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Corrente do Mal

(It Follows, EUA, 2014)

Terror
Direção: David Robert Mitchell
Elenco: Maika Monroe, Lili Sepe, Bailey Spry, Keir Gilchrist, Charles Gertner, Debbie Williams, Olivia Luccardi, Jake Weary, Daniel Zovatto
Roteiro: David Robert Mitchell
Duração: 100 min.
Nota: 7 ★★★★★★★☆☆☆

Em sua segunda experiência com longas-metragens, o diretor David Robert Mitchell resolve apostar no cinema de terror. Ainda abordando o universo adolescente, como em seu filme anterior The Myth of the American Sleep Over, Mitchell cria uma metáfora potente e, unindo técnicas para lá de conhecidas do gênero e inovações arriscadas, constrói em Corrente do Mal uma história assustadora.

Jay está vivendo a sua adolescência e resolve que está na hora de perder a virgindade com o bonitinho e pretensamente carinhoso Hugh. Diferente de tudo que ela estava esperando, ela descobre, através do próprio Hugh, que agora terá que conviver com uma espécie de maldição, onde figuras estranhas a perseguirão por onde quer que vá, até que passe a maldição para outra pessoa.

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Sem determinações muito claras de local, Corrente do Mal vai se desenvolvendo como um pesadelo onde ruas desertas servem de palco para agoniantes perseguições em câmera lenta. Diferente do comum ao gênero, Mitchell aposta em planos mais abertos e, ao invés de sustos, embora eles estejam aqui também, na tensão da lenta perseguição.

A época do filme também não é determinada e mistura elementos bem marcados de várias décadas passadas com elementos contemporâneos, como celulares e afins. Essa quebra de um elemento tão perceptível e determinante para a trama também colabora com o clima criado pelo longa-metragem.

A única determinação clara do diretor é quanto a fase pela qual passam os seus personagens. E ele está bastante confortável ao abordar esse universo, deixando detalhes cheios de significado que podem representar a insatisfação com a vida, a vontade de mudar e o desejo de sentir coisas que vão além do “normal”. A ausência de adultos também reafirma esse ponto. Os que estão no filme ou são representações – sempre assustadoras – da maldição ou não aparecem completamente.

Claramente influenciado por clássicos do gênero, Corrente do Mal não poupa referências a filmes de diretores conhecidos como Wes Craven, John Carpenter, Stanley Kubrick, George A. Romero e Jack Arnold. Há ainda um quê de terror oriental, se considerarmos a presença da água como algo sempre associado ao medo.

Entre os pontos positivos do longa-metragem estão a fotografia de Mike Gioulakis (Lake Los Angeles), a montagem precisa de Julio Perez IV (Dior e Eu) e a trilha sonora de Rich Vreeland, mais conhecido como Disasterpeace. Famoso por suas composições para videogames, o compositor consegue angustiar ainda mais o espectador.

O cuidado com o roteiro também é digno de nota. Escrito pelo próprio diretor, beneficia-se da incerteza e da aflição de suas passagens e está cheio de citações de autores clássicos da literatura, como Dostoevsky e T.S. Eliot, aqui com uma curiosa leitura de “A Canção de Amor de J. Alfred Prufrock”, poesia tão angustiante quanto o filme.

Toda uma preocupação também com autorreferências circulares, que chegam como pequenas dicas ao espectador durante todo o filme, pode ser percebida. E é ainda mais eficiente com o trabalho de Michael Perry (conhecido por seu trabalho na minissérie A Dança da Morte), Joey Ostrander e Kimberly Leitz, que assimilam a característica à direção de arte, com o uso de cores específicas determinando o mal e a proximidade dos eventos, ou elementos cênicos que podem também antecipar acontecimentos e determinar a maldição.

Com tudo no lugar certo, Corrente do Mal só se perde mesmo nas atuações, irregulares, e no tempo que dedica a alguns momentos não tão fundamentais à trama. Ainda sobra na tela uma certa prepotência de Mitchell, que acaba culminando na falta de comedimento em passagens pontuais, e talvez um certo moralismo por trás da causa de seus eventos.

Mas nada que invalide o resultado ou que prejudique a imersão naquele universo tão particular criado com muito cuidado para causar reações em quem está do outro lado da tela e que, sem dúvida nenhuma, alcança sua intenção. Um terror que volta à fonte já existente para buscar o que há de bom, mas incorpora elementos novos, criando um novo jeito de perturbar, assustar e agoniar.

Um Grande Momento:
O grandão.

Corrente do mal_poster

Links

IMDb [youtube]http://www.youtube.com/watch?v=s8EE554SvpI[/youtube]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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