- Gênero: Terror
- Direção: Rodrigo Aragão
- Roteiro: Rodrigo Aragão
- Elenco: Lorena Corrêa, Rejane Arruda, Gilda Nomacce, Caio Macedo, Walter Filho, Telma Lopes
- Duração: 77 minutos
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Talvez hoje, o terror nacional seja mais facilmente reconhecível quando o nome de Rodrigo Aragão é mencionado. É através dele que temos não apenas uma tradição de linguagem continuada, como também um ponto de inflexão que não pode ser lido de outra maneira. O meu ponto, ao declarar isso, não se deve a um caráter qualitativo, ou unitário; atrás de Aragão, figuras como Dennison Ramalho, Gabriela Amaral Almeida, Juliana Rojas, Marco Dutra, e tantos outros investem na seara. Mas creio que o cinema dele encontre o gênero de maneira mais frontal, sem abrir parâmetros para colocações pseudo intelectuais que possam atentar alguma pureza ao resultado final. Ao sair da sessão de algo como Prédio Vazio, por exemplo, podemos até elucubrar sobre possíveis teses políticas dentro do gênero, mas o sangue vermelho escarlate está ali, jorrando espalhado, sem qualquer metáfora.
Isso é algo que chama atenção em um mundo onde o terror, por meio de alguns cineastas espelhados pelo mundo, vez por outra é acusado de estar sendo desviado de uma rota original (ou seja lá o que for isso) e perdendo algumas de suas características mais frontais. Na verdade, sempre existiu um cinema de horror que esteja em categoria menos explícita do ponto de vista da exposição ao choque; isso nunca foi e nunca será um problema para Aragão. E é bastante feliz que na mesma noite o público de Tiradentes tenha assistido a esse filme e ao curta de Jorge Polo (de Canto dos Ossos), Estrela Brava, em uma confluência muito bem pensada de títulos. Como demonstrou no palco, Aragão faz algo como Prédio Vazio para que o cinema de horror brasileiro continue tendo espaço, e nós agradecemos pelas pérolas.
Existem na abertura do filme situações de artifício ligadas aos efeitos especiais que são tão bonitas esteticamente, em seu exagero quase operístico ao resolver as arestas de imagens. Como na sacada do casal idoso, onde o CGI mais sem vergonha é recortado entre aqueles rostos e corpos, e diferente de alguns colegas, só consigo ver beleza e humanidade naquele jato de artificialidade. Prédio Vazio é uma produção que encanta pela sinceridade – aliás, outro sintoma do dia aqui na mostra – de nunca deixar uma mensagem subliminar atrapalhar a experiência como um todo. E o que o autor de O Cemitério das Almas Perdidas pretende é nos fazer chafurdar nos tons mais fortes do gênero, com orgulho de cada plano sedento por mais; o espectador que preze mais pela diversão coletiva há de concordar.
Não importa muito se Aragão abrace clichês com força descomunal para entregar o que pretende. Seu cinema não é adepto de sutilezas, e nessa proposta de mostrar o que é desejado pelo fã, o cineasta não dissimula em cima do que pode entregar; espere por tudo. A grande felicidade de Prédio Vazio, em questões de diversidade, é mostrar um autor que está na busca por novas narrativas que o descolam de uma possível acusação de mesmice de universos. Estamos diante de um terror quase praiano, com o exterior vindo sempre incidir seus propósitos em cada cena, seja através do céu, do mar ou imagens naturais em geral. Esse é um dado que mostra um cineasta interessado em divergir, e aqui o faz dentro da própria filmografia.
Com um lastro quase único de espaço cênico, e com umas visão moderna acerca do tradicional machismo conservador por trás do terror, Prédio Vazio é um roteiro que segue as personagens femininas com gosto e converge em discurso em defesa da maternidade, mesmo que a violência não cesse. Em meio ao que vemos em cena, mais uma vez Gilda Nomacce não deixa qualquer espaço para algum outro destaque. E pela maneira como a atriz de Ausência conduz sua personagem, que passa por alguns detalhes de construção emocional muito amplificados, Nomacce recebe um espaço cada vez maior para não deixar dúvida a respeito de seu domínio cênico. É mais uma vez um trabalho corajoso onde cada parte do seu corpo profissional é acessado, no qual sua visão causa estardalhaço.
O roteiro, com algumas convencionalidades, vez por outra resolve apostar no ápice da falta de construção, deixando claro que Aragão está em cena pelo plano, e não por algum preciosismo narrativo. Quando precisa apostar na diversão típica de produtos que não pedem licença para entreter, Prédio Vazio reafirma o lugar de um cinema que ‘banca o que diz’. Com a certeza de que estão todos muito à vontade na provocação que fazem, no seu interesse específico por uma construção tão esmiuçada de valores de produção, o filme segue encantando pela honestidade com o qual trata o espectador, que não é enganado de forma alguma.
Um grande momento
A chegada da sopa