Crítica | Festival

Woodlands Dark and Days Bewitched: A History of Folk Horror

Um longo passeio pelo folk horror

(Woodlands Dark and Days Bewitched: A History of Folk Horror, EUA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Documentário
  • Direção: Kier-La Janisse
  • Roteiro: Kier-La Janisse
  • Duração: 194 minutos

Entre os subgêneros do terror, um dos mais instigantes é o folk horror, pois estimula o medo com elementos de retorno à origem, seja ele metafórico — mitológica e emocionalmente falando — ou literal — quando se afasta das cidades e vai para o campo e a natureza — que são conhecidos e acessíveis a todos. Se a identificação é a maior potência do medo, encontrar o horror do desconhecido naquilo que está longe de nós, mas de certo modo conhecemos bem, faz com que toda experiência seja muito mais interessante. O documentário Woodlands Dark and Days Bewitched: A History of Folk Horror mergulha nas produções para cinema e para televisão, entrevista críticos de cinema, pesquisadores, realizadores e atores, e seleciona trechos de filmes para entregar um interessante retrato sobre o “terror rural”, como ficou conhecido.

Deixando de lado o termo absolutamente equivocado, porque apesar de haver algo de rural, nunca foi só sobre isso, o longa-metragem deixa bem evidente a paixão da diretora Kier-La Janisse pelo tema. São mais de três horas de filme, com muitas repetições de entrevistados e uma estrutura engessada, o que talvez canse aqueles que não sejam tão fãs quanto ela. Já os que se identificarem em gosto mal verão o tempo passar, reconhecerão os filmes, concordarão ou discordarão de uma ou outra fala e saírão satisfeitos da sessão querendo assistir a O Homem de Palha mais uma vez. Entre fãs e não-fãs, o Woodlands Dark and Days Bewitched é um documento importante para entender um movimento, ou boa parte dele.

De determinação imprecisa, por seu leque muito abrangente, o folk horror tem várias “correntes”. Uma delas, por exemplo, parte da ligação dos filmes com os contos populares e contos de fadas, tendo o longa finlandês A Rena Branca (1952) como guia; outra se detém especificamente à observação da relação do homem com a natureza e o interior, como o telefilme Whistle and I’ll Come to You (1968), e a mais difundida,que estabelece a trinca O Caçador de Bruxas (1968), O Estigma de Satanás (1971) e O Homem de Palha (1973) define como os títulos primordiais do gênero, analisando as três obras para além de suas características, relacionando-as com elementos históricos e sociais.

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Woodlands Dark and Days Bewitched: A History of Folk Horror: O Homem de Palha

O documentário é baseado nesta Trilogia Profana, termo cunhado por Adam Scovell, e parte dela para buscar origens, desdobramentos, referências e influências no futuro. Se Janice é óbvia na hora de escolher seu dispositivo, trazendo quem entende do assunto e ilustrando suas falas, ela inova ao fazer questão de dar a sua própria cara à montagem. Woodlands Dark and Days Bewitched é dividido em capítulos, parte da Trilogia Profana e passa por pontos que se destacam no gênero. O resultado tem um quê divertido de tese em scrapbook audiovisual e é fácil mergulhar nas animações, que trazem nomes conhecidos conhecidos cy y t y⁶6h b.omo Dorren Girard e Guy Maddin. Poemas e o tom celta da música aproximam daquilo que a própria dinâmica do filme afasta. É estranho, mas curioso.

Janisse faz questão de dar voz às mulheres, sempre menos ouvidas, principalmente se o assunto é cinema de gênero. Traz um time de críticas de cinema, cineastas, atrizes e folcloristas para falar junto aos já sempre validados. Outro destaque está na questão que faz em mostrar que o folk horror tem características próprias de onde se estabelece com um capítulo exclusivo para o subgênero em outras regiões. Embora não consiga, e nem tenha tempo para isso, é possível ter uma noção das diferenças. O Brasil também aparece, com depoimentos dos pesquisadores Carlos Primati e Laura Cánepa e do realizador Dennison Ramalho e trechos dos filmes Noites de Iemanjá, Leonora dos Sete Mares, As Proezas de Satanás na Vila de Leva e Traz, O Amuleto de Ogum, Amor Só de Mãe e As Filhas do Fogo.

Todo o trabalho de resgate e montagem é, sem dúvida, impressionante. São mais de 200 filmes, além de alguns episódios de séries, selecionados. Entre eles, há clássicos de fácil acesso e algumas raridades que foram com o passar do tempo trazendo ou reafirmando características do folk horror: o folclore, a natureza, as marcas da religiçao, colonização e escravidão, a contracultura. E há imagens de arquivo para destacar esses pontos. Woodlands Dark and Days Bewitched não é um filme perfeito. Se excede e repete, por vezes; se perde na duração, mas traz um apanhado pouco visto em um subgênero rico e consegue instigar o público a percorrer vários caminhos.

Um grande momento
We don’t go back

[SXSW 2021 – Film Festival]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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