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Berenice Procura

(Berenice Procura, BRA, 2017)
Suspense
Direção: Allan Fiterman
Elenco: Cláudia Abreu, Eduardo Moscovis, Vera Holtz, Emilio Dantas, Caio Manhente, Valentina Sampaio, Fabricio Assis, Alessandro Brandão, Leonardo Brício, Brigitte de Búzios, Ricardo Ferreira, Danubia Firmo
Roteiro: Luiz Alfredo Garcia Roza (romance), Flávia Guimarães
Duração: 90 min.
Nota: 4 ★★★★☆☆☆☆☆☆

Há um esforço louvável em Berenice Procura: o de voltar suas lentes para o universo trans e LGBTQI+ sem evidentes preocupações morais e militantes. O retratar desta realidade, em um ambiente marginal que mescla violência e exclusão, aceitação e reprovação, amor e ciúme, aposta na isenção, na plasticidade das imagens e busca um outro caminho para contar sua história.

Baseado no livro de Luiz Alfredo Garcia Roza e dirigido por Allan Fiterman, o longa-metragem conta a história por trás do assassinato da trans Isabelle. Encontrada morta na praia de Copacabana, a jovem estava prestes a deixar a vida de garota de programa. Na noite de sua morte, quitaria sua dívida e faria a última apresentação na casa de shows da cafetina Greta.

Quem conduz o thriller policial é Berenice, uma mulher que deixou de ser dona de casa para assumir o táxi do pai e começa uma investigação paralela sobre o assassinato após descobrir a ligação do seu filho único com a trans assassinada. Na busca que dá nome ao filme, a ruína de seu casamento, questões maternais e um movimento de autodescoberta vão aparecendo de maneira não linear, como a própria escolha narrativa.

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Embora haja a tentativa de uma abordagem mais cinematográfica, com uma fotografia cuidadosa e elaborada, uma montagem empenhada e a própria construção da narrativa, a fragilidade do roteiro, assinado por Flávia Guimarães e José Carvalho, é um problema muito evidente em todo o filme. Além da falta de profundidade em alguns dos personagens, há um grande número de núcleos e situações que, de maneira artificial, se ligam para construir a história. Enquanto esteticamente existe uma intenção clara de se afastar da teledramaturgia, ela está impregnada na obra por toda a facilidade do conteúdo.

Outros tropeços também comprometem o resultado final. Encabeçando o elenco está Cláudia Abreu, que dá vida à Berenice e o faz com muita competência e dedicação, porém o conjunto não encontra um equilíbrio nas atuações. Escolhas acertadas para determinado papel dividem espaço com possibilidades de boas atuações prejudicadas pelo roteiro ou outras, ainda inseguras.

Entre vários deslizes, alguns temas conseguem sobreviver e é aí que Berenice Procura  se distancia de tantos outros filmes que ficam apenas na tentativa de fazer algo representativo. Entre elas estão a descoberta da sexualidade de Thiago, que encontra na amiga uma compreensão que não existe em casa, e a intenção de mostrar que famílias tradicionais podem ser muito mais disfuncionais que outras com formação menos convencionais.

Há no filme, inegavelmente, um respeito e uma admiração muito perceptíveis, principalmente na construção de Isabelle, vivida por Valentina Sampaio. A personagem se destaca do ambiente nem sempre positivo que habita, não deixando que ele interfira em sua doçura e na capacidade de acolher quem dela precisa e de brilhar, mesmo na dor. Em um universo onde produções começam a se dedicar ao tema trans, eis um diferencial que tem o poder de amenizar os equívocos, mas ainda não é suficiente para que deles se esqueçam.

Um Grande Momento:
Nada tanto assim.

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Crítica originalmente publicada na revista Lume Scope.

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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