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Carga Máxima

Velozes e derrapantes

(Carga Máxima, BRA, 2023)
Nota  
  • Gênero: Aventura, Policial
  • Direção: Tomás Portella
  • Roteiro: Leandro Soares, Tomás Portella, Rodrigo Castellar
  • Elenco: Thiago Martins, Sheron Menezzes, Milhem Cortaz, Evandro Mesquita, Paulo Vilhena, Vitória Valentim, Raphael Logam, Fumassa Alves
  • Duração: 100 minutos

A Netflix lançou pouquíssimas produções nacionais de longa metragem esse ano, sendo Ricos de Amor 2 um desses únicos. Chega agora ao canal Carga Máxima, dirigido pelo experiente Tomás Portella, que esse ano já lançou La Situación e que parece que ainda lança Aumenta que é Rock’n’Roll em 2023; ou seja, é um caso parecido ao de Hsu Chien na temporada. Diferente de Chien, que lançou Desapega! com sucesso de público e críticas menos trágicas, Portella precisa que o próximo lançamento seja bom, ainda que essa estreia tenha o que dizer. A proposta de criar um cinema de ação para um mercado de consumo rápido, que siga uma linhagem dos primórdios de Velozes e Furiosos, é válida, e poderia ser abraçado por qualquer país latino e periférico. 

A premissa pode até ser absurda, mas ela é vendida com facilidade e o público-alvo será comprado pela experiência. O herdeiro de uma escuderia de competição de caminhões de corrida precisa pagar as dívidas do pai com bandidos contrabandistas, enquanto tenta se tornar de novo um piloto competitivo, dentro das pistas e nas ruas do crime. Nada é muito coerente de muitos pontos de vista em Carga Máxima, mas se prestam a uma lógica particular onde tais questões precisam ser relativizadas. Cabe, nesse universo, um famoso campeão de corrida se passar por um receptador de cargas roubadas, e está tudo bem. Muitas outras coisas, porém, são da ordem da forçação extrema, mediante qualquer colocação que se apresente. 

Um dos exemplos é o fato de uma jovem órfã achar perfeitamente normal viver (e querer viver) com um dos responsáveis pela morte de seu único parente vivo – e que era seu pai! No velório, há a reação esperada; na cena posterior, a aceitação já veio, e nem tem aquela habitual cartela “tantos meses depois”. Esse é um dos pontos onde se vê que, apesar das seis mãos, o roteiro de Carga Máxima estava bem longe do razoável para ser filmado, além de que a indústria não pode pensar que um filme de alcance amplo não precisa ter cuidado narrativo. Se existe alguma veracidade no filme, elas passam longe das relações humanas, que apenas precisamos aceitar e seguir, já que a coerência verdadeiramente não existe. 

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Nenhum dos personagens em cena tem mais do que duas camadas, no máximo; a grande maioria, só tem a casca mesmo. Isso faz com que Carga Máxima não consiga avançar em quase nenhum olhar dramatúrgico, e a culpa passa longe de ser do elenco. Thiago Martins é quem se sai melhor no quadro geral, e sua interação com a jovem Vitória Valentim é o que aparenta credibilidade. De resto, apesar de serem reconhecidos como talentosos, nomes como os de Milhem Cortaz, Paulo Vilhena, Raphael Logam e Evandro Mesquita de nada movem dentro dos estereótipos programados como seus avatares. A presença de Sheron Menezzes em cena é uma pausa para a respiração diante dos excessos, mas é realmente a relação que deveria ser conturbada entre dois sobreviventes que nos conecta emocionalmente ali. E pensar que essa relação entre essas duas pessoas que estão errando em suas trajetórias podia ser muito bem explorada, porque os elementos estão expostos, não precisa criar nada; infelizmente não é.

Em contrapartida aos desarranjos do roteiro, a direção de Portella mostra que ele vem treinando em seu ofício e conseguindo avançar de maneira razoável por essa zona de cinema onde nada é muito melhor do que poderia ser. Carga Máxima é um filme feito para exportação, de consumo ligeiro e sem quaisquer pretensões maiores. O cinema em esquema industrial não precisa ser concebido dessa maneira, mas esse é o quadro habitual apresentado. Dentro das possibilidades, o filme não envergonha quando filma o que é seu carro-chefe duplo, o potencial das corridas, sejam elas profissionais ou empreendidas entre policiais e bandidos. É uma seara que Hollywood domina muito bem (e ainda assim, saem decisões como a dos cortes alucinantes em Gran Turismo), e temos pouca experiência; esse é outro motivo para apreciar o que foi conseguido.

Um grande momento

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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