Crítica | Catálogo

Um Conto de Amor e Desejo

Sublimando os sentimentos

(Une histoire d'amour et de désir, FRA, TUN, 2021)
Nota  
  • Gênero: Drama, romance
  • Direção: Leyla Bouzid
  • Roteiro: Leyla Bouzid
  • Elenco: Sami Outalbali, Zbeida Belhajamor, Diong-Kéba Tacu, Aurélia Petit, Mahia Zrouki, Bellamine Abdelmalek, Mathilde Lamusse
  • Duração: 102 minutos

“O olhar lânguido põe uma alma em comunicação com a outra”

Deve o desejo puro ser consumado? Sucumbir aos suspiros, olhares sedutores, toques sutis. Manter o jogo da conquista em andamento. Alimentar a espera. Parece que a sedução está em voga, seja nas séries – como na segunda temporada de Bridgerton – seja nos filmes, como Um Conto de Amor e Desejo, que está estreando nos cinemas.

De Leyla Bouzid (diretora e roteirista do arrebatador Assim Que Abro Meus Olhos) coloca dois jovens estudantes de literatura no centro da trama, em choque cultural e também comportamental. A cena que abre o filme traz Ahmed (Sami Outalbali, da série Sex Education) observando Farah (Zbeida Belhajamor) no metrô. A fantasia amorosa já se constrói nessa primeira olhada, numa composição fílmica muito sutil e bonita, com slow motion, o burburinho e o volume de pessoas entre ambos e a trilha sonora de Lucas Gaudin.

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Um Conto de Amor e Desejo
Divulgação

Inundado pelo desejo, Medé – o apelido afetuoso que Ahmed recebe – resiste e nutre a tensão durante as aulas da professora Morel na Universidade de Sorbonne e as jornadas pela noite de Paris com Farah. O livro “O Jardim Perfumado” abre um leque de possibilidades para ele, tão acostumado a pensar de forma tão tradicional na própria cultura. Escrita no século 10, a poesia erótica contida na obra alimenta a imaginação e o impulsiona em direção a Farah. A amizade entre os dois logo se transforma em flerte e paixão.

Num registro muito interessante, Sami Outalbali faz de Medé não só o último dos românticos como um jovem dividido entre dois mundos: o parisiense e sua herança argelina e árabe. Questionando se a “vida perfeita” seguida por outros amigos, que se empregam e casam, serve para si e mesmo se um possível futuro como escritor, que fascina o pai, será permitido a um imigrante. Na ocasião da exibição do filme no Brasil durante o Festival Varilux 2021, Sami Outalbali compartilhou sua percepção de que seu personagem simboliza uma nova forma de masculinidade, onde um homem virgem lida com o sexo de uma forma contrita invés de simplesmente transar e superar esse obstáculo digamos.

Um Conto de Amor e Desejo
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Tunisiana, Bouzid empresta novamente um pouco da sua vida como ingrediente para a narrativa ficcional, ela que migrou de Tunes e estudou literatura na Sorbonne. A cineasta cria uma outra personagem jovem e emancipada, tal qual a protagonista de seu primeiro filme, também de nome Farah, que quer experimentar com intensidade as possibilidades da vida adulta, seja acadêmica ou boêmia.

A política possui um certo espaço em Um Conto de Amor e Desejo, dando um tom libertário a partir do discurso de Farah e especialmente do pai de Medé, um jornalista argelino que viu seu propósito ser perdido quando foi obrigado a deixar seu país. Ele inclusive traduz para o filho a paixão da poesia árabe e o incentiva a vocalizar seus sentimentos.

Um Conto de Amor e Desejo
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Desejo, desejo e mais desejo

A espera torna-se tão sedutora quanto o coito, com a construção da história sendo “slow burn” (como madeira que vai queimando aos poucos e deixando o casal cada vez mais envolvido sem realmente se envolver), com Bouzid trazendo o texto literário para perfumar de erotismo a narrativa visual como Peter Greenaway certa vez o fez com O Livro de Cabeceira.

Por mais que exista alguma previsibilidade na condução da trama e o ritmo narrativo se torne demasiado arrastado em algumas sequências, o transe amoroso se sobressai e mantém a atratividade de Um Conto de Amor e Desejo para quem assiste.

Um grande momento
As mãos que se tocam na dedicatória

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Lorenna Montenegro

Lorenna Montenegro é crítica de cinema, roteirista, jornalista cultural e produtora de conteúdo. É uma Elvira, o Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema e membro da Associação de Críticos de Cinema do Pará (ACCPA). Cursou Produção Audiovisual e ministra oficinas e cursos sobre crítica, história e estética do cinema.
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