- Gênero: Drama
- Direção: Sebastian Meise
- Roteiro: Sebastian Meise, Thomas Reider
- Elenco: Franz Rogowski, Georg Friedrich, Anton von Lucke, Thomas Prenn
- Duração: 116 minutos
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Car l’amour – et lui seul – survit parmi les flammes
Je ferai ce qu’il faut pour défendre le mien
Pode da repulsa nascer o desejo, o companheirismo e ali, em meio a falta de esperança, se solidificar o amor? E ele sobrevive às chamas do ódio, às dores da guerra, às humilhações e silenciamentos se mantendo puro e resiliente após três décadas?
Dirigido por Sebastian Meise e escrito por ele em colaboração com Thomas Reiter, Great Freedom conta a história revoltante, inacreditável e ainda assim, muito plausível e dramática de Hans Hoffmann – Frank Rogowski, incrível na caracterização e na entrega -, preso por ter cometido um crime de “perversão sexual”. Logo Hans, muito afeito ao trabalho e talentoso para a costura e pintura, se relaciona com outros presos e isso acarreta problemas. Causa quase que dor física ver como ele sistematicamente é levado para a solitária por se manifestar muitas vezes tão somente contra atitudes arbitrárias dos guardas e outros funcionários da prisão. Ele é submetido a um nível de humilhação muito próximo ao experimentado por Billy Hayes naquela tenebrosa penitenciária turca.
![Great Freedom](https://cenasdecinema.com/wp-content/uploads/2021/10/Great-freedom_interno2.jpg)
1945, 1957 e 1969
E os anos, décadas vão se passando. Por Hans passam ex-namorados, amantes filhares e companheiros de cela como o cozinheiro e tatuador Viktor (Georg Friederich), preso por assassinato. Entre um fósforo (às vezes com cigarros e outras não) levado de forma clandestina até Hans na solitária, para aquecê-lo, não demora muito para a chave de Great Freedom girar e, de modo muito orgânico e bem encaixado, se materializar a história de amor entre os dois companheiros.
Great Freedom é um dos filmes mais comentados dentre os selecionados nessa edição da Mostra SP e não sem razão: é um drama pós-Segunda Guerra com ingredientes que o tornam uma experiência dolorosa, catártica, revoltante ainda que um pouco reconfortante por expressar como o espírito humano não se dobra perante às adversidades quando é aquecido por sentimentos bons.
Tatuado no coração
Meise usa sutis iconografias para expressar a aridez daquele lugar e, ainda assim, a possibilidade de calor humano como nas cenas onde Hans combina “não se levantar durante a revista nas celas” para dormir na área externa e então poder ter encontros embaixo dos cobertores. O enquadramento e os closes quando Viktor interage com Hans apenas pela portinhola da cela, além do trabalho de edição, criam a tensão exata necessária para aqueles embates e negociações até uma das cenas mais climáticas de troca de favores que se concretiza. Na sala de costura, o contraste entre o tecido rosa claro que é trabalhado e os uniformes da prisão, num tom de brim azul, remete a identificação binária menino/menina tão taxativa quanto violenta num mundo, seja no século 20 ou em 2021, que nunca foi capaz de compreender que as pessoas não precisam se encaixar em padrões normativos.
![Great Freedom](https://cenasdecinema.com/wp-content/uploads/2021/10/Great-freedom_interno1.jpg)
Nome da boate gay em Berlim (então Berlim Ocidental), Great Freedom evoca tantas sensações em Hans – de medo e de tesão – mas algo está estranho. O travelling delicado, passeando pelos corpos que praticam relações pelas salas e cantos do local – que lembram muito as celas -, ao som do cavalheiro da canção, Charles Aznavour, com “L’amour c’est comme un jour”, vai trilhando a conclusão a qual chega Hans: que não é mais possível enxergar uma vida dentro ou fora do cárcere apartado de Victor.
Ganhador do prêmio do júri no Un Certain Regard em Cannes, Great Freedom é um achado pela força dramática de sua história comovente de resiliência e amor perante a monstruosidade da guerra, do ódio e do preconceito que mata. Por mais que seja um tanto convencional em sua tessitura narrativa, seguindo os ciclos temporais já expostos para amplificar os laços que vão se fortalecendo entre Hans e Viktor até o desfecho da história de amor, tem a capacidade de não deixar o ritmo desandar e nem apelar para o maniqueísmo que seria um caminho mais fácil em se tratando de um subgênero como esse dos filmes de prisão que tanto explora a miséria humana. Mas que, como os bons exemplares que podemos evocar de antemão como o Expresso da Meia-Noite e Um Sonho de Liberdade, apoiam o storytelling num estudo profundo de personagens e como a vida daqueles homens é transformada pela experiência do encarceramento ao mesmo tempo em que transforma os que os cercam e nós, que aqui do outro lado estamos.
Um grande momento
Abraço partido no pátio