Crítica | Streaming e VoD

Ninguém Sai Vivo

Sobrevivendo de sustos

(No One Gets Out Alive, GBR, 2021)
Nota  
  • Gênero: Terror
  • Direção: Santiago Menghini
  • Roteiro: Fernanda Coppel, Jon Croker
  • Elenco: Cristina Rodlo, Marc Menchaca, David Figlioli, David Barrera, Joana Borja, Alejandro Akara, Jose Palma, Mitchell Mullen, Vala Noren
  • Duração: 85 minutos

Adam Nevill é um renomado escritor de horror sobrenatural. Sua obra mais conhecida é “O Ritual”, foi adaptada para o cinema por David Bruckner, por acaso também diretor do incensado A Casa Sombria, atualmente em cartaz. Em 2014, o romancista lançava “No One Gets Out Alive”, sobre uma jovem sem grana que vivia de bicos, mas sem nunca ter dinheiro suficiente para pagar um aluguel decente. Até que pensa ter encontrado um lugar legal por um preço baixo, mas nada é o que parece. O anúncio da adaptação veio com expectativas, o que por si só complica o caminho do filme, mas a vontade de incrementar a metáfora complicou ainda mais o projeto. Ninguém Sai Vivo, disponível na Netflix, tem muito de sua fonte, e outro tanto do imaginário de Joe Coker e Fernanda Coppel, e é nessa mistura que se perde.

Aqui se deixa de olhar para a questão de classe inglesa, do não pertencimento e do subemprego como uma espécie de válvula motriz, o elemento social se transforma, tenta atingir um outro nível de relações complexas. A Stephanie das páginas dá lugar a Amber, uma imigrante ilegal mexicana que chega aos Estados Unidos em busca do “sonho americano”. São mulheres como ela que chegam à casa/pensão dos irmãos Red e Becker, trocando o pouco dinheiro que têm por um lugar para ficar. Reparem no combo: mulheres, pobres e imigrantes sujeitas a algo assustador. O cunho misógino vai num crescente e toma conta da obra. Elas são as que servem, sofrem, assombram. Se a presença de Coppel vinha para trazer algum equilíbrio crítico, podemos dizer que ela não foi bem sucedida. 

Ninguém Sai Vivo
Teddy Cavendish/Netflix © 2021

Mas até chegar aí, o filme segue confuso por outros caminhos. A direção de Santiago Menghini está perdida entre dois pontos. De um lado se dedica ao horror e até que consegue estabelecer uma atmosfera, mas não esconde a própria insegurança e dá-lhe cliché, desde as luzes que se apagam à medida que a personagem passa por elas até à sombra que surge e desaparece em suas costas. E, sendo o diretor um habilidoso artista de efeitos especiais, o longa é daqueles apegados à exposição, ao medo que se aguça pelo que é visto e não pressentido ou imaginado, o que poucas vezes é bom. O outro ponto é a questão social. Ninguém Sai Vivo tenta estabelecer uma relação entre a situação de Amber e seu destino, ainda que deixe evidente a sua pouca intimidade ou o desconforto com o tema.

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A história da personagem é frágil. Se seu passado serve como base para boas criações visuais, nos delírios fantasmagóricos, é insuficiente para um vínculo efetivo, tanto é assim que o filme precisa mostrar a todo momento mostrar que ele existe. O presente se acha na facilidade do óbvio: a documentação, o trabalho, o parente distante, temperados a ingenuidades e mentiras. O que a circunda também não recebe muita dedicação, em especial as outras mulheres colocadas na mesma situação. E até os que ganham alguma atenção não fogem da sins, Red, por exemplo, é alguém a quem se tenta dar alguma profundidade, mas diálogos fracos e falta de sentido não ajudam.

Ninguém Sai Vivo
Teddy Cavendish/Netflix © 2021

E assim, sem dar conta de mesclar satisfatoriamente os dois caminhos, querendo se encontrar em eventos míticos para os quais quer dar conotações alegóricas complexas, mas sem os explorar a fundo aquilo mesmo que inventa, Ninguém Sai Vivo é só mais uma confusão superficial com cara de requentada que se sustenta em sustos, mas deixa muito a desejar, principalmente pelo final glorificador que, ultrapassado e batido, não justifica todo o tormento e o mal. 2021, gente.

Um grande momento
Sonho na lanchonete

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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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