- Gênero: Experimental
- Direção: Nuria Giménez
- Roteiro: Nuria Giménez
- Duração: 73 minutos
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Só dez por cento é mentira, o resto é imaginação
Manoel de Barros
Revisitar imagens, dar a elas novos significados. Com Meu Pretzel Mexicano, Núria Giménez faz uso da criatividade para construir uma história completamente nova. Diferentemente da nova onda de ressignificação de imagens, é sutil na elaboração do vínculo entre passado e presente, na fórmula de um ser definido pelo outro, na perpetuação de algo. Seu interesse é criar, fabular.
As imagens ora contrastam com as palavras, ora as confirmam. O espectador se perde no jogo, só sabendo do que se trata nos créditos finais do filme. Ao assumir as palavras do suposto diário de Vivian Barret e ilustrá-las com arquivos caseiros em 16 milímetros, banca a fantasia e a torna concreta. É tudo muito possível, muito palpável.
Boa parte disso transcende o visual. A escolha e disposição de sons destaca a condição de um dos personagens e, mais do que isso, pontua e cadencia a trama. São intromissões bem-vindas numa experiencia onde a imersão é completa. A intimidade com quem narra, em seu cotidiano e desejos, só cresce, assim como a torcida por uma reviravolta na história. Francesca com a mão na maçaneta em As Pontes de Madison.
É só aí que se enxerga algum traço de revisionismo, no alcançar da realidade das mulheres de décadas passadas. A situação do aprisionamento por determinações sociais, a felicidade frustrada. Barret repete situações e discursos marcados pelo período. Suas palavras parecem saídas dos folhetins de Nelson Rodrigues quando ele assinava como Suzana Flag, ou dos filmes de Douglas Sirk.
Essa posição da mulher é muito demarcada na literatura e no cinema da época. Melodrama na veia. Algumas frases de Barret, por exemplo, poderiam perfeitamente ter saído da boca de Laura Jesson, personagem de Celia Johnson no belo e por mim recém-assistido Desencanto, de David Lean. Eis ali a prisão e frustração da mulher bela, recatada e do lar e, ao mesmo tempo, a beleza do imaginário, sempre mais interessante do que a realidade e suas rachaduras na imagem. Eis aí, do jeito mais barthesiano, o próprio Meu Pretzel Mexicano.
Giménez sabe do quê e como deve falar. Por trás da sucessão de imagens, traz a potência de um discurso que ultrapassa o tempo. A técnica do roteiro, repleto desses artifícios da idealização romântica, soma-se à proximidade das imagens. Ao descartar a voz e apostar na narração escrita, o filme estabelece um novo vínculo com quem assiste ao filme, profundo. Com sua mentiras e invenções, Meu Pretzel Mexicano é consciente, ousado, e usa e abusa da imaginação, daquela que o cria e daqueles que nele mergulham.
Um grande momento
A tequila faria a mesma coisa.