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Um Crime para Dois

(The Lovebirds, EUA, 2020)

  • Gênero: Comédia
  • Direção: Michael Showalter
  • Roteiro: Aaron Abrams, Brendan Gall, Martin Gero
  • Elenco: Kumail Nanjiani, Paul Sparks, Anna Camp, Issa Rae, Kyle Bornheimer, Joe Chrest, Kenneth Kynt Bryan, Mahdi Cocci, Andrene Ward-Hammond, Kelly Murtagh, Catherine Cohen, Moses Storm
  • Duração: 86 minutos
  • Nota:

Tem alguns projetos que parecem fazer tudo certo. Chamam o diretor que já teria demonstrado destreza anterior em outro trabalho onde um dos protagonistas teria igualmente se destacado, chamam uma estrela em ascensão da TV, criam um ambiente familiar onde temas pertinentes do momento salte aos olhos do espectador através do biotipo dos próprios atores centrais, e pronto: a salada para Um Crime para Dois foi montada e, em tese, tudo está no lugar. Porém tudo não passa de boas intenções e o resultado é, de acordo com algum ponto de vista, decepcionante.

Agora, existe a possibilidade de o espectador achar o encontro anterior entre o diretor Michael Showalter e o ator Kumail Nanjiani um tremendo pastel de vento; se essa for a sua opinião a respeito de Doentes de Amor, provavelmente não haverá expectativa criada para esse novo encontro, e o filme talvez desça sem grandes reclamações. O problema é que tanto lá como cá, uma premissa interessante é resolvida de maneira morna – o que aqui seja ainda mais grave, já que Um Crime para Dois claramente quer ir além de entreter, como também provocar risada, e o máximo que a produção chega a tirar do espectador é um sentimento de reconhecimento por entre os temas emocionais da produção.

Um casal junto há quatro anos enfrenta um desgaste na relação a ponto de não se reconhecerem mais, e nem o sentimento que os uniu. No exato momento em que declaram vontade de se separar, eles atropelam acidentalmente um ciclista e entram numa espiral de paranoia, perseguição e uma quantidade crescente de crimes ao seu redor. Há no filme uma clara praticidade em desenvolver esse enredo, de maneira direta e sem arroubos de originalidade, mas não apenas falta diversão como falta charme, e aos poucos percebemos que tudo se desenvolve no modo piloto automático e não há um esforço conjunto para tirar o filme da burocracia apresentada.

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O espectador não compra a história de Jibran e Leilani em nenhum momento porque essa relação não é construída para compor a vida interna do casal. Partindo de uma eficaz abertura, Um Crime para Dois valoriza a sagacidade do projeto mas não dá volume e consistência à sua espinha dorsal. Em nenhum momento entendemos os motivos pelos quais o casal se apaixonou e também desapaixonou. As informações simplesmente nos são dadas sem que a humanidade que deveria pautar esses personagens dê as caras; e como a maioria dos elementos dispostos não nos leva a qualquer verdade, como se envolver na tentativa de reconstrução daquele sentimento?

Issa Rae e Kumail Nanjiani em Um Crime para Dois (The Lovebirds), 2020

Outra questão preponderante é a de que Kumail Nanjiani e Issa Rae (A Chefinha) não possuem nada que sequer se assemelhe a química. Issa é muito talentosa e esbanja carisma com seu sorriso proeminente sempre a postos, mas Kumail tem uma postura extremamente defensiva a todo tempo, sem doar nada ao projeto. A atriz então parece em via de mão única na maior parte do tempo, deixando o filme ainda mais capenga. Sem uma troca mútua que os transforme e sem uma construção narrativa que faça surgir um esforço dramático ao roteiro, apenas desfiando a obrigatoriedade de colocar o projeto no ar.

Tirando então alguns momentos isolados onde algum diálogo mais inspirado apareça (como a reflexão do milk-shake), o trio de roteiristas com experiência televisiva parece muito mais ter boas ideias para esquetes do que para um projeto cinematográfico cadenciado. Como um filme precisa de mais do que momentos bacanas, em meio a um desenvolvimento esquemático e frio, Um Crime para Dois segue sua 1h20 com o freio puxado e sem empolgação, apesar da vontade de fazer dar certo.

Um Grande Momento:
Firework

Fotos: Skip Bolen/NETFLIX

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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