Crítica | Outras metragens

Três Canções para Benazir

À sombra dos sonhos

(Three Songs for Benazir, AFG, 2021)
Nota  
  • Gênero: Documentário
  • Direção: Elizabeth Mirzaei, Gulistan Mirzaei
  • Roteiro: Elizabeth Mirzaei, Gulistan Mirzaei
  • Duração: 22 minutos

Um dos pré selecionados para a categoria de curta metragem documental para o próximo Oscar, Três Canções para Benazir entra numa seara que têm sido tradicional para a categoria, que tem investigado cinematografias do Oriente Médio para encontrar narrativas desconstruídas em formato, cujo padrão estadunidense não consegue abarcar em relevância. Aqui, as questões documentais passam longe do que é aplicado no cenário comum, e esse é o grande mérito do filme, que tem sido vendido como um dos favoritos da categoria – inclusive isso é compreendido.

Gulistan e Elizabeth Mirzaei saem em campo para acompanhar a trajetória de Shaista, um jovem afegão já com família formada, uma esposa grávida e que vive com o que consegue ganhar vendendo tijolos que ele mesmo produz. Seu sonho, no entanto, é se tornar soldado e servir ao Afeganistão no exército, um status (na sua cabeça) ainda não alcançado na aldeia onde vive. Esse lugar de ascensão social, que independe da classe, do país e da naturalidade, é explorado em um filme que poderia tratar dessa história por muito mais tempo – talvez ser um longa? – para desenvolver essa personalidade e sua jornada com calma.

Ao mesmo tempo, é essa dinâmica que chama atenção da produção, um filme que presta-se a acompanhar um jovem que mesmo em seu lugar desprivilegiado, encontra dificuldades de aceitação entre seus pares, e incompreensão em relação ao que julga uma saída para todas as suas ausências – Shaista não estudou, não tem um emprego estável, e sua família cresce exponencialmente às dificuldades igualmente crescentes. Em sua visão, não há risco em comprometer-se com a luta armada, mas provavelmente uma estabilidade que ele não consegue encontrar na sua vida civil.

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Três Canções para Benazir
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O curta não agrega respostas fáceis à sua narrativa. Shaista simplesmente toma decisões e avança na direção desejada como um homem provedor; sem pensar na esposa, o rapaz deseja tomar pra si um destino diferente ao que a sociedade serviu como solução às suas ausências. Quando enfim é confrontado com as consequências de suas ações, se revolta em silêncio, sem conseguir mover sua revolta na direção correta, agindo pelos bastidores, como é de sua natureza. E aí percebemos que seu impulso decisório ele não se constrói sozinho, é dependente de uma rede de segurança que não o apoia, diminuindo sua auto estima.

Em uma camada que se mostra existente, mas que também passa rápido pelo campo narrativo, está a presença de uma força dominante que observa seus personagens, através de um dirigível monitorador das atividades da população, comandado por forças ocidentais, provavelmente Estados Unidos ou Inglaterra. Tematicamente, isso é um comentário breve que precisa ficar marcado no espectador, porém esteticamente nunca deixa de acompanhar o protagonista, porque o objeto voador raramente deixa de ser enquadrado nos planos, promovendo essa invasão invisível de uma força superior que também age com força de comando àqueles destinos.

Três Canções para Benazir, em sua rapidez de formato, não consegue abarcar o tanto de camadas que seu personagem e seu entorno conclamam, um mundo tão deficiente que impede a realização das ações unitárias, mesmo que elas signifiquem segurança e estabilidade. No limiar das carências coletivas, a primeira coisa aplacada das listas de prioridades é o sonho, deixado para trás pela praticidade da vida adulta, mesmo que não exista preparo emocional para os passos esperados para a independência. O crescimento emocional fica à deriva das necessidades que a vida adulta impõe, em qualquer parte do mundo.

Um grande momento
Brincando na neve

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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