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Shazam! Fúria dos Deuses

Filme-adolescente

(Shazam! Fury of the Gods, EUA, 2023)
Nota  
  • Gênero: Aventura
  • Direção: David F. Sandberg
  • Roteiro: Henry Gayden, Chris Morgan, Bill Parker
  • Elenco: Zachary Levi, Asher Angel, Helen Mirren, Lucy Liu, Rachel Zegler, Jack Dylan Grazer, Adam Brody, Djimon Hounsou, Grace Caroline Curray, Meagan Good, Ross Butler, D.J. Cotrona, Marta Milans, Cooper Andrews
  • Duração: 130 minutos

O primeiro Shazam! foi uma imensa surpresa por conseguir condensar diversão verdadeira a um universo infantil-juvenil tratando questões que não são da ordem do heroísmo – ou não apenas. Com um protagonista órfão de apenas 15, o filme até falava sobre adolescência, mas era um tratado sobre o abandono – efetivo e emocional – que o indivíduo sente na chegada da puberdade. A chegada desse novo Shazam! Fúria dos Deuses mostra enfim dilemas condizentes à idade com um pouco mais de foco (a chegada do primeiro amor, o isolamento tradicional), mas também fala de questões relacionadas ao amadurecimento, que são inerentes a todas as idades e não apenas aos adolescentes. Essa divagação não está inserida de maneira literal, mas os eventos mostrados pela produção nos levam a esse lugar, o que é um acerto pouco comum em adaptações de HQs, geralmente sem espaço para a sutileza.

Mais uma vez dirigido por David F. Sandberg, Shazam! Fúria dos Deuses cresce nesse aprofundamento dos temas, diria até na evolução dos personagens – ou ao menos em como trata Freddy, quase tratado como co-protagonista. Da relação entre esses irmãos, especificamente a dupla central, e de suas intermissões com o que os abrange, é que o roteiro se amplia. Mesmo o surgimento dos novos personagens (especificamente a tríade de “vilãs”, com ou sem aspas) parecem servir a esse desenvolvimento. O sentimento de não-pertencimento continua na tentativa de ser expurgado, e a resposta às questões referentes a como vemos nosso lugar no mundo adulto, que é uma ideia arraigada do estadunidense, avançam uma discussão que é complementar ao crescer.

Shazam! Fúria dos Deuses
Warner Bros. Pictures

O que não acompanha o anterior é um conjunto de detalhes que enfraquece o todo, pontuais em cada aspecto, mas que transformam nossa percepção de como a produção foi elaborada. Uma das questões é a falta de explicação teórica do que, na prática, sabemos o motivo: as crianças, que são os ‘cavalos’ dos protagonistas, aparecerem tão pouco. Óbvio que o motivo é o fato dos atores mirins terem crescido muito, e essa situação não ser fácil de traduzir, no roteiro. O que o filme faz, no entanto, é simplesmente não fornecer lógica; as crianças estão transformadas nos heróis a maior parte do tempo, e mesmo quando tem sua descoberta ameaçada, só voltam à forma original em casos extremos de necessidade. Pode parecer bobo, mas é que as pontas soltas não param por aí. 

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Outra questão é a falta de personalidade das irmãs gregas, que não são simplesmente ambíguas, mas claudicantes mesmo. Na falta de decidir por um rumo a ser dado a cada uma das três, o filme as cerca de muitas saídas que não se justificam, porque acabam por anular uma a outra. Principalmente as personagens de Helen Mirren e Lucy Liu são difíceis de acompanhar em suas mudanças de temperamento, perdidas em decisões contrastantes que não as complexifica, e sim empobrece. O que tem de minucioso na relação entre Billy e Freddy, acaba por não ser contemplado no restante de seus personagens, sendo ou muito voláteis ou desprovidos de espaço para exprimir quem são, caso dos pais do grupo, que tinham participação bem maior no anterior, e aqui parecem figuração de luxo mesmo quando seus sentimentos vem à tona. 

Shazam! Fúria dos Deuses
Warner Bros. Pictures

Outro fator que incomoda a estrutura de Shazam! Fúria dos Deuses é que o próprio filme se comporta como se estivesse na mesma adolescência dos seus personagens. Enquanto o filme anterior se equilibrava de maneira muito tranquila entre os públicos que deveriam acessar o longa, aqui as questões ‘teen’ se confundem com a necessidade de parecer buscar o público da saga Harry Potter. São salões mágicos que precisam ser escolhidos com diferentes consequências, canetas mágicas que escrevem sozinhas, folhas de papel que se transformam em pássaros, brigas por cajados de feitiçaria, entre muitas outras coisas. O resultado disso é que muitas vezes essas escolhas parecem histéricas demais, mesmo para os padrões que Zachary Levi estabeleceu, além apenas de querer beber em outra franquia.

Se o resultado passeia desencontrado por aí, não dá para negar o tanto de carisma que os atores carregam, e que acabam sendo emprestados a Shazam! Fúria dos Deuses. Desde o anterior, é uma diversão ligeira, descompromissada do ponto de vista épico, mas que discute de maneira muito eficaz as dores e as delícias de ser adolescente. Ainda tem um elenco cada vez mais entrosado e talentoso, com destaque para o menino Jack Dylan Grazer e a chegada em cena de Rachel Zegler, que não tinha me convencido em Amor Sublime Amor, e aqui está ótima. Com a ajuda dessa equipe, o filme trata daquela velha questão americana sobre a saída compulsória de casa dos filhos no fim da adolescência, transformando até mesmo essa visão e dando um caráter humano a esse momento. É outro dos temas que parecem mais polvilhados do que exatamente abordados, ficando pelo caminho de uma abordagem menos infantilizada. Ainda bem que o espetáculo salva o dia. 

Um grande momento

Freddy faz uma descoberta sobre Anne

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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