Crítica | FestivalFestival de Brasília

Cine Marrocos

(Cine Marrocos, BRA, 2018)
Nota  
  • Gênero: Documentário
  • Direção: Ricardo Calil
  • Roteiro: Ricardo Calil
  • Duração: 76 minutos

Um cinema abandonado é iluminado por um refletor portátil. Passeamos por suas cadeiras destruídas, pela sala abandonada e pela tela já inexistente. Com o passar do filme descobrimos o Cine Marrocos, fundado nos anos 1950 e palco do primeiro festival internacional de cinema do país, com a presença de celebridades estrangeiras.

Num ano onde o desmonte do cinema é uma das pautas do novo governo, assistir ao abandono de um local de cultura e ouvir a estatística do desaparecimento dos cinemas de rua, pois hoje há apenas nove dessas salas na capital paulista, é desolador.

A premissa de Cine Marrocos é acompanhar a ocupação do local pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), primeiro por 25 famílias, número que aumentou muito com o passar do tempo, e relacionar a realidade que encontram com o cinema, tanto como local quanto como arte. É possível perceber a construção gradual do documentário, seja na descoberta das pessoas e em suas entrevistas, quanto no dispositivo de reencenação de cenas de filmes antigos.

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Junto a isto, o diretor Ricardo Calil vai descobrindo o lugar e relacionando-o com o seu passado glorioso. A dinâmica, que parece interessante em um primeiro momento, torna-se repetitiva. As linhas seguidas – observação, arquivo, encenação e entrevistas – também têm dificuldade de conversar entre si. Embora particularmente despertem o interesse, não há uma boa execução desta mistura, algumas escolhas funcionando melhor e uma incômoda falta de aprofundamento com alguns personagens específicos.

Ainda assim, é interessante acompanhar a dinâmica da ocupação e perceber o descaso do governo com um local que poderia estar em um outro lugar de importância para a cidade e a sociedade. Entre histórias de vida e devaneios, vários pontos são tocados, como o abandono social, o desinteresse do poder público e até mesmo questões como a da imigração e pertencimento.

É estranho quando as notícias que davam conta da invasão voltam-se para uma outra realidade negada em cena anteriormente. A associação com cenas de Júlio César, óbvias em certo ponto, retratam também a sensação da plateia.

Embora não encontre o equilíbrio, Cine Marrocos tem bons momentos e é um filme importante para que se conheça uma verdade que passa despercebida por muitos e para que se olhe a arte de um outro lugar, mirando em seu poder de reescrever a realidade e enchê-la de opções e significados.

Um Grande Momento:
O rap de Júlio César.

[52º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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