- Gênero: Aventura
- Direção: Jake Schreier
- Roteiro: Eric Pearson, Joanna Calo
- Elenco: Florence Pugh, Sebastian Stan, Julia Louis-Dreyfuss, David Harbour, Wyatt Russell, Lewis Pullman, Hannah John-Kamen, Geraldine Viswanathan, Olga Kurilenko, Wendell Pierce
- Duração: 125 minutos
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É praticamente impossível sair indiferente a uma sessão de uma produção da Marvel Studios, hoje. No contexto geral, os comentários a respeito do séquito de heróis que infestaram os cinemas nos últimos 25 anos tem trazido enorme desprazer e cansaço ao espectador; com razão. Num crescendo, o MCU tomou conta do que é conhecido como blockbuster cinematográfico, não deixando espaço para qualquer respiração fora desse campo. A fórmula evidentemente esgotou, e a pandemia chegou para mostrar para o estúdio que os números podem até ser enormes (vide Deadpool & Wolverine, ano passado), mas eles não são mais garantidos – e na verdade, cada vez mais fica claro que isso serão acontecimentos específicos e pontuais. Ao menos na escala da qual infelizmente a indústria nos acostumou, a época das torneiras abertas de dinheiro para filmes de mutantes salvadores cessou. Isso é positivo para a oxigenação de Hollywood como um todo e negativo para produtos particulares, como Thunderbolts*, que estreia essa semana sem o alarde de outrora.
Nesse caso, vale o lamento mesmo. Em tempos outros, uma produção como essa geraria filas e interesse constante de imprensa e público; essa época passou, ainda bem. A normalidade pede que o espectador esse fim de semana confira muito mais Homem com H, que uma nova aventura de seres voadores. Porém, Thunderbolts* merece sim um debruçamento, ainda que a biografia de Ney Matogrosso dirigida por Esmir Filho seja a escolha acertadamente óbvia do momento. Existem alguns pontos exclusivos a esse filme que merecem ser debatidos, e que não estão na linha da discussão coletiva como eu imaginei que estaria após a sessão. Porque, antes de tudo, o filme consegue uma escalada de um pólo a outro de gêneros mais agudos e que não é fácil de arranjar, tanto no roteiro quanto na realização; o resultado é um filme que respeita seu público sem ser estridente, buscando uma identificação que acontece com facilidade.
O que ninguém esperava era que, a essa altura e a despeito de todas as críticas ao resultado de seus produtos e de forma inorgânica que se formou em torno dessa linha de produção, que a Marvel fosse surgir com esse híbrido defendido com tanta delicadeza. Uma mistura improvável entre uma leveza bem humorada, sem as características escrachadas que costumam acompanhar esse tipo de veículo ao acessadas, e um olhar sincero e sério para a saúde mental colapsada de hoje, principalmente no que toca à juventude. Dessa forma, Thunderbolts* é um título do seu tempo, e o que seria essa afirmação? Ao contrário do que é proposto quando digo algo com essa entonação, o filme aponta uma situação alarmante que corre solta com cada vez mais liberdade e ausência de reflexão: a depressão.
Já em sua abertura, a figura central vivida por Florence Pugh (indicada ao Oscar por Adoráveis Mulheres) descreve sua realidade atual sem qualquer entusiasmo; na verdade, o que está exposto ali é o seu exato oposto, em descrição direta. Sem disfarçar, o que esse grupo que se vê reunido contra sua vontade apresenta é, em diferentes teores, sintomas mais ou menos brandos de quadros depressivos. Isso tudo até a entrada em cena de Bob, um personagem aleatório jogado em cena de maneira inexplicada. O que parece despropositado logicamente faz sentido, mas a forma como essa construção se desenvolve vai cada vez mais propulsionando a narrativa para uma direção que se afasta de qualquer leveza, para olhar de perto para o abismo do desespero – ou, mais precisamente, o vácuo.
O diretor Jake Schreier tem apenas dois longas anteriores no currículo (e um deles é o fraco Cidades de Papel), mas uma infinidade de experiências em séries e clips. Logo, levando em consideração que o ritmo e a habilidade no trânsito entre gêneros não é especialidade do produtor, podemos considerar que o rapaz merecia mesmo uma segunda chance, e que os resultados que ele alcançou aqui sejam suficientes para que sua carreira tenha continuidade para além do universo Marvel. Suas cenas tem alguma personalidade, e embora não haja uma concentração de descobertas visuais, o que existe aqui é intimidade suficiente com o material, e uma forma doce de nos conectar àqueles personagens, que suas intenções acabam mostrando a eficiência que o estúdio não tem conseguido. O símbolo disso é o clímax do filme, que acontece com o surgimento de um novo personagem; tudo o que acontece a partir dali é mais fruto de criatividade estética, com um resultado que conquista o espectador com muita rapidez.
Apesar da qualidade habitual de Pugh, de David Harbour (de Stranger Things) e da fenomenal Julia Louis Dreyfuss (premiada por todas as séries que já fez), existem dois atores aqui muito especiais. Geraldine Viswanathan é jovem, fez pouco até agora, mas demonstra muita segurança em uma personagem que poderia ser mantida menor; é sua espirituosidade que garante a força necessária para que ela seja lembrada. Lewis Pullman, no entanto, é o coração de Thunderbolts*; o filho de Bill Pullman não tinha tido a chance necessária ainda, com inserções pequenas em filmes como Top Gun: Maverick. Ao ganhar esse personagem cheio de nuances e recheio, o rapaz não apenas se coloca em cena, como consegue alternar muito bem os muitos estados de espírito que ele representa. Por sua performance, a emoção do espectador é testada em meio às crises de um tipo que ainda está se descobrindo.
Um grande momento
O clímax de um novo personagem