Crítica | Streaming e VoD

O Fio Invisível

Ecos ao longe

(Distancia de rescate, PER, CHL, ESP, ARG, EUA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Terror
  • Direção: Claudia Llosa
  • Roteiro: Claudia Llosa
  • Elenco: María Valverde, Dolores Fonzi, Guillermo Pfening, Germán Palacios, Emilio Vodanovich, Guillermina Sorribes Liotta, Marcelo Michinaux
  • Duração: 93 minutos

Claudia Llosa teve uma magnífica e meteórica ascensão no início da carreira, com o duplo de lançamentos Madeinusa e A Teta Assustada, esse segundo vencedor do Urso de Ouro em Berlim e indicado ao Oscar, e seus voos ainda maiores foram programados. E a partir daí, tudo parece dar continuamente errado em sua carreira, ainda que haja espaço para ela em grandes festivais europeus. Ela acaba de participar da competição de San Sebastian com O Fio Invisível, filme que chega hoje na Netflix, e conseguiu uma repercussão interessante, porque o livro em que se baseia tem expressão e por se tratar de uma produção do streaming. O resultado dessa repercussão parece mais afetado, no entanto.

O livro de Samanta Schweblin foi adaptado pela autora e por Llosa, e é fácil perceber a conexão com a filmografia da peruana. A narrativa tem elementos fantásticos que conversam com o estilo da diretora, agrega um reconhecido universo feminino também a essa mistura, e o resultado – apesar de longe da sua zona de atuação, por ser ambientado no Chile e com personagens menos ligadas à uma cultura local – se aproxima do que ela costuma conceber, sendo prontamente reconhecível como uma ideia que passaria originalmente por ela. Apresentada a premissa e os elementos enfim agregados a ela, restam os problemas a saltar pela tela e comprometer o resultado.

O Fio Invisível
Diego Araya/NETFLIX ©2021

A começar pelo próprio desenvolvimento narrativo, nunca menos que confuso e atrapalhado. Com narrações em off que constantemente se sobrepõem em tempos diversos, além de uma proposta de premissa que ultrapassa os limites do fantástico com suas decisões. Vendido como um filme de terror pra onde achamos, nem com muito boa vontade o filme pode ser identificado nesse lugar. Não passa de um drama sobre maternidade até bem pesado em suas tintas de melodrama que descamba para o fantástico e tenta se aninhar nesse lugar, mas o interesse da produção nunca é resolver questões do horror ou mesmo apresentar signos de tal, mas sim desenvolver essa história de duas mães em suas instigações a respeito da perda.

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A luminosidade da fotografia de Oscar Faura (premiado colaborador de J. A. Bayona, em O Orfanato e O Impossível) é um ponto positivo da produção, que retira por completo sugestões sombrias mesmo quando ele se arvora por esse ambiente mais dramático; isso corta a expectativa para um olhar mais carregado, e cria uma dubiedade para o projeto que cai bem. Infelizmente o mesmo não pode ser dito da montagem de Guillermo de la Cal, que aumenta os problemas existentes no roteiro com uma indefinição absoluta de ritmo e tempos, que soam desconectados do entendimento durante boa parte da ação.

O Fio Invisível
Cr. Diego Araya/NETFLIX ©2021

Já a dupla de protagonistas, essa sim, tem méritos de sobra. Maria Valverde tem lugar mais centralizado e capitaliza uma ideia de mocinha que ela compreende bem, defende com garra, enquanto o talento já vastamente conhecido de Dolores Fonzi faz com que sua personagem, cheia de camadas e mudanças de tom por inúmeras dificuldades que sua personagem impõe, permaneça sempre bem traduzida tanto em dramaturgia quanto em corporalidade, imprimindo as angústias certas a uma mulher assolada por eventos traumáticos e que rapidamente identificamos como crivel, graças ao seu talento.

Mesmo contando com um ponto de partida curioso e uma premissa instigante (mesmo que, aqui e ali, suas notas já tentam sido apresentadas anteriormente), O Fio Invisível patina em uma confusa elaboração de texto, um roteiro que não sustenta seus excessos e em uma configuração temporal desastrosa. Ainda que possamos comprar sua história como absolutamente onírica e desprovida de naturalismo, o filme não consegue montar uma estrutura inteligível mesmo dentro de sua proposta, o que remete a um projeto anterior de Llosa, Marcas do Passado, igualmente confuso e desprovido da autoralidade que a consagrou. Talvez seja a hora de voltar para as raízes mais profundas de seu lugar para redescobrir as molas que traziam seu brilho tão intenso.

Um grande momento
A transmutação

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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