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They Look Like People

(They Look Like People, EUA, 2015)
Horror
Direção: Perry Blackshear
Elenco: MacLeod Andrews, Evan Dumouchel, Margaret Ying Drake
Roteiro: Perry Blackshear
Duração: 80 min.
Nota: 6 ★★★★★★☆☆☆☆

Em seus estudos, Freud definiu a paranoia como quando “a defesa fracassa por completo, e a autoacusação original, o termo real do insulto de que o sujeito vinha tentando poupar-se, retorna em sua forma inalterada”. Há ainda um esquecimento ou perda de referência, mas com causas diferentes das de outras neuroses. Diferente da histeria (onde a perda acontece após formação de símbolos), na paranoia, ela se deve à modificação da fronteira entre o eu e o exterior e à distorção temporal.

Wyatt é um homem que está quebrado. Após o rompimento de um relacionamento amoroso, ele começa a ter problemas em encontrar o seu espaço. Assim, chega à casa de seu melhor amigo de adolescência, Christian, mas a tentativa de resgate do passado fracassa ante a doença que, cada vez mais, vai tomando conta de sua vida.

Produzido com baixíssimo orçamento, uma equipe reduzida e alguns improvisos, They Look Like People não é um filme bonito de se ver e que vai surpreender pela estética ou atuações apuradas. Mas é eficiente na sua construção visual de algo abstrato – nem sempre as reações da mente conseguem ser retratadas – e tem tantos momentos de acertos que chama a atenção.

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Primeiro longa-metragem de Perry Blackshear, que também assina o roteiro, o filme é todo construído na dicotomia entre seus dois personagens principais. Seja na interação ou na composição individual, cada um deles é trabalhado de um jeito. Os espaços cênicos e sua ocupação são tratados de maneira diferente. Além da variabilidades de locações, Christian ocupa melhor o apartamento, enquanto Wyatt prefere o porão e se sente confortável em locais mais desertos.

Outra diferença bem marcada está na iluminação. Enquanto Wyatt começa o filme na penumbra e está nela várias vezes, Christian sempre está em quadros mais iluminados. Além da confirmação da dicotomia, o escuro constrói bem a tensão do longa, que cria o ambiente para a concretização da paranoia de Wyatt. Além dessa ausência de luz, o diretor lança mão de efeitos sonoros também eficientes, construindo o clima que segue até o final do filme.

A dificuldade de retratar um doença intangível encontra um bom lugar na metáfora do horror e, superada a cada novo evento, dá-se sentido às estranhas ligações anônimas recebidas, aos zumbidos constantes e a toda representação gráfica, com uma foto de Anna, aquela que teria sido a noiva de Wyatt. Assim como em casos de paranoia descrito por Freud, a distorção é clara e as alucinações são representações de experiências passadas que voltam.

A angústia desse crescente e da deterioração dos limites entre o real e o imaginário, já retratada em outros filmes, é transmitida com eficiência em They Look Like People, mesmo que conte com um orçamento muito menor do que o de outros sobre o tema. A impossibilidade do fazer algo, a incompreensão e o medo interior e exterior ao personagem que a imagina estão ali, em realizações estéticas estruturadas e perceptíveis, e conduzem bem o espectador até o tenso desfecho.

Um Grande Momento:
O final.

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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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