Crítica | Outras metragens

Papai Se Foi

(Dad Is Gone, ESP, 2020)

  • Gênero: Experimental
  • Direção: Pere Ginard
  • Roteiro: Pere Ginard
  • Duração: 4 minutos
  • Nota:

Quando o Cinema (num geral, porém nesse caso em particular, com uma proposta de narrativa hermética) nos consegue invadir e situar-nos em uma atmosfera de terror psicológico mediante o que o próprio título já lega à produção, resta ao espectador extravasar sua apreensão do material filmado com as ferramentas captadas pela subjetividade – principalmente em casos como os de Papai Se Foi, filme disposto no Festival Ecrã, palco de experimentações de linguagem que também devem ser compreendidas pelo olhar crítico com a mesma natureza.

Na tela, o autor espanhol Pere Ginard, que também é ilustrador, parece doar parte de suas experiências particulares em imagens que podem (ou não) tocar quem as acessa. No cinema mais arriscado, propostas de linguagem com narrativa menos clássica, tendem a provocar reações diversas – e adversas – no espectador. Na minha percepção, um filme de imersão complexa pode nos fazer capturar por lugares onde o nosso psicológico também costuma aflorar. Unido a um título que já realiza a metade do trabalho, fica mais fácil perceber alguns signos visuais.

Papai Se Foi, de Pere Ginard

Repleto de jogos visuais onde os olhos de inúmeras gravuras são alteradas em imagens concebidas previamente, Ginard se embrenha em ressignificar o mito do abandono, porém mais que isso (que é tão óbvio), o filme transpõe para a paternidade muitas das angústias, medos e tensões do ser humano em suas muitas fases de vida, não apenas na infância – como o título mais uma vez poderia falsear; nesse caso, há claramente uma ironia de posicionamento de percepção prévia e também uma forma de desconstrução das sensações. Com essa ironia compreendida, o filme se impõe como um filme de terror dos mais psicológicos, fazendo o espectador acessar medos recônditos da nossa formação.

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Em seus tons de vermelho, o filme provoca mais uma reflexão junto a sua compreensão de gênero e o lugar onde pretende se inserir cinematograficamente; é o horror de construção familiar que irrompe para se fazer peça de cinema, em gesto, textura, molde das ilustrações e coloração estética. De duração diminuta, Papai Se Foi se veste de aparente inocência para invadir uma seara investigada por tantos divãs, nossa relação por vezes controversa com a figura masculina que nos gerou. Dotado de criação de imagens perturbadoras, o filme permanece nos espectador por muito tempo após a sessão – seja pelo caráter emocional ou pela experiência imagética.

Um grande momento
A ciranda em chamas

[4º Ecrã]

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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