- Gênero: Comédia
- Direção: Jason Woliner
- Roteiro: Sacha Baron Cohen, Anthony Hines, Dan Swimer, Peter Baynham, Erica Rivinoja, Dan Mazer, Jena Friedman, Lee Kern
- Elenco: Sacha Baron Cohen, Maria Bakalova, Tom Hanks, Dani Popescu, Manuel Vieru, Miroslav Tolj, Alin Popa, Ion Gheorghe, Nicolae Gheorghe
- Duração: 95 minutos
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Apesar do sucesso prévio com o Da Ali G Show, onde interpretava um jovem inglês preconceituoso e politicamente incorreto, o carimbo do comediante Sacha Baron Cohen para a fama mundial se deu com Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América (2006). O personagem do amalucado repórter do país transcontinental virou uma mania internacional, bem como as pegadinhas que pregava em políticos e celebridades. Brüno (2009), onde interpreta um apresentador afetado e extravagante, foi um sucesso em menor grau, mas manteve o grau incômodo de comédia de humor negro.
Após O Ditador (2012), nova reunião com Larry Charles, com quem trabalhara nos dois últimos “documentários”, ser considerado um decepção, Cohen parecia ter voltado sua atenção para os filmes ficcionais, como Os Miseráveis e O Espião. Em 2018, ano da eleição de Donald Trump nos EUA, voltou à sua empreitada de constranger pessoas da vida real com personagens ficcionais com Who Is America (2018) o que, junto com a tentativa de reeleição de Donald Trump agora em 2020, parece sedimentar a razão de existência de Borat: Fita de Cinema Seguinte.
Dirigido agora por Jason Woliner, conhecido por dirigir sitcoms como Parks and Recreation e especiais de stand-up de Aziz Ansari, o novo filme de Borat repete mais ou menos a premissa do primeiro: dessa vez, o segundo melhor repórter do Cazaquistão é libertado do gulag (punição por transformar o país em uma vergonha internacional) e enviado a América e tentar presentear um macaco astro pornô para agradar um líder americano. Porém, quando o macaco chega morto, Borat Sagdiyev vê como saída presentear sua filha de 15 anos, Tutar (Maria Bakalova), à primeira liderança republicana que aceitar.
Fazer um novo filme de Borat se revelou um problema justamente pela fama que o personagem alcançou. Se antes as pessoas não entendiam aquele corpo estranho e Sacha tinha maior margem de manobra para arrancar posicionamentos absurdos (como quando um homem o diz para raspar o bigode para não “parecer com um terrorista”), agora o próprio filme destaca que seu personagem é um marco da cultura pop e que muitos estão alertas da brincadeira.
Como resposta a isso, Sacha tem que desdobrar, e desde o início é evidente o quanto o filme sofre com isso. A Fita de Cinema Seguinte é um filme bem mais roteirizado, onde os absurdos proferidos por Borat geralmente são dirigidos a outros atores, como o premiê do Cazaquistão e sua filha. Personagens da vida real, como os conspiracionistas Jerry Holleman e Jim Russell têm participação similar à de Pamela Anderson no primeiro filme, mas dessa vez essa presença absurda combinada não carrega a espontaneidade aparente do primeiro filme, já que claramente foram colocados como um dispositivo narrativo.
Os melhores momentos do filme são mesmos onde Cohen deita e rola no improviso em situações não combinadas, como quando canta uma canção reacionária escrita por Jerry e Jim (que prega dar uma “abordagem saudita” aos democratas e outros inimigos dos republicanos através de decapitação). Em outra outra aparição impagável, comparece disfarçado do presidente Trump durante uma convenção republicana e oferece a filha à Mike Pence, que escorrega em seu discurso, constrangido. E, é claro, a cena com Rudy Giulliani.
A pegadinha que constrange os republicanos atualmente é inacreditável, um momento de ouro digno do primeiro Borat. O ex-prefeito de Nova York e advogado de Donald Trump aparece de maneira desavisada sendo entrevistado por Tutar, sendo simpático e risinho em meio à goles de uísque, receptivo à repórter (que posa de âncora de uma televisão conservadora) e, para não revelar muito, é capturado em uma cena no mínimo comprometedora nesses tempos em que escândalos sexuais chegam a mídia o tempo todo. O que nos deixa imaginando longe das câmeras, quando não há personagens para interromper a narrativa.
Enfim, para os brasileiros que carregam o referencial das brincadeiras veiculadas por nomes da televisão como Silvio Santos e João Kléber, dá para se entender como o esquete normalmente transcorre. O diferencial, claro, é para onde Borat mira o alvo da sátira, nesses tempos onde políticos se tornaram praticamente influenciadores e suas bases de idólatras patrulham as redes, tornando-se então deliciosa a tiração de sarro de gente que se leva tão a sério.
Ao invés do aspecto mais, digamos assim, antropológico do primeiro Borat, que fazia piadas mais com a cultura americana em geral, Borat: Fita de Cinema Seguinte já é bem mais fruto do seu tempo, onde algumas excelentes gags recebem uma ligação não muito consistente entre si, mas já com força o suficiente para mostrar que, nesses tempos onde muito se debate limites para o humor e o ódio tem um projeto de poder que se leva muito a sério, um iconoclasta incendiário como Baron Cohen ainda tem seu espaço para apontar o dedo e rir, o que torna esse filme um daqueles momentos onde humor também é um ato de resistência.
Um grande momento
Rudy Giuliani, é claro