso faz sentido para alguém, ao invés de juntar todos e lançar como um longa em coletânea da obra do escritor? Parabéns para quem descobriu o sentido, em mim não chegou. Dito isso, estamos diante, em A Incrível História de Henry Sugar, de um típico material que converge a linha mestra dos dois autores, como já tínhamos visto no brilhante O Fantástico Senhor Raposo. Mas é bom também atentar para a genialidade de Anderson, em não ousar transformar o conto de Dahl em longa metragem, que provavelmente seria uma tentação óbvia; o que está em tela é suficiente para ser apreciado. 

Nada está muito fora do lugar, do que conhecemos e acompanhamos Anderson, há mais de 20 anos. Se no recente (e estupendo) Asteroid City, o cineasta conseguiu mais uma vez dobrar sua cartilha particular a favor do que está contando – no caso, transportar uma obra teatral de maneira honesta para o espetáculo cinematográfico – aqui, o recurso, apesar de excelente, não apresenta novidades. É uma história no esquema “cebola”: uma narrativa, que sobrepõe uma narrativa, que sobrepõe uma narrativa, em algumas camadas. Com poucos atores em cena, e uma concisão métrica que não compromete a grandiosidade do esquema narrativo, A Incrível História de Henry Sugar é um novo encontro com essa filmografia, que em 40 minutos, é como um resumo do artista que conhecemos. 

Isso é, ao mesmo tempo, uma excelente notícia e também uma notícia… que já lemos, se não necessariamente ruim. Ralph Fiennes conta a jornada de Benedict Cumberbatch, que conta a jornada de Ben Kingsley, que conta a jornada de Dev Patel – é basicamente isso. E que bom que é só isso, e isso está sendo transmitido para o espectador de maneira tão rápida, com economia de gestos. O que brilha, mais uma vez, é a coreografia da direção de arte, que não apenas se aplica aos contos curtos, como se sobrepõem uns aos outros. É um trabalho de maquinaria nada inovadora, mas cujo resultado visual é exatamente aquele que o narrativo evoca: uma fábula de espaço-tempo contínuo, que exerce seu poder ao desenvolver novas curvas em cima de falas anteriores. 

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Nesse sentido, o que A Incrível História de Henry Sugar apresenta é, mais uma vez e como em toda obra de Anderson, uma elegia à fabulação, e ao poder extraordinário de extravasar os limites orais. São interligações que sustentam o orador seguinte, e amarra o jogo do anterior, e expande os conceitos uns dos outros. No fundo, o que está sendo debatido, que é um conto rápido sobre honestidade extraordinária, não tem muito o que nos motivar, para além do que já constitui a obra do diretor. É um jogo rápido, como uma anedota visual de proporções pequeninas, em um esquema de arrebatamento instantâneo e pouco além. O suficiente para o fã manter suas moedas sendo atiradas na direção do diretor, e do detrator não se mover em sua decisão de continuar odiando-o. 

Ainda assim, vale o movimento de acompanhar uma carreira tão demarcada em assinatura, realizando um exercício de remarcar seu estilo mais uma vez, e mais uma vez. Não há, para onde se olhe, qualquer registro que encontre A Incrível História de Henry Sugar em lugar mais ou menos apreciável que qualquer outra de suas obras, ou que nos marque como alguns títulos de sua filmografia. É uma brincadeira saudável e rápida, muito custosa acredita-se, mas possível em tempos de streamings que possam bancá-la. Ao espectador, cabe o maravilhamento de acompanhar uma dramaturgia enxuta de um homem que tem aplicado suas ideias em desdobramentos considerados demasiados. Aqui, nem ameaçamos cansar do que estamos vendo, e Anderson já partiu, com sua trupe de fabuladores especiais. 

Um grande momento
Henry pressente um ataque cardíaco

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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