Crítica | Festival

I’m Fine (Thanks For Asking)

(I'm Fine (Thanks For Asking), EUA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Comédia
  • Direção: Kelley Kali, Angelique Molina
  • Roteiro: Kelley Kali, Roma Kong, Angelique Molina
  • Elenco: Wesley Moss, Kelley Kali, Dominique Molina, Lucas Byrd, Jacolyn Holmes, Xing-Mai Deng, Brooklynn Marie
  • Duração: 90 minutos

Nesse mundo capitalista, onde poucos têm muitíssimo e muitíssimos têm pouco, as coisas já iam de mal a pior. Com a Covid-19, o quadro se agravou e segue se complicando dia a dia. Os que começaram a ter algo ou tinham menos perderam tudo, aumentado o abismo das classes, e uma nova realidade de exclusão se deu. Desemprego, falência, congelamento de salários fizeram crescer a população em situação de rua ao redor do mundo. Danny é mais uma das que não tem mais dinheiro para o aluguel e teve que se mudar com a filha pequena para uma barraca, enquanto tenta juntar alguma grana para pagar o depósito de um novo lugar para morar. I’m Fine (Thanks for Asking) conta a sua história.

Centrada na personagem, defendida com muita força e empatia por Kelley Kali, a comédia dramática dirigida pela própria atriz e por Angelique Molina é um retrato dos dias de hoje. Além de abordar a pandemia de um jeito original, retrata a periferia com um outro olhar, explorando as camadas desse capitalismo que vai tirando de todas sem distinção. Seu interesse são as mulheres do local, aquelas que ficaram e querem ficar, as que estão na batalha e não aguentam mais ser importunadas. No cenário da reconstrução de um mundo pós-caos – não que não tenha sido assim antes –, o que as une é o dinheiro, aquele que falta para uma e falta para todas, para o mais supérfluo e o mais importante, do cabelo que se arruma ao serviço de babá.

I'm Fine (Thanks for Asking)
Foto: Divulgação

I’m Fine (Thanks For Asking) percorre o ambiente na velocidade das rodas dos patins de Danny. Fazendo dreads ou entregando marmitas, vamos junto com ela, e a acompanhamos tentando completar os US$ 200 para o tal depósito, e, quando falta um pouquinho, torcemos pela compreensão do senhorio ou, pelo menos, pelo aumento do prazo. O filme vai fazendo com que aquela a personagem se torne muito próxima, mérito de um roteiro que busca a identificação e, junto com a direção, destaca a naturalidade com que todos os eventos se dão. Além do mais, há o contexto. Impossível não entender a inserção de Danny naquele universo de caos, pela questão feminina, se espectadora, e pela questão pandêmica, se humano.

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O texto, assinado pela dupla de diretoras e por Roma Kong, alterna entre momentos bem duros e outros mais suaves, e mescla grosserias e situações de extravasamento, com Danny interagindo com a cidade, suas cores e seu espaço. Muitos diálogos e os deslocamentos deixam a marca indie (a mais associada ao estilo, não apenas ao valor), assim como as participações especiais de Lamar Usher, Deon Cole (também produtor do longa) e Deng Xing-Mai e outros.

I'm Fine (Thanks for Asking)
Foto: Divulgação

Há uma passagem em que Kali, como diretora, e Molina quase nos colocam em cena. É o momento “’I’m fine, thanks for asking” ou “estou bem, obrigada por perguntar” que acabou virando o nome do filme, aquele em que respondemos no automático ou mentimos para que as coisas não piorem. Nele, a protagonista encontra sua amiga Brooklynn e conta primeiro a história que queria estar vivendo e depois, envergonhada, revela a verdade. É tudo tão real e orgânico na cena que isso traz, ao mesmo tempo, diversão – sem dúvida, é um dos momentos com mais risadas do longa – e conforto, um pouco de alívio à estressante jornada.

I’m Fine (Thanks for Asking) vai chegar com seu jeito meio afobado — externamente, porque tudo ali foi bem calculado — falando de coisas muito duras, vai trazer a verdade da pandemia e das mulheres nesta realidade de um jeito bastante diferente, e vai tirar a gente do nosso conforto, escancarando nossos privilégios. Levamos tantos momentos de Danny e com Danny com a gente depois que o filme acaba, sejam eles perrengues e sucessos, que ela vai se tornar uma dessas personagens que ficam.

Um grande momento
Danny e Brooklyn

[2021 Bentonville Film Festival]

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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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